Edição 205
A quem interessa constranger o Judiciário
21 de setembro de 2017
Jayme Martins de Oliveira Neto
Presidente da AMB
Acampanha contra o Poder Judiciário tem sido intensa nos últimos meses. Os motivos são intuitivos, mas fica sempre a indagação. A quem isso interessa?
O Poder Judiciário, tão logo recebeu material do legislativo ofereceu à sociedade as respostas necessárias e o combate à corrupção, por exemplo, alcançou inéditos resultados.
Nunca a sociedade brasileira imaginou assistir o processo e mesmo a condenação de tantas personalidades, sejam empresárias, sejam políticas, muitos atualmente presos.
Fenômeno semelhante aconteceu na Itália, com a “Operação Mãos Limpas”. Os resultados são mundialmente conhecidos. Houve um ataque brutal ao Poder Judiciário italiano, campanhas de descrédito e muito do trabalho realizado se perdeu.
Aqui a situação caminha para o mesmo rumo.
Desde o famoso “mensalão”, com a novel legislação, o Judiciário vem adotando nova postura diante das leis que permitem o combate à corrupção. Com isso, inúmeras pessoas foram condenadas à prisão e outras tantas ainda respondem por crimes de corrupção, o que a mídia mostra diariamente e o Brasil conheceu os mecanismos que norteavam parte da política e percebeu as vultosas quantias subtraídas indevidamente dos cofres públicos.
Evidentemente, não se pode generalizar. Mas houve inegavelmente uma desestabilização da política e parte da imprensa e do poder político viu nos ataques ao Judiciário a maneira de construir uma nova pauta para a sociedade.
A estratégia não é nova. O serviço público de modo geral vira alvo quando os governos caem no descrédito, mas na sociedade atual os ataques têm alvo certo, a dizer, as polícias, o Ministério Público e o Judiciário. Este último sofreu recentemente ataques diários na imprensa, tanto em relação a seus vencimentos quanto em relação a suas atividades cotidianas. Decisões de juízes, desembargadores e ministros passaram a ser alvo de críticas contundentes, sem o necessário equilíbrio que de regra pautam os comentários, pois todos conhecem o sistema jurídico e sabem que as decisões se sujeitam a recursos.
Aliás, nenhuma outra carreira de Estado sofre tantos controles quanto o Poder Judiciário. Temos o controle social, o controle da mídia, o controle das partes e dos advogados, as corregedorias, o Conselho Nacional de Justiça e ainda o próprio Judiciário, pois não são poucas as ações cíveis ou criminais propostas contra os integrantes da magistratura.
Todavia, as investidas não cessam. Chegou-se ao extremo, agora, de atacar diretamente as pessoas, com afirmações desprovidas de um mínimo de provas ou indícios. Juízes e desembargadores já sofrem com isso há tempos e mais recentemente buscou-se atingir os tribunais superiores. Na imprensa, três ministros do STJ, Napoleão Nunes Maia Filho, João Otávio de Noronha e Mauro Campbell, tiveram seus nomes citados sem qualquer elemento de prova. Mas também ministros do STF foram atingidos, como a própria presidente, ministra Cármen Lúcia, sem possibilidade de defesa. Não são os únicos. Não foram os primeiros e, pelo caminhar, não serão os últimos.
Não mais se esconde o interesse em denegrir o Judiciário, mas é hora de se colocar um basta nisso. Não se pode manchar honras, destruir carreiras, levantar suspeitas desprovidas de um mínimo de provas. São os costumes coronelistas que insistem em permanecer, mas o Brasil precisa avançar, subir um patamar na democracia, aprimorar as instituições políticas e sociais.
Há muito a percorrer para quem pretende construir um Brasil melhor. No âmbito do Judiciário, repensar as estruturas ainda coloniais, aprimorar o sistema recursal, alterar a cultura do litígio, dentre outras medidas que por certo permitirão alterar o quadro de quase 80 milhões processos aguardando definição. Mas isso somente se alcança com um Judiciário forte e respeitado, o que por certo não se alcançará com esse nível de ataques infundados e a tentativa absurda de se amesquinhar a Justiça.
O Poder Judiciário brasileiro tem um volume de processos despropositados e sem paralelo com os países avançados. As estatísticas do CNJ demonstram a eficiência dos magistrados brasileiros que, na qualidade de presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, posso afiançar. Temos senão a melhor, uma das melhores magistraturas do mundo, tanto pela qualidade moral de seus integrantes quanto pela qualidade cultural e científica e não podemos admitir esse ataque sem precedentes aos quadros do Judiciário. Daí o alerta sempre permanente da AMB no sentido de que, nesse momento, é a sociedade quem deve proteger o Judiciário, para que este continue firme no desempenho de suas funções e a garantir o pleno desenvolvimento da democracia, sob o império da Constituição da República.