Parceria contra a desinformação

1 de junho de 2022

Compartilhe:

Capitaneado pelo Supremo Tribunal Federal, programa reúne universidades e entidades da sociedade civil para enfrentar as fake news

Enfrentar as práticas que afetam a confiança das pessoas no Supremo Tribunal Federal (STF), distorcem ou alteram o significado das decisões da Corte e, desta forma, colocam em risco os direitos fundamentais dos brasileiros e a estabilidade democrática do País. É o objetivo principal do Programa de Combate à Desinformação (PCD), lançado em maio, com uma jornada de dois dias de debates que reuniu o grande grupo de parceiros da iniciativa do Supremo – que inclui o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e 37 entidades da sociedade civil, dentre as quais o Instituto Justiça & Cidadania.

“São iniciativas muito importantes para a democracia nesse momento de fortalecimento das instituições e do próprio regime democrático. Uma ampla ação de aproximação com a sociedade e uma estratégia contra as informações falsas. (…) A sociedade precisa estar unida para o fortalecimento do STF e das instituições que garantem os direitos individuais neste País. Não será possível ao Supremo e a nenhuma outra instituição enfrentar esse problema da desinformação sem o apoio da sociedade civil, das entidades, das associações de classe, das universidades e do setor privado”, pontuou o Presidente do Supremo e do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Luiz Fux, no lançamento do Programa.

O ministro fez questão de observar que o fenômeno das fake news é mundial, atinge sobretudo as instituições dedicadas a estabelecer a verdade – que no regime democrático são a Justiça, a imprensa livre e as universidades – mas que no Brasil teria se voltado “com mais ênfase” contra o STF e o TSE, por razões eleitorais. Fux lembrou que o Supremo está em vigília contra esses movimentos desde 2019, na gestão do Ministro Dias Toffoli, que para enfrentar a desinformação e os ataques ao STF instaurou o inquérito (das fake news) que é relatado pelo Ministro Alexandre de Moraes, “com extrema seriedade e competência”. O PCD, segundo ele, teria sido criado de forma complementar a esse trabalho judicial.

“Para que se tenha noção de como esse trabalho do inquérito foi importante, vieram a lume notícias de atos preparatórios de terrorismo contra o STF. Daí a necessidade de ter sido um processo sigiloso”, afirmou o Ministro Fux, confirmado pelo Ministro Alexandre de Moraes, que também participou do lançamento do PCD, na condição de Vice-Presidente do TSE.

Parceiros – “Bem age Vossa Excelência, Ministro Luiz Fux, pela meritória iniciativa nesses tempos espinhosos marcados por ameaças insistentes que se interligam e se guarnecem. Tempos em que se descobre política e economicamente rentável contraditar irresponsavelmente a ciência e a realidade, erodir os consensos, promover a hostilidade e a cultura anticívica a partir de ideias distorcidas que pretendem, na estratégia mais ampla, fixar como reais narrativas inventadas”, saudou no lançamento do PCD o Presidente do TSE, Ministro Edson Fachin.

Dentre as demais parcerias estão entidades de classe como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) e a Associação dos Notário e Registradores do Brasil (Anoreg). Dentre as universidades, de todas as regiões do Brasil, destacam-se a Universidade de São Paulo (USP) e as federais do Ceará (UFC), Espírito Santo (UFES), Mato Grosso (UFMT) e Roraima (UFRR). Fazem parte ainda do PCD redes de combate à desinformação, agências de checagem e cursos virtuais sobre o assunto.

Estratégia – O Programa se apoia no tripé de ações “explicar, traduzir e humanizar”, em harmonia com o sistema de proteção das liberdades previsto na Constituição Federal e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Diplomas que determinam que toda pessoa possui o direito a informações de toda natureza, mas ressalva a necessidade de coibir a apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

Dentre as ações de comunicação previstas está a chamada “alfabetização midiática”, com a capacitação de servidores, funcionários terceirizados, jornalistas e influenciadores digitais para a identificação de práticas de desinformação e discursos de ódio e as formas de atuação para combatê-las. A contestação das informações falsas e boatos será feita por meio da publicação de notícias na página denominada #VerdadesdoSTF. Serão produzidos ainda materiais para públicos diversos, com a finalidade de disseminar informações verdadeiras e conteúdos que gerem engajamentos positivos sobre o Tribunal.

Resistência e educação – Nos painéis de debates, os parceiros do PCD defenderam a resistência e a educação midiática como as principais ferramentas de combate às notícias falsas. “Vivemos tempos sombrios, de contínuos ataques à democracia, mas, também, tempos de resistência. O convênio que firmamos com o Programa do STF é representativo de uma resistência que reúne instituições democráticas, sociedade civil organizada e academia”, disse a Coordenadora da Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNCd Brasil), Ana Regina Rêgo.

Ela acrescentou que nas últimas semanas o STF tem ocupado o topo dos assuntos mais comentados de várias redes sociais, com hashtags que se referem à Corte de maneira extremamente negativa, com números de visualizações que ultrapassam cem milhões. “Nesse sentido, acreditamos que o Programa de Combate à Desinformação se faz urgente e necessário”, concluiu.

Em seguida, a Presidente-Executiva do Instituto Palavra Aberta, Patrícia Blanco, defendeu a importância da educação midiática como ferramenta eficiente de combate à desinformação e à exclusão social: “Hoje, o baixo letramento tanto do consumo da informação quanto da utilização correta das ferramentas digitais é um grande fator de exclusão social, econômica e de participação cívica. Nesse sentido, a educação midiática torna-se urgente e necessária como forma de melhorar o cidadão. A exclusão midiática faz com que muitas pessoas não consigam acessar informação de qualidade, fazer a checagem e verificar, por exemplo, a autenticidade de informações sobre as urnas eletrônicas. Nós queremos olhar a educação midiática e informacional como fator de inclusão social e democrática”.

Ethos e habitus – No painel sobre as contribuições das universidades – que reuniu especialistas de diversos campos de conhecimento, como Psicologia, Sociologia, Comunicação, Direito e Medicina Social, dentre outros – foram debatidas várias frentes de atuação a partir do meio acadêmico. Falou-se, por exemplo, na necessidade de ampliar a compreensão dos parceiros do Programa sobre a cultura das redes e sobre o porquê da informação falsa se disseminar com mais velocidade e eficácia do que a informação fidedigna.

“O ethos (conjunto de costumes e valores) e o habitus (conjunto de esquemas de percepção, apropriação e ação) estão em conflito. Precisamos de filósofos, sociólogos, antropólogos e psicólogos para entender o que está acontecendo”, comentou o professor de Jornalismo da UFES, Edgar Rebouças.

Planejou-se ainda a produção de material audiovisual e bibliográfico, com as devidas adaptações de linguagem, para possibilitar a melhor compreensão de todos os públicos a respeito do fenômeno das fake news, do papel do Poder Judiciário e das atribuições específicas do Supremo Tribunal Federal. Discutiu-se também o desenvolvimento de
softwares para identificar em tempo real o envio doloso de notícias falsas, além de instrumentos de checagem rápida de informações.

Dimensão jurídica – Segundo o professor titular de Direito do Estado na Faculdade de Direito da USP Floriano de Azevedo Marques Neto, na dimensão jurídica, o primeiro desafio será desenvolver conceitos e normas jurídicas para separar a difusão de desinformação da informação e do livre pensar. “Desinformação não é liberdade de pensamento, mas uma fraude à liberdade de formação da convicção”, disse. Segundo o professor, outro desafio nessa seara será desenvolver instrumentos legais para desincentivar a desinformação culposa e punir a dolosa. “São duas dimensões importantes. Aquele que reproduz de inopino, mas fazendo a propagação de desinformação de forma culposa, e aquele que engendra informação falsa para poder alterar o entendimento político, econômico e consumerista do destinatário”, explicou.

Saiba mais sobre o Programa de Combate à Desinformação e confira a lista de parceiros da iniciativa no Portal do STF: portal.stf.jus.br