OAB efetiva espaços da mulher advogada

7 de março de 2020

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Mulheres levantam bandeiras do universo feminino e encaram os desafios da advocacia contemporânea

Neste mês de março, quando as discussões da 3ª Conferência Nacional da Mulher Advogada tiverem se encerrado, a Ordem dos Advogados do Brasil terá dado mais um passo no caminho para a efetivação dos espaços da mulher no cenário jurídico. A pauta de uma advocacia mais igual, com ações afirmativas, vem resultando em uma mudança no perfil da Ordem. Na última década, a participação de mulheres no Conselho Federal cresceu em quase 1.000%, advogadas estão em cargos de direção, participam ativamente nas seccionais, em um processo no qual os avanços são contínuos.

De forma atuante, a Comissão Nacional da Mulher Advogada (CNMA) trabalha para o exercício da advocacia sem restrição de gênero, sem assédio e sem preconceito, na perspectiva de que a mulher ocupando os espaços se torna agente de transformação para uma sociedade mais igual. “Temos desafios por sermos mulheres e precisamos entender quais são esses desafios”, explica a presidente da comissão, Daniela Borges.

“É preciso construir uma sociedade mais igual, não no sentido de suprimir as diferenças, mas respeitando e incluindo as diferenças de maneira que todos possam gozar dos mesmos direitos, oportunidades e com a liberdade de sermos o que quisermos e de estarmos onde quisermos”, completou.

Hoje, homens e mulheres dividem quase que paritariamente o quadro da advocacia no Brasil. São 583.591 advogadas e 593.909 advogados inscritos na Ordem. No entanto, as condições do exercício da advocacia não são as mesmas, com as mulheres enfrentando uma realidade de prerrogativas violadas e de obstáculos no seu cotidiano profissional, segundo Daniela.

A coleção de casos vai da prisão de advogadas confundidas com suas clientes, assédios e ofensas à medição da altura da saia em tribunais. A violação de prerrogativas do advogado em distintas áreas se torna mais acentuada para a mulher, principalmente em alguns setores de trabalho, como na advocacia criminal, no acesso aos presídios e nas audiências de custódia.

Exemplo recente aconteceu no Presídio de Marambaia, em Belém (PA), no mês passado, com advogada que precisou entrar no estabelecimento para atender seu cliente. Ela foi submetida a revista íntima e não pôde realizar a entrevista com o cliente de forma reservada, em flagrante violação de suas prerrogativas.

Assim como mulheres de diferentes profissões no Brasil, as advogadas também sofrem a discriminação salarial no mercado de trabalho. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mesmo contanto com um nível educacional mais alto, as mulheres ganham, em média, 76,5% do rendimento dos homens.

A representação política também não reflete a realidade da população brasileira. Embora as mulheres representem 51,5% da população, ocupam apenas 15% da Câmara dos Deputados e 13,5% do Senado. Um universo ainda mais reduzido se considerar o gênero e raça. Do total de 513 deputados, 77 são mulheres e apenas 13 negras e pardas. No Senado, apenas uma senadora se declarou parda, dentre as 11 atualmente no exercício do mandato. “A igualdade que defendemos não pode ser pensada nem exercida parcialmente. É para todos os contextos. É entre todos e todas ou não é”, enfatizou Daniela.

O estímulo à participação da mulher na política e nos espaços de tomada de decisão é um dos pilares da atuação na CNMA. “Essa presença não é apenas questão de direito e de representatividade. É fundamental para traduzir em leis o que afeta a vida das mulheres sob sua necessidade e vivência. Quem vive realidades próprias somos nós mulheres e ninguém melhor do que nós para avançar nisso”, afirmou a presidente da comissão.

No contexto de busca da igualdade, a política de cotas é uma necessidade. “A luta não é para que não sejamos diferentes, a nossa luta é para que essas diferenças não sirvam para justificar que alguns tenham menos direitos, menos oportunidades ou sofram violência”, disse. Ela ressaltou que a construção de uma sociedade mais igual só terá sucesso com a atuação conjunta de mulheres e homens.

Esse entendimento é compartilhado pela primeira presidente da CNMA e atual integrante do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Fernanda Marinela. “Se não houver diálogo com homens e mulheres, não haverá avanços. Esse assunto não pode ser ‘Clube da Luluzinha’. É um assunto de interesse geral”, afirmou Marinela.

Vice-Presidente da seccional da OAB no Ceará, estado de realização do 3º Encontro da Mulher Advogada, Vládia Feitosa afirma que o conhecimento é fator importante na defesa das prerrogativas. “Procuramos dar visibilidade e conhecimento para as colegas e para os demais atores do sistema de Justiça, para que, realmente, o respeito comece a acontecer. O que existe de prerrogativa é lei e tem de ser cumprida”, disse.

Em parceria com a Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia, a CNMA percorre o País promovendo reuniões, audiências, visitas, inspeções e palestras na Caravana das Prerrogativas. Editada pela Comissão, a Cartilha da Mulher Advogada é contribuição importante para o cumprimento dos diretos do exercício da advocacia sem restrições por distinção de gênero.

A mulher na OAB – A implementação de ações afirmativas tem resultado em mudanças relevantes na OAB. Quando a CNMA foi efetivada há sete anos, apenas quatro mulheres compunham o Conselho Federal. Hoje, são 39 conselheiras federais. Na próxima gestão será garantida a participação de ao menos uma mulher nos cinco cargos de direção do Conselho Federal.

A OAB tem implantado outras importantes ações na defesa da mulher. No ano passado, por exemplo, aprovou súmula que estabelece a prática de violência contra a mulher como motivo para a negativa de inscrição do advogado na Ordem. E pela primeira vez, a OAB indicou duas mulheres para as duas vagas destinadas à advocacia no CNMP – as advogadas Fernanda Marinela e Sandra Krieger, que assumiram as cadeiras em 2019.

A participação também cresceu nos eventos. Fato inédito na história da OAB, as mulheres participarão paritariamente dos debates da XXIV Conferência Nacional da Advocacia. Serão 120 palestrantes mulheres e 120 palestrantes homens no maior evento da advocacia brasileira a ser realizada em novembro, em Brasília.

Ainda nesse sentido, desde fevereiro último, está em vigor a decisão do Conselho Federal que garante às mulheres a participação como palestrantes em todos os eventos da OAB em, pelo menos, 30%. “Podemos ainda não ter chegado onde queremos, mas é inegável que estejamos fazendo o nosso dever de casa. Temos uma diretoria comprometida com a causa feminina”, afirmou Daniela Borges.

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Guia orienta a advogada de seus direitos

Guia de bolso prático para consultas, a Cartilha de Prerrogativas da Mulher Advogada é um orientador na resolução de conflitos, de combate a violações e de fortalecimento da advocacia. Disponível no site da OAB Nacional, o guia contém os direitos garantidos a todas as advogadas e as prerrogativas da advocacia.

“É muito comum que a violação das prerrogativas também se traduza em violência de gênero quando a autoridade se vê diante de uma profissional. O trabalho de defesa das prerrogativas da mulher advogada é ao mesmo tempo um instrumento de valorização da advocacia e de enfrentamento da desigualdade de gênero no exercício profissional”, define a cartilha editada pela Comissão Nacional da Mulher Advogada.

A cartilha ressalta que assédio também é violência, discriminação ou preconceito de gênero, que não é admissível em nenhum contexto, além da advogada ter o direito de vestir o que quiser e à igualdade de remuneração.

Na maternidade, o Estatuto da Advocacia e da OAB garantem à advogada: preferência em sustentações orais e audiências; suspensão de prazos processuais por 30 dias, quando for a única patrona da causa; isenção total ou parcial da anuidade no ano do parto ou adoção; entrada permitida em tribunais sem passar por aparelhos de Raio-X; vaga especial de estacionamento e direito à creche.

“A igualdade que se pretende ver efetivada entre homens e mulheres não é formal, mas material. É preciso garantir que as diferenças não legitimem desigualdades, mas ensejem políticas públicas para garantir a igualdade efetiva no gozo dos direitos e no exercício da advocacia”, afirma a cartilha.

A advogada que tenha sua prerrogativa violada pode procurar a Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia ou a Comissão de Prerrogativas da própria seccional. Se a violação ocorrer em processos judiciais, pode acionar a Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas do Conselho Federal ou de sua seccional.

A Cartilha da Mulher Advogada está disponível no endereço https://www.oab.org.br/publicacoes/AbrirPDF?LivroId=0000002837. Acesse também pelo QRCode