Breves estudos sobre a desaposentação

24 de novembro de 2014

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Flavia-Serizawa1. Considerações iniciais
tema da desaposentação tem sido submetido reiteradamente à análise do Poder Judiciário. Como se sabe, aquele que se aposenta e continua trabalhando é obrigado a continuar vertendo contribuições ao sistema previdenciário, sendo que a constitucionalidade da cobrança de tais contribuições já foi, inclusive, declarada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A questão que se coloca, então, é a possibilidade de que o aposentado que continua a trabalhar possa renunciar à aposentadoria que recebe e, adicionando ao tempo de contribuição anterior aquele posterior à sua aposentadoria, possa obter benefício mais vantajoso.

Isso pode ser vislumbrado, a título ilustrativo, em relação àquele que se aposenta proporcionalmente, hipótese ainda existente para aqueles já filiados ao regime anteriormente à Emenda Constitucional no 20 de 1998, e que, após reunir tempo suficiente para aposentadoria integral, requer a renúncia daquele primeiro benefício, a fim de obter benefício mais vantajoso.

A situação mostra-se bastante comum, especialmente levando-se em consideração que o sistema previdenciário brasileiro ainda hoje permite aposentadoria com idade relativamente baixa em relação aos demais países, o que permite que indivíduos que ainda possuem plena capacidade de trabalho se aposentem, bem como em função dos baixos valores das aposentadorias.

O tema merece ser revisitado, tendo em vista que sua constitucionalidade deve ser em breve retomada pelo STF (RE no 381.367).

São inúmeros os autores que definem a desaposentação. A respeito do tema, Sérgio Pinto Martins sustenta que “desaposentação é a renúncia a aposentadoria, visando contar o tempo de serviço anterior para futura aposentadoria, no mesmo ou em outro regime” (MARTINS, 2011, p. 347).

Já Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari afirmam que “é o ato de desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário” (2011, p. 599).

Por sua vez, Marisa Ferreira dos Santos defende que “desaposentação é, então, a desconstituição do ato de concessão da aposentadoria, que depende da manifestação de vontade do segurado” (2011, p. 326).

Observa-se que as diferenças na definição do instituto refletem, na realidade, as divergências existentes a respeito do tema, que refletem ainda a multiplicidade de entendimentos na jurisprudência pátria.

Os principais temas que devem ser analisados antes de se chegar a uma conclusão no que tange à desaposentação são: (i) a aposentação se trata de um direito renunciável ou viola o ato jurídico perfeito, constitucionalmente assegurado?; (ii) a desaposentação é legalmente acolhida em nosso ordenamento jurídico?; (iii) o beneficiário quando continua contribuindo ao sistema contribui em seu próprio benefício? (iv) a desaposentação implica o dever de devolver as parcelas já recebidas a título de aposentadoria até então?

São esses os temas que serão analisados ao longo do presente texto, a fim de que se chegue a uma conclusão a respeito da desaposentação.

2. Da possibilidade de renúncia à aposentadoria
A primeira questão que deve ser respondida quando se analisa a viabilidade da desaposentação diz respeito à possibilidade de renúncia da aposentadoria, ou se sua renúncia implicaria violação ao ato jurídico perfeito. Muitos defendem que o ato de aposentadoria constituiria ato jurídico perfeito, motivo pelo qual seu desfazimento afrontaria texto constitucional, nos termos do artigo 5o, XXXVI.

Também se invoca o artigo 181-B do Decreto no 3.048/1999, que afirma que as aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial são irreversíveis e irrenunciáveis, a não ser que requeridas antes do recebimento do primeiro pagamento ou antes do saque do FGTS ou PIS.

Contudo, os que admitem a renúncia da aposentadoria ponderam que a proteção ao ato jurídico perfeito, que decorre da segurança jurídica, constitui garantia em favor do indivíduo, podendo ser afastada quando visa ao próprio benefício, como se daria no caso da desaposentação, sendo este o entendimento que prevalece na doutrina pátria.1

Em nossa opinião, o ato de aposentadoria é renun­ciável pela sua própria natureza, na medida em que a aposentadoria somente verte benefícios ao próprio aposentado, e não ao INSS, motivo pelo qual sua disposição, por si só, não implicaria prejuízo à autarquia previdenciária em nenhuma hipótese. No mais, o beneficiário não pode continuar aposentado à sua revelia, sobretudo em razão de texto de decreto, que não se sobrepõe à natureza do instituto. Além disso, a proteção ao ato jurídico perfeito deve visar ao benefício do indivíduo, e não ao seu prejuízo. Assim sendo, não haveria óbice, em princípio, à renúncia à aposentadoria.

