Edição

Onde os direitos humanos e as garantias constitucionais?

15 de julho de 2015

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É com tristeza e amargura que volto a escrever sobre uma matéria desenvolvida há dez anos, publicada na edição de dezembro de 2005, com o título “Que país é este?”, encabeçado com trechos de um poema do nosso condoreiro maior:

Auriverde pendão da minha terra

Que a brisa do Brasil beija e balança,

 Estandarte que a luz do sol encerra,

 E as promessas divinas da esperança…

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Senhor Deus dos desgraçados!

Dizei-me vós, senhor Deus

E é loucura… se é verdade

Tanto horror perante os céus…

Castro Alves

Ponderávamos então, rememorando os lamentosos sentimentos e a revolta do nosso condoreiro, ao produzir a terrificante tragédia do navio negreiro, produzindo contrastes espetaculares com as estrofes acima para chegar ao horror da descrição do que ocorria no convés e porão da malfadada nau que trazia da África os infelizes e desgraçados escravos.

A realidade do sistema prisional aplicado hoje aos condenados que cumprem penas nas superlotadas prisões que abrigam mais de 600.000 prisioneiros, cuja lotação gira em cerca de 400.000 (segundo estatísticas), pouco difere do tratamento desumano aplicado nos cárceres brasileiros, ao arrepio das garantias dos direitos humanos como assegurados na Constituição Federal.

Considerando que a responsabilidade legal e jurídica dos apenados é de Poder Judicial, exercido pelos Juízes das execuções penais, torna-se urgente a tomada de providências jurídicas e administrativas por parte do Poder Judiciário, a fim de pôr cobro às ilegalidades que ocorrem em desacordo com as disposições constitucionais que garantem a dignidade da pessoa humana, imune de tratamento desumano e degradante como assegurado aos presos no tocante ao respeito à integridade física e moral, que, de forma imperativa, em face dessa infeliz circunstância não cumprida, deixa implicitamente sob a responsabilidade do Poder Judiciário essa transgressão constitucional.

A judicialização com que magistrados e tribunais têm decidido na aplicação de penas, transferindo-as para cumprimento domiciliar, seja a razão e justificativa qual for, como tem acontecido com os crimes do mensalão, Lava-Jato e outras roubalheiras de milhões, apesar de causar perplexidade na sociedade, está a mostrar um caminho e uma situação que poderá trazer uma forma e lenitivo para diminuir a absurda e inconcebível lotação carcerária.

As prisões – como se sabe e ainda bem – têm em sua maioria apenados por crimes de pouca ou média periculosidade, aos quais devidamente apreciados poderiam ser concedidas as regalias da prisão domiciliar com garantia de compulsória aplicação de tornozeleiras a garantir esse singular cumprimento de pena.

Vários têm sido os exemplos de beneficiários da prisão domiciliar e outras, como a diminuição de dias das penas por assimilar cultura por meio de leituras, ou até como decidiu o Supremo Tribunal Federal, com proposta do ministro Luís Roberto Barroso, da remoção diária da pena como indenização pelo sofrimento de condições degradantes da prisão.

O ministro citou a Itália como exemplo de país que adotou soluções alternativas para o problema da superlotação carcerária. Lá, segundo Roberto Barroso, foi implantada uma solução sistêmica que previu a adoção de medidas cautelares alternativas diversas da prisão, a prisão domiciliar para crimes de menor potencial ofensivo e a monitoração eletrônica (como aliás vimos aplicando ainda em pequena escala no Brasil).

As medidas que vêm sendo tomadas isoladamente ou em forma de recomendação pelo Conselho Nacional de Justiça têm trazido bons resultados, inclusive do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, com incentivo do Presidente Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, na formação de mutirões com a participação do Ministério Publico, Defensoria Publica e inclusive da Ordem dos Advogados do Brasil.

A questão carcerária no País é grave sob todos os aspectos, tanto pela omissão e culpa dos governos federal e estaduais, como pela falta de estabelecimentos penais que não atendem à demanda acentuada pela morosidade dos processos criminais, que atravancam as cadeias e delegacias de polícia com a quantidade de presos aguardando julgamento.

Diante do que ocorre, a gravidade maior é o desprezo às determinações constitucionais que concedem e afirmam as garantias humanas dos encarcerados que se veem desassistidos e injuriados nos seus direitos.

A esperança na reabilitação do quadro clamoroso existente nos cárceres desse Brasil afora, sem outra forma e possibilidade legislativa prática, para solução da melancólica e dramática miséria como vivem e são tratados os presos em celas infectadas e abarrotadas de humanos, reside exclusivamente no Poder Judiciário se dispuser a judicializar as condenações de pequena monta.

Se isso ocorrer, fatalmente teremos de voltar dentro de mais dez anos, com o mesmo assunto, repetindo novamente os pungentes versos de Castro Alves.