Direito de resposta e sua plurifuncionalidade

5 de outubro de 2004

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No início a liberdade de imprensa buscava impor-se como expressão da liberdade individual de pensamento e opinião.

Hoje não é só necessário defender a liberdade de imprensa mas sobretudo a liberdade em face à imprensa.

Por isso, pode-se afirmar com inteira razão que o direito de resposta surge como um “contrapeso” da liberdade de imprensa e do poder desta mesma imprensa.

Os direitos de natureza libertária clássicos (liberdade de expressão, de reunião, de locomoção, etc.) eram essencialmente direitos à não interferência do Estado, visto porque designados “direitos negativos”, isto é, direitos de não interferência.

Na atualidade, o direito de resposta é um direito positivo e não se dirige contra o Estado. Trata-se de uma pretensão de fazer dirigida, a um determinado veículo de comunicação, seja em face de referências de fato, seja em virtude de ofensas a honra ou à reputação da pessoa mencionada na publicação, conforme o regime jurídico adotado.

No que concerne ao seu conteúdo, o direito de resposta consiste em obter ou exigir do órgão de comunicação ofensor (direito potestativo) a publicação ou difusão de um texto (resposta) em nome próprio. Não se trata, portanto, de um direito a retratação do autor do texto originário ou do próprio órgão de comunicação. A obrigação deste consiste exclusivamente em publicar o texto resposta que o interessado lhe tenha enviado.

Ele é assim um específico direito de expressão, ou seja, uma pretensão juridicamente protegida de fazer publicar uma contra-mensagem, uma contