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A estruturação do TJRJ para enfrentar os desafios das sociedades empresariais em crise

12 de julho de 2023

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A Lei no 11.101/2005 ou Lei da Recuperação Judicial e de Falências (LRJ) como ficou conhecida pelo público completou este ano a sua maioridade. Instituída para disciplinar a recuperação judicial, extrajudicial, a falência do empresário e da sociedade empresária, a lei foi promulgada há 18 anos, precisamente em fevereiro, e garantiu segurança jurídica à sociedade empresarial em crise financeira.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) foi pioneiro na sua aplicação com o ajuizamento na 8a Vara Empresarial do pedido de recuperação judicial de uma empresa que, naquela época, representava o símbolo na aviação comercial brasileira e imagem construída por quase oito décadas e que a levaram a ser respeitada nos cinco continentes: a Varig.

Com imenso déficit financeiro que já afetava as suas operações no mercado e ameaçava o desemprego em massa de trabalhadores especializados, a Varig foi a primeira empresa de grande porte a se socorrer da novata Lei no 11.101/2005, ingressando com o pedido de recuperação judicial no dia 17 de junho, isto é, apenas quatro meses após ela ter entrado em vigor.

Foi preciso a criação de uma força-tarefa composta de juízes para viabilizar as recorrentes demandas surgidas com interpretação jurídica por parte dos credores nacionais e internacionais. Afinal, o Judiciário fluminense ficou à frente de um grandioso desafio, que consistia em sanear uma companhia do porte da Varig, com mais de 17 mil empregados, centenas de credores nacionais e internacionais, cinco milhões de cartões de crédito e principal transportadora de mais de 13 milhões de passageiros por ano dentro do Brasil e daqui para o exterior.

O Judiciário trabalhou incessantemente para dar fôlego e encontrar solução para atender os credores. Parte do ativo chegou a ser vendida para outra empresa aérea, com direito a usar a cobiçada marca Varig. A falência da antiga Varig foi decretada a pedido do administrador e gestor judicial do polo passivo, pois não havia como honrar o pagamento das dívidas. Foi um capítulo triste na história da aviação comercial brasileira. Contudo, jamais deve ser traduzida como uma derrota jurídica.

A Lei no 11.101/2005 alterou o regime do direito falimentar previsto no Decreto-Lei no 7.661/1945, introduzindo o conceito de recuperação em substituição à concordata. A Lei de Recuperação Judicial foi considerada à época da sua promulgação uma das mais modernas do mundo e se constituiu em um avanço jurídico se comparada à legislação anterior. Com a evolução das relações industriais e comerciais, juristas têm defendido, já há algum tempo, ser imperioso a sua adequação, em razão dos obstáculos existentes no funcionamento dos processos de recuperação judicial.

Neste artigo, não vou me alongar em torno da discussão da efetividade da aplicação da LRJ, especialmente pelo fato da realidade empresarial atual apresentar modelos distintos aos da época da sua concepção.

Aproveito esta oportunidade para destacar que, ao longo dessas quase duas décadas de existência da LRJ, as mais diversas empresas, muitas delas emblemáticas no sistema corporativo nacional, entraram com pedidos de recuperação judicial nas Varas Empresariais do Tribunal de Justiça. Temos como exemplo a Oi, também uma megaempresa.

Em junho de 2016, o grupo do segmento de telecomunicações apresentou o seu primeiro pedido de recuperação judicial e, de acordo com dados divulgados na ocasião, a dívida bruta da companhia seria superior a R$ 74 bilhões, tendo sido compreendidos pelo processo em R$ 65,4 bilhões, e milhares de credores, especialmente na classe trabalhista. Faço um parêntesis para acrescentar que, em março passado, a Oi ingressou com um novo pedido de recuperação judicial, poucos meses depois de ter saído de um processo semelhante, cuja conclusão durou seis anos.

Nos últimos anos, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro foi e continua sendo o esteio das grandes, médias e pequenas sociedades empresariais em crise, que buscam a Justiça para dar segurança à reorganização das suas finanças e a repactuação das dívidas junto aos credores.

Somente neste ano, que marca o início da minha gestão no TJRJ, temos um rol de empresas que ingressaram com pedidos baseados na LRJ. Na lista constam, entre outras, a Oi, como citei, a concessionária de energia Light, o grupo Petrópolis e a Americanas, que alegou ter dívida de R$ 43 bilhões com 16,3 mil credores. Cada pedido de recuperação judicial se transforma em um processo volumoso com a reunião dos despachos, decisões judiciais e petições dos advogados das partes. Em torno dele, giram outros processos com pedidos de credores, buscando exercer o seu direito e a preservação do seu investimento. Neste cenário, temos um trânsito intenso na primeira e segunda instâncias do Tribunal.

Assim como a Oi, a Varig, a Americanas, todas essas empresas significam o dimensionamento da importância e da inevitabilidade de um Judiciário forte, que precisa estar preparado para o acolhimento das demandas imprescindíveis à sociedade e atuante nas relações conflitantes.

Sensível à questão e para manter o Poder Judiciário fortalecido, logo que assumi a gestão do TJRJ promovi uma reestruturação organizacional. A fase de transformação tem sido contínua, pois entendo ser necessária a especialização nos mais diversos setores que movem a máquina da Justiça.

A especialização é o caminho da segurança jurídica, da previsibilidade e que oferece uma base forte para a atuação dos nossos juízes e desembargadores.

Por exemplo, no caso específico da aplicação da Lei de Recuperação Judicial, o TJRJ tem previsão para instalação de câmaras de Direito Empresarial tão logo ultimado o novo regimento interno, ora em construção.

Creio que uma especialização bem conduzida produzirá benéficos resultados, uniformizando entendimentos necessários à área empresarial.