Um magistrado atento às questões do nosso tempo

28 de setembro de 2023

Da Redação

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A trajetória, os votos marcantes e as expectativas para a gestão do Ministro Luís Roberto Barroso como presidente do Supremo Tribunal Federal

Sensibilidade, diálogo e atuação humanista são algumas das principais características apontadas por quem busca traçar o perfil do Ministro Luís Roberto Barroso. No ano em que ele completa uma década de atuação dedicada ao Supremo Tribunal Federal (STF), assume um desafio honroso: presidir a mais alta Corte do País no biênio 2023-2025.

O Ministro Barroso sucederá a Ministra Rosa Weber, diante da aposentadoria da magistrada, e também presidirá o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cujas diretrizes devem ser observadas pelos tribunais de todo o País. Barroso terá como vice-presidente o Ministro Luiz Edson Fachin, repetindo a dobradinha que funcionou bem quando ambos ocuparam, respectivamente, a presidência e a vice-presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Nascido em Vassouras, no interior do Estado do Rio de Janeiro, o Ministro Barroso é filho de mãe advogada e de pai membro do Ministério Público estadual. Casou-se com Tereza – que faleceu em janeiro de 2023 – com quem teve dois filhos.

Ainda na juventude, Barroso morou nos Estados Unidos. De volta ao Brasil, por dois anos cursou de forma paralela os cursos de Direito, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), e de Economia e Administração, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Decidiu seguir apenas com o Direito. Formado na Uerj, onde é professor titular de Direito Constitucional, fez mestrado na Universidade de Yale, nos Estados Unidos, doutorado na Uerj e pós-doutorado na Universidade de Harvard, também nos EUA.

Recém formado, foi aprovado em primeiro lugar no concurso de provas e títulos da Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro. Porém, foi atuando como advogado, em casos de grande repercussão e com sustentações orais marcantes, que seu nome alcançou amplitude nacional. Participou, por exemplo, dos julgamentos relacionados à liberação de pesquisas com células-tronco embrionárias, à proibição do nepotismo no Poder Judiciário, ao reconhecimento das uniões homoafetivas e ao direito das gestantes de interromper a gravidez em casos de fetos anencéfalos.

Chegada ao Supremo – Em 2013, Barroso foi indicado para integrar o Supremo Tribunal Federal pela então Presidenta Dilma Rousseff. Ao passar pela sabatina no Senado Federal – na qual seu nome foi aprovado por 59 votos a seis – afirmou que “quando há uma manifestação política do Congresso ou do Executivo, o Judiciário não deve ser ativista, deve respeitar a posição política. Mas se não há regra, o Judiciário deve atuar”.

No dia 26 de junho daquele ano, assumiu uma das 11 cadeiras do Supremo, na vaga que até então era do Ministro Ayres Britto, que havia deixado o Tribunal em novembro de 2012, devido à aposentadoria. Barroso chegou quando já estava em julgamento a Ação Penal 470, conhecida como “Mensalão”, e participou da análise dos embargos infringentes.

No período de dez anos na Corte, o ministro convocou audiências públicas no intuito de ouvir e colher sugestões da sociedade civil sobre temas importantes relacionados aos processos em tramitação. Foi assim, por exemplo, em audiências sobre as mudanças climáticas e o Fundo do Clima, candidaturas avulsas sem filiação partidária, o rol taxativo e a amplitude das coberturas por planos de saúde.

Frente aos números alarmantes de infectados pelo coronavírus, partiu do ministro a decisão de instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado, com foco na apuração de eventuais omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia. E como relator do processo sobre a invasão de terras indígenas, proibiu a entrada de não-indígenas nos territórios de povos isolados, inclusive das missões religiosas.

Presidente do TSE – Quando chegou à Presidência do TSE, em maio de 2020, o Ministro Barroso agiu para manter a prestação jurisdicional com julgamentos e reuniões realizadas por videoconferência. À época, defendia que o Brasil encontrasse “denominadores comuns” e se unisse contra a intolerância. O discurso simbólico era resposta ao momento político conturbado, que teve que ser intensificado ao longo de sua gestão para rebater campanhas de desinformação e garantir a realização das eleições municipais, em meio à pandemia de covid-19. Em um trabalho coordenado, o ministro conversou com especialistas em saúde para lidar com os desafios sanitários da época e atuou para evitar o aumento de contaminações durante as eleições.

Barroso também foi pioneiro na modernização do diálogo com a sociedade, passando a promover conversas com os mais jovens. Durante sua gestão, mediou uma série de lives com figuras públicas sobre temas relevantes para as eleições, que contaram com a participação de celebridades como, por exemplo, a atriz Camila Pitanga, o médico Drauzio Varella e o biólogo Atila Lamarino, para ajudar no engajamento da população contra a desinformação.

A “força-tarefa” incluiu a produção de campanhas para as redes sociais do TSE, com vídeos curtos que explicavam o funcionamento das urnas eletrônicas, desde o teste público de segurança até o transporte de equipamentos, os processos de auditoria e o passo a passo da votação. Também foram renovados acordos entre a Justiça Eleitoral e as plataformas digitais para reduzir a disseminação de informações falsas.

Extremismo político – Em mais de uma oportunidade, Barroso se disse favorável à regulação das plataformas digitais no País, principalmente diante dos ataques aos Poderes no dia 8 de Janeiro, cuja organização aconteceu, em grande parte, no ambiente das redes sociais. “Já ficou para trás o tempo em que se imaginava que a Internet pudesse ser livre, aberta e não regulada. É preciso regulá-la em diferentes dimensões”, defende o novo presidente do STF.

O Ministro Barroso considera que “a desinformação, os discursos de ódio, os assassinatos de reputações e as teorias conspiratórias que circulam pela Internet e pelas mídias sociais tornaram-se sérias ameaças à democracia e aos direitos fundamentais das pessoas”. As notícias falsas, segundo ele, têm sido usadas como instrumento do extremismo político, “acirrando a polarização política, fomentando a intolerância e, em última análise, a violência”.

Planos de gestão – A mudança na Presidência do Supremo tem impacto direto na pauta de julgamentos do Tribunal e também traz novidades na condução do CNJ. Como afirmou recentemente em evento da Revista JC (leia na edição de setembro), em sua gestão, Barroso pretende melhorar a prestação jurisdicional, a imagem do Judiciário e também o relacionamento da Justiça com a sociedade. Quer também estimular a produção de diagnósticos sobre a máquina judicial para entender, por exemplo, ao que se deve a sobrecarga de processos trabalhistas no País.

No período de transição para assumir o cargo, o ministro estabeleceu diálogo com os presidentes de tribunais e de associações de juízes para mapear os problemas e colher sugestões. Um dos focos será enfrentar os processos de execução fiscal, que ele considera o maior “gargalo” da Justiça brasileira. A situação carcerária é outro tópico prioritário para Barroso, que, em continuidade ao trabalho desenvolvido na gestão da Ministra Rosa Weber, vai atuar para evitar a violação dos direitos humanos e promover a defesa dos vulneráveis.

Literatura – Ávido leitor e intelectual inquieto, Luís Roberto Barroso é autor de vários livros jurídicos e outros que exploram temas candentes da sociedade brasileira, tendo o interesse público como foco. Dentre seus trabalhos literários mais recentes está a obra “A judicialização da vida e o papel do Supremo Tribunal Federal”, na qual relembra 12 julgamentos históricos realizados pelo STF nos últimos 15 anos.

Já no livro “Sem data venia: um olhar sobre o Brasil e o mundo”, lançado em 2020, Barroso escreve para o público amplo sobre os problemas do País, com reflexões aprofundadas sobre o enfrentamento deles, incluindo a desigualdade, a corrupção, a polarização política e questões relacionadas à educação. Obra do ano seguinte, “Revolução tecnológica, crise da democracia e Constituição: Direito e políticas públicas num mundo em transformação” traz as observações do pensador sobre a era digital.