Contudo, deve ser consignado que o fato de defendermos a possibilidade de renúncia à aposentadoria não significa que a análise a respeito da possibilidade de desaposentação prescinda de outros requisitos.

3. Da legalidade da desaposentação no ordenamento pátrio
Em relação ao tema, igualmente existem duas correntes a respeito. A primeira delas se apoia no parágrafo único do artigo 18 da Lei no 8.213/1991, que determina que “o aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado” (Redação dada pela Lei no 9.528, de 1997).

Assim sendo, se a lei veda ao aposentado que retornar ao mercado de trabalho a concessão de “qualquer prestação” pela Previdência Social, salvo aqueles legalmente discriminados, as contribuições vertidas ao RGPS posteriormente à inativação não podem gerar qualquer pretensão do segurado já aposentado, seja para o recebimento de benefício mais vantajoso, seja para majoração de sua renda mensal de aposentadoria anteriormente deferida.

Aliás, seria verdadeiramente vedado ao INSS conceder desaposentação, uma vez que estaria indo de encontro ao princípio da legalidade, que rege toda a Administração Pública, nos termos do artigo 37, caput, da Constituição Federal.2

Contudo, tal construção perde força ao se verificar que a obtenção de nova aposentadoria não se encontraria abrangida pelo § 2o do artigo 18 da Lei no 8.213/1991, uma vez que, na realidade, em primeiro lugar se renunciaria à aposentadoria concedida, para então se pleitear novo benefício.

Assim sendo, na realidade não se aplicaria o citado dispositivo legal, uma vez que quando da concessão de nova aposentadoria, o beneficiário não estaria, na realidade, em gozo de aposentadoria, pois a esta haveria renunciado.

4. Da destinação das contribuições do aposentado
Um óbice verdadeiramente oponível à desaposentação diz respeito, na realidade, à natureza de nosso sistema previdenciário e dos princípios que o regem. Com efeito, verifica-se que a Seguridade Social é regida pelo princípio da solidariedade, entre outros.3

No mais, verifica-se ainda que nosso ordenamento alberga o princípio da diversidade da base de custeio, segundo o qual o custeio da Seguridade Social é devido por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, além das contribuições sociais dos empregadores, dos trabalhadores e sobre a receita de concursos de prognósticos (artigo 195 da Constituição Federal).

Alie-se a tais princípios o fato de que nosso sistema é de repartição simples, e não de capitalização, cuja diferenciação é essencial para o entendimento da questão.

Quanto ao ponto, destaque-se que, no sistema de capitalização, inspirado em técnicas de seguro e poupança, cada indivíduo reúne recursos para que cada beneficiário seja contemplado no devido tempo, quando da ocorrência da contingência. Cada geração, assim, financia suas próprias contingências.

Por outro lado, no sistema de repartição simples, as contribuições de cada indivíduo servem para financiar não as suas próprias contingências, mas as da geração passada, de modo que as quantias arrecadadas sirvam para o custeio das prestações devidas ao mesmo tempo da arrecadação.

Assim sendo, levando-se em consideração os princípios da solidariedade e da diversidade da base de custeio vigentes em nosso ordenamento, bem como o sistema de repartição simples, verifica-se que, na realidade, em nosso sistema, o trabalhador contribui para financiar o sistema como um todo, e não diretamente a sua aposentadoria. Dessa forma, a sua contribuição é vertida ao custeio do sistema como um todo, uma vez que o sistema de custeio é solidário.

Assim, é equivocado o pensamento no sentido de que o aposentado que continua contribuindo estaria, na realidade, fazendo uma espécie de “poupança” em nome próprio, pois suas contribuições vertem ao sistema, e não em seu benefício.

Portanto, as contribuições previdenciárias cobradas dos aposentados que permanecem trabalhando financiam o sistema como um todo. É irrelevante, portanto, quequem contribua não venha a ter proveito algum em razão deste recolhimento, pois a contribuição não é direcionada a si próprio, mas ao sistema (RGPS), que dela precisa para manter-se atuarialmente viável.

A Constituição Federal e a legislação federal permitem a taxação dos inativos por contribuição previdenciária, imunizando, apenas, os rendimentos do próprio benefício de aposentadoria ou pensão, estando excluídos da imunidade, em consequência – e sujeitos à taxação –, todos os rendimentos obtidos pelo trabalhador já inativo que permaneceu no mercado de trabalho, nos termos do artigo 12 da Lei no 8.212/1991.

A tributação dos inativos do RGPS não é um fato isolado. Tal incidência tributária existe também para os servidores públicos desde a Emenda Constitucional no 41/2003 e atinge inclusive o rendimento de suas aposentadorias, tendo sido declarada constitucional pelo STF.4

Assim sendo, verifica-se que os princípios que regem nosso ordenamento, bem como o sistema de repartição simples efetivamente, constituiriam óbices à concessão do pleito de desaposentação, a impedir o deferimento de pedidos judiciais nesse sentido.

5. Da necessidade de devolução dos valores recebidos
Existem argumentos contrários à devolução, especialmente levando-se em consideração que, sendo a desaposentação ato desconstitutivo, não haveria restabelecimento do status quo ante, com produção de efeitos apenas a partir da decisão que desconstituiu a aposentação (efeitos ex nunc, portanto).

Existe ainda o argumento de que, em se tratando da verba recebida a título de aposentação de verba alimentícia, havendo sido recebida de boa-fé e sendo efetivamente devida ao beneficiário, não haveria que se falar em dever de devolução de referidas parcelas.5

Contudo, existem inúmeros fundamentos pela necessidade de devolução. O principal deles diz respeito à necessidade de preservação do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, que é um princípio específico da Previdência Social e segundo o qual “o Poder Público deverá, na execução da política previdenciária, atentar sempre para a relação entre custeio e pagamento de benefícios, a fim de manter o sistema em condições superavitárias e observar as oscilações da média etária da população, bem como sua expectativa de vida, para a adequação a estas variáveis” (CASTRO e LAZZARI, 2011, p. 121).

Assim sendo, verifica-se que o benefício concedido inicialmente ao beneficiário tinha um valor menor levando-se em consideração diversas variáveis, entre elas tempo de contribuição reduzido e expectativa de vida longa, a refletir na diminuição de sua renda mensal inicial, mas permitindo a percepção do benefício por um período, em tese, maior.

Dessa forma, aquele que opta por se aposentar mais cedo sabe que perceberá renda mensal menor, mas por maior tempo.

Contudo, ao pedir sua desaposentação utilizando-se tempo de contribuição posterior à sua aposentação, estar-se-ia, na realidade, percebendo dupla vantagem, em prejuízo do sistema, pois haveria aposentação mais cedo com uma renda menor e, posteriormente, nova aposentação com alteração das variáveis tempo de contribuição e expectativa de vida em favor do beneficiário, que na realidade perceberia vantagem duplamente, em prejuízo ao sistema, que financiaria tanto sua aposentadoria precoce em menor valor quanto o pagamento de benefício maior posteriormente.

Daí a necessidade de devolução dos valores percebidos, a fim de equalizar sua situação perante o sistema.

A necessidade de devolução dos valores é posição que prevalece em nossa doutrina.6 Também entendemos que deve prevalecer a devolução dos valores recebidos, em razão do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema. No mais, não cabe opor os argumentos de boa-fé no recebimento das prestações, bem como que elas eram efetivamente devidas, sendo a desaposentação ato desconstitutivo com efeitos ex nunc, pois a devolução é requisito da concessão do pedido, sendo que a desaposentação é opção do beneficiário, que poderá dela abrir mão e continuar aposentado.

Diante do exposto, verifica-se que, ainda que se admita, em tese, a possibilidade de desaposentação em nosso sistema, um dos requisitos para sua concessão haveria de ser a devolução dos valores já percebidos, com vistas à preservação do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema.

6. Considerações finais
De tudo que foi exposto, conclui-se que o ato de desaposentação implica renúncia do direito à aposentadoria, não encontrando vedação legal expressa em nosso ordenamento jurídico e não violando o ato jurídico perfeito. Contudo, não seria viável em razão do princípio da solidariedade vigente em nosso sistema previdenciário, segundo o qual a contribuições pagas pelo segurado não são vertidas em seu próprio benefício, mas sim em benefício do sistema.

Mesmo que se admita a viabilidade da desaposentação, como vem sendo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, ainda assim deve ter como pressuposto a devolução dos valores percebidos anteriormente à segunda aposentação, sob pena de enriquecimento ilícito do segurado.

No entanto, ressalta-se que ainda se está longe de uma solução pacífica a respeito do tema, o que somente deve acontecer após o julgamento do RE no 381.367 no Supremo Tribunal Federal.

