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Juiz Federal dos EUA Peter J. Messitte e presidente dos EUA Donald J. Trump

11 de outubro de 2018

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O Juiz Federal dos Estados Unidos Peter J. Messitte e eu somos amigos por mais de 50 anos. Nós servimos como voluntários do Corpo da Paz juntos no Brasil nos anos 60, nos tornamos sócios após nosso retorno aos Estados Unidos, e temos sido amigos muito próximos desde então.

Eu estou encantado com a oportunidade de discutir um caso histórico que ele recentemente decidiu relativo à possível corrupção por parte do Presidente dos Estados Unidos Donald J. Trump.

Uma Cláusula da Constituição dos Estados Unidos, a Cláusula de Emolumentos Estrangeiros, prevê que nenhuma pessoa que ostente um cargo com lucro ou de confiança nos Estados Unidos possa receber qualquer presente, emolumento, cargo ou título de qualquer espécie de um governo estrangeiro, exceto se houver aprovação do Congresso. A Cláusula de Emolumentos Domésticos, que se refere aos governos federal e estadual (não estrangeiro), diz especificamente que o salário do Presidente não deverá ser aumentado por um emolumento.

Até a decisão de 52 laudas do Juiz Messitte ter sido escrita há poucas semanas, nenhuma dessas Seções havia sido interpretada por uma Corte Federal.

É bem conhecido que Donald Trump, um bilionário, tenha um império de negócios de hotéis, restaurantes, espaços de encontro, etc., pelo mundo. Uma de suas propriedades premiadas é o Trump Hotel International, em Washington, Distrito de Columbia, o qual durante o curto período de sua existência trouxe milhões de dólares em receita. Mesmo antes de o Presidente Trump tomar posse no cargo, muitos comentaristas estavam citando sua possível violação da Cláusula de Emolumentos Estrangeiros em razão da propriedade de tais estabelecimentos, muitos dos quais especificamente atendem a governos estrangeiros.

Eventualmente, os Procuradores Gerais do estado de Maryland e do Distrito de Columbia decidiram que as instalações de hotel e espaço para eventos em suas respectivas competências estavam em injusta desvantagem pelo reluzente Trump International hotel no Distrito de Columbia, então eles houveram por bem ajuizar ação contra o Presidente baseando-se na Cláusula dos Emolumentos. Os advogados do Presidente argumentaram que as Seções não se aplicam a ele porque está fornecendo um serviço por meio de seu hotel e que está apenas obtendo justo pagamento em retorno. Os Procuradores Gerais, contudo, argumentaram que a palavra “emolumento” em ambas as Seções referiu-se não somente a pagamentos adicionais ao salário do Presidente; ela incluiu qualquer “lucro”, “ganho” ou “vantagem” que ele possa receber de governo estrangeiro, federal ou estadual, independentemente de ter sido ou não em conexão com seu cargo como Presidente. Os Autores apontaram para o fato de que vários governos estrangeiros fizeram declarações à imprensa de que estavam permanecendo no Trump International Hotel expressamente para obter favores com o Presidente.

A matéria foi levada primeiro ao Juiz Messitte, que tem sido um Juiz Federal de primeiro grau por 25 anos (por 8 anos como um Juiz de Tribunal estadual), para decidir se o Estado de Maryland e o Distrito de Columbia possuiriam “legitimidade” para estarem em juízo. Em uma decisão prévia, o Juiz decidiu que eles possuíam.

A questão então surgiu: o que a palavra “emolumento” significa? Poucos norte-americanos jamais chegaram a utilizar a palavra “emolumento” em uma frase até agora e a maioria não tem ideia do que isto significa. Como um verdadeiro estudioso, o Juiz Messitte nos iluminou a todos. Os Autores reuniram uma montanha de provas históricas incluindo estudos de centenas de dicionários dos Séculos XVII, XVIII e XIX que definiram a palavra “emolumento” como qualquer “lucro”, “ganho” ou “vantagem”. Apenas alguns poucos dicionários do mesmo período amarraram o termo diretamente a trabalho. E havia numerosos outros usos do termo pelos Pais Fundadores, estudiosos legais e outros do período (p.ex. Adam Smith), que estavam totalmente acordes com a visão dos Autores. O caso foi vigorosamente debatido por ambos os Advogados dos Autores e do Presidente.

Seis semanas após oitiva dos argumentos orais dos advogados, o Juiz Messitte proferiu sua decisão de 52 laudas, adotando o ponto de vista dos Autores. A palavra “emolumento”, ele concluiu, significa essencialmente qualquer “lucro, ganho ou vantagem”, de modo que, na medida em que o Presidente esteja recebendo receitas de governos estrangeiros por meio do Trump International Hotel, os Autores lograram demonstrar alegações viáveis de violação à Cláusula de Emolumentos Estrangeiros e, na medida em que o Presidente esteja recebendo receitas de governos de Estados permanecendo no hotel, eles (Autores) demonstraram uma viável reclamação de violação da Cláusula de Emolumentos Domésticos também.

A decisão foi imediatamente considerada histórica e universalmente consagrada pela imprensa nacional e outras mídias.

Indubitavelmente, batalhas titânicas estão por vir. O que será a Defesa do Presidente? Conseguirá ele suspender o prosseguimento do processo por meio de recurso contra decisão interlocutória? Que tipo de inquirição (p.ex. dilação probatória) poderão os Autores utilizar em relação às questões financeiras do Presidente? Ele tem sido notoriamente resistente a revelar informação financeira privada, incluindo suas restituições tributárias. Até o Presidente Trump, este tipo de informação fora invariavelmente disponibilizada por todos os Presidentes. Esta e outras questões além dessa permanecem.

Mas ao mínimo se pode dizer que, desde a decisão do Juiz Messitte, a porta tem sido aberta à exploração de atividade financeira inapropriada por parte do Presidente que, nós somos lembrados, o Presidente Nixon estava para aprender durante o escândalo de Watergate no início dos anos 70, certamente não está acima da lei.