Transição energética equilibrada, segurança e eficiência

4 de fevereiro de 2022

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Evolução legislativa e regulatóri

A energia, seja como se produz ou é consumida, está em constante evolução desde a Revolução Industrial, mas nas últimas décadas a descarbonização e o empoderamento humano/ ambiental/ social vêm promovendo um movimento irreversível, provocando em uma das pontas a eletrificação da economia com a substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis.

Se antes a energia fóssil, como a obtida com petróleo e carvão, costumava ser uma das mais utilizadas fontes energéticas, que mantinha o mundo funcionando, hoje isso evoluiu e estamos na passagem de uma condição a outra.

Não é mais sustentável continuar consumindo recursos naturais na velocidade atual. A geração e o consumo de energia encaminham-se para serem de baixo carbono, como também se faz necessária a otimização da utilização de bens e serviços. Um novo modelo energético, limpo, seguro, eficiente e inteligente é essencial para o desenvolvimento social, humano, ambiental e econômico em nível mundial.

O setor energético mundial precisa, portanto, estar atento às novas tecnologias, ser eficiente e ter menor custo, permitindo um maior nível de inovação e progresso tecnológico, com inclusão social e respeito ao meio ambiente, ou seja, novos marcos legais e regulatórios.

Além disso, a produção e o consumo de energia a partir de fontes renováveis é um aspecto importante da transição energética, mas o acesso à energia também. Se os esforços não forem intensificados, o mundo não conseguirá garantir o acesso universal à energia e cerca de 660 milhões de pessoas não terão acesso à eletricidade em 2030, conforme o relatório Tracking SDG 7: The Energy Progress Report (2021), divulgado em junho de 2021 pela Agência Internacional de Energia (IEA), Agência Internacional de Energia Renovável (Irena), Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU (UN Desa), Banco Mundial e Organização Mundial da Saúde (OMS).

Compreende-se, portanto, que é preciso que a transição seja acelerada, mas justa e responsável, com planejamento e viabilidade econômica, social, técnica e jurídico-regulatória, pois nem sempre é possível equilibrar o sistema e desenvolver o acesso à energia, de forma eficiente, estável e segura, com fontes renováveis. 

Um combustível intermediário, como o gás natural, que é de origem fóssil, mas com menor emissão de CO2, deve ser considerado, sendo importante pela confiabilidade no suprimento de energia elétrica, flexibilidade operativa e controle de reserva de capacidade.

Relevante sempre lembrar que é uma transição, não um rompimento, sendo, contudo, essencial que seja evolutiva e positiva, acelerada, mas sem abandonar as garantias de segurança e eficiência.

Destaca-se, assim, o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 7 da Agenda 2030 da ONU, que prevê perspectivas num tempo justo, priorizando a energia renovável, mas, igualmente, a eficiência e o acesso à energia, incentivando a modernização e a tecnologia. 

Estima-se que, em 2050, as energias renováveis constituirão mais de 80% do total de geração de energia global, e 66% disso será gerado de fontes variáveis como a energia solar e a eólica. 

A mudança climática como um fator motivador da transição energética, mais o declínio contínuo dos custos e o aumento da capacidade das energias renováveis tornam a escolha econômica e inteligente. 

O desafio, portanto, reside na integração entre os setores produtivos e o Poder Público pela construção de políticas que viabilizem a transição justa, conciliando a inovação tecnológica e atendendo as demandas sociais. 

Assim, as mudanças climáticas, como maior risco global segundo o Fórum Econômico Mundial, tornam premente e irreversível a transição energética para a economia de baixo carbono, mas não se pode exclusivamente por esse ângulo romper e provocar impactos econômicos e sociais negativos, criando-se novos riscos ou tornando a necessidade uma pretensão utópica.

Consequentemente, para além da geração a partir de fontes renováveis, impõe-se uma visão mais ampla, estratégica e sistêmica, visando à máxima eficiência no aproveitamento dos recursos, com universalização e garantia de acesso eficiente diante da diversificação da matriz.

Em razão disso, novas tecnologias, marcos regulatórios e mecanismos de mercado estão surgindo gradativamente para dar os incentivos corretos para que a transição ocorra – enfatize-se – de forma justa. Na realidade, é uma grande oportunidade, de, através da transição energética, buscar equilibrar as diferenças sociais e econômica existentes hoje no planeta.

O setor energético é certamente uma alavanca fundamental na redução das diferenças econômicas e sociais, visto que garante insumo para o desenvolvimento dos demais setores da economia. 

No campo jurídico, as leis e os regulamentos têm que prever incentivos e adequar os custos, promovendo segurança para os investidores e garantindo uma transição energética equilibrada, visando à proteção ao meio ambiente e ao desenvolvimento socioeconômico.

Um conceito que pode ser um grande aliado na transição é o regulatory sandbox (caixa de areia regulatória), testado com sucesso no setor financeiro de diversos países, inclusive, pelo Banco Central do Brasil. No regulatory sandbox, o regulador disponibiliza um espaço reservado para que os agentes testem novos produtos, serviços e modelos de negócios. Além de possibilitar o desenvolvimento ágil de novas soluções por parte desses agentes, o modelo permite que o regulador adquira rapidamente a experiência necessária para melhor regulamentar as soluções no futuro.

Além disso, vários exemplos de legislação, incentivos e políticas públicas pelo mundo são cada vez mais evidentes na trajetória de fontes de energia limpas e seguras, sem afastar a segurança e a eficiência. No Brasil, não é diferente. Em 7 de janeiro de 2022, foi publicada a Lei nº 14.300/2022, que institui: (a) o marco legal da microgeração e minigeração distribuída; (b) o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE); e (c) o Programa de Energia Renovável Social (Pers), que garante e promove segurança nos investimentos em fontes renováveis.

Em 9 de abril de 2021, portanto, também recentemente, foi sancionado o novo marco legal do gás natural (Lei nº 14.134/2021), ampliando a competição e os investimentos no setor. E em 1º de março de 2021, foi sancionada a Lei nº 14.120/2021, que altera diversas outras legislações do setor elétrico brasileiro visando a adequações para uma transição energética.

É verdade que o caminho é desafiador, mas tais iniciativas revelam que possivelmente o Brasil está evoluindo para criar um ambiente legal e regulatório seguro, eficiente e atrativo, sem deixar de observar a proteção às pautas de natureza ambiental, sociais e de desenvolvimento econômico. O certo é que a matéria deve ser considerada uma pauta prioritária e de Estado, evitando desvios que podem afastar e até romper com o que já foi alcançado, bem como compreender que esse trajeto é constante e irreversível.

A diversificação da matriz e o custo de produção de energia são essenciais para o desenvolvimento mundial sustentável, sendo, contudo, necessário um planejamento real, não utópico, sob pena dos avanços se perderem, ou seja, é preciso garantir e evoluir progressivamente para matrizes não poluentes, mas sem qualquer perda de eficiência no suprimento de energia. Portanto, a transição energética é um movimento sem volta, sendo fundamental que os Estados, entidades e empresas, diante de um ambiente de grande oportunidade para mudanças sociais, se adaptem de forma rápida e ágil, utilizem modelos modernos, cooperativos entre si, bem como criem um ambiente favorável ao desenvolvimento de novas tecnologias.

Metas do ODS 7 da Agenda ONU 2030

7.b. Até 2030, expandir a infraestrutura e modernizar a tecnologia para o fornecimento de serviços de energia modernos e sustentáveis para todos nos países em desenvolvimento, particularmente nos países de menor desenvolvimento relativo, nos pequenos Estados insulares em desenvolvimento e nos países em desenvolvimento sem litoral, de acordo com seus respectivos programas de apoio.

7.a. Até 2030, reforçar a cooperação internacional para facilitar o acesso a pesquisa e tecnologias de energia limpa, incluindo energias renováveis, eficiência energética e tecnologias de combustíveis fósseis avançadas e mais limpas, e promover o investimento em infraestrutura de energia e em tecnologias de energia limpa.

7.3. Até 2030, dobrar a taxa global de melhoria da eficiência energética.

7.2. Até 2030, aumentar substancialmente a participação de energias renováveis na matriz energética global.

7.1. Até 2030, assegurar o acesso universal, confiável, moderno e a preços acessíveis a serviços de energia.

Notas___________________________

1 https://www.irena.org/publications/2021/Jun/Tracking-SDG-7-2021

2 http://www.agenda2030.org.br/ods/7/