Notas _______________________________________________________________________

1 A esse respeito, citam-se os seguintes doutrinadores: “Não seria de se admitir que, gozando de direito fundamental social, o autor viesse, diante de hipótese mais favorável incorporada ao seu patrimônio jurídico, a ser prejudicado com a manutenção de determinado ato anterior apenas porque supostamente realizado em conformidade com a legislação aplicável à época em que postulou o direito. Não haveria, ainda, como se acreditar que o ato jurídico perfeito constitua valor absoluto, que não possa ser, enquanto decorrente do princípio constitucional da segurança jurídica, cotejado com outros princípios e sopesado à luz da fundamentalidade do direito social” (CORREIA e CORREIA, 2010, p. 305).
“Tem entendido o INSS que a aposentadoria é irrenunciável, dado seu caráter alimentar, só se extinguindo com a morte do beneficiário. E lhe atribui o caráter de irreversibilidade, por considerar a aposentadoria um ato jurídico perfeito e acabado, só podendo ser desfeito pelo Poder Judiciário em caso de erro ou fraude na concessão. Entendemos que a renúncia é cabível, pois ninguém é obrigado a permanecer aposentado contra seu interesse. E, neste caso, a renúncia tem por objetivo a obtenção futura de benefício mais vantajoso, pois o beneficiário abre mão dos proventos que vinha recebendo, mas não do tempo de contribuição que teve averbado” (CASTRO e LAZZARI, 2011, p. 599).
“É admitida a desaposentação, ou seja, o aposentado retornar à situação anterior, deixando de ter essa condição. Ninguém é obrigado a permanecer aposentado, contra seu interesse. O Estado deixa de ter a despesa no pagamento do benefício. É uma espécie de renúncia do segurado à aposentadoria. Desaposentação é um ato desconstitutivo. A Constituição não veda a desaposentação. A Lei 8.212 e 8.213 também não o fazem. O que não é proibido, é permitido. Há acórdãos do TCU permitindo a desaposentação. O objetivo é poder requerer outra aposentadoria e até mais vantajosa, com a utilização do tempo de serviço. A norma não pode ser interpretada contra o segurado, com o intuito de obrigá-lo a permanecer aposentado. A desaposentação é um direito patrimonial de caráter disponível. Não há lei que deve a desaposentação. O INSS não pode obrigar alguém a continuar aposentado, recebendo o benefício” (MARTINS, 2011, p. 347).
2 Observe-se que tal posição é defendida por autores de renome, tais como Marisa Ferreira Santos, para quem “a desaposentação não está prevista em lei. Por isso, não pode o INSS ‘desaposentar’ o segurado e aposentá-lo novamente, acrescendo o período de contribuição decorrente da nova atividade, sob pena de violar o princípio da legalidade, que vincula a Administração Pública” (SANTOS, 2011, p. 325). No entanto, referida autora não descarta a possibilidade de concessão da desaposentação pelo Poder Judiciário, ao menos em tese. Confira-se:
“Entretanto, as disposições do RPS não autorizam concluir pela impossibilidade da desaposentação. De início, porque contém restrição de direito que só a lei pode impor. Depois porque, a nosso ver, a desaposentação não configura renúncia ao benefício. Só seria cabível invocar a renúncia se o aposentado simplesmente deixasse de receber os proventos, com o que a renúncia produziria efeitos ex nunc, ou seja, a partir do requerimento. Não é o que ocorre na desaposentação porque o aposentado pretende fazer cessar um benefício para, depois, somar o tempo considerado na sua concessão com outros períodos, no mesmo ou em outro regime, para fins de obtenção de nova aposentadoria” (SANTOS, 2011, p. 326).
3 A respeito de referido princípio, esclarece Sérgio Pinto Martins que “a solidariedade pode ser considerada um postulado fundamental do Direito da Seguridade Social, previsto implicitamente inclusive na Constituição. (…) Ocorre solidariedade na Seguridade Social quando várias pessoas economizam em conjunto para assegurar benefícios quando as pessoas do grupo necessitarem. As contingências são igualmente distribuídas entre todas as pessoas do grupo. Quando uma pessoa é atingida pela contingência, todas as outras continuam contribuindo para a cobertura do benefício do necessitado” (op. cit., p. 53-54).
4 “Sendo o regime de financiamento da previdência social, nos termos da CF inspirado pelos princípios da solidariedade e da obrigatoriedade, a contribuição não pressupõe, sempre, uma contraprestação. Na redação atual do dispositivo focado, o segurado aposentado poderá habilitar-se apenas aos benefícios de salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. Paradoxalmente, o art. 103 do RPS assegura à aposentada que retorna à atividade o pagamento de salário-maternidade, hipótese que, além de rara na prática, em princípio seria ilegal. O tempo de serviço posterior à aposentadoria não pode ser empregado para a revisão de aposentadoria proporcional”. (ROCHA e BALTAZAR JÚNIOR, 2008. p. 110-111).
Quanto ao ponto, Marisa Ferreira Santos também observa que “há posicionamento no sentido de que a aposentadoria constitui ato jurídico perfeito, o que impossibilitaria seu desfazimento ainda que por vontade de seu titular. Argumentam outros, em sentido contrário, que as garantias constitucionais não podem ser invocadas em prejuízo dos direitos do segurado, impedindo-o de obter benefício mais vantajoso” (SANTOS, p. 327). E continua: “ao nosso ver, a questão não está bem colocada. Realmente, os direitos e garantias individuais constitucionalmente consagrados não podem ser invocados para fins de restringir direitos. Porém, em matéria previdenciária, a questão transcende o indivíduo e atinge o grupo social protegido pelo sistema. Os regimes previdenciários públicos no Brasil adotam o sistema de repartição simples, alimentado pela solidariedade. Reparte-se o todo pelo número de necessitados de proteção social previdenciária. A desaposentação poderia ser admitida, talvez, se estivéssemos diante de regime de previdência de capitalização, em que o segurado financia o próprio benefício numa espécie de fundo de administração, cuja finalidade seria a concessão de um benefício futuro com base em tais contribuições. Entretanto, o constituinte do 1988 optou pelo regime de previdência baseado na solidariedade, em que as contribuições são destinadas à composição de fundo de custeio geral do sistema, e não a compor fundo privado com contas individuais. A opção pelo regime de repartição simples não dá espaço para imaginar que as contribuições vertidas pelos segurados seriam destinadas à composição de cotas a serem utilizadas posteriormente em uma eventual aposentadoria”. (SANTOS, 2011, p. 327-328).
5 Nesse sentido a posição de Marcus Orione Gonçalves Correia e Érica Paula Bachara Correia. Confira-se: “Quanto aos valores já percebidos a título da aposentadoria renunciada, não há que se exigir o seu ressarcimento para os cofres públicos. Primeiro, o ato de renúncia, como qualquer ato de natureza desconstitutiva, opera efeitos ex nunc, não sendo possível surtir efeitos para o passado – inclusive quanto à necessidade de pagamento de valores já vertidos para o Regime Próprio. […] Por outro lado, há impossibilidade de se poder indicar, em regime de solidariedade, o valor a ser devolvido. Não há como se determinar o valor a ser restituído pelo fato de que este não decorre apenas, e imediatamente, da quantia percebida pelo segurado no período em que esteve no gozo do benefício do qual pretende renunciar”. (CORREIA e CORREIA, 2011, p. 310).
6 Nesse sentido, destaca-se o posicionamento de Marisa Ferreira dos Santos, para quem “somente a lei poderá dispensar o beneficiado da devolução dos proventos recebidos quando aposentado. E, caso prevaleça a obrigatoriedade da restituição, somente lei poderá estabelecer a forma de cálculo” (SANTOS, 2011, p. 332). Sérgio Pinto Martins igualmente defende que “a devolução do recebido é necessária para preservar o equilíbrio atuarial e financeiro do sistema. O trabalhador não pode querer receber aposentadoria no futuro sem ter recolhido o suficiente para o sistema, de acordo com a previsão legal. A aposentadoria compreende regime contributivo por parte do próprio segurado. Com a desaposentação, há a restituição das partes ao estado anterior. O trabalhador não está aposentado e há necessidade de ser devolvido o valor recebido ao INSS. A Previdência Social tem natureza contributiva por parte do segurado (art. 201 da Constituição), exigindo que o trabalhador devolva o valor para ser computado para futuro benefício” (MARTINS, 2011, p. 347).

Referências bibliográficas ________________________________________________________

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 13. ed. São Paulo: Modelo, 2011.
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves Correia; CORREIA, Érica Paula Barcha Correia. Curso de direito da seguridade social. 5. ed. São Paulo: [s.n.], 2010.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. 4. ed. São Paulo: LTr, 2011.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 31. ed. São Paulo: Atlas, 2011.
ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à lei de benefícios da previdência social. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.
SANTOS, Maria Ferreira dos. Direito previdenciário esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2011.
VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Previdência social. 2. ed. São Paulo: LTr, 2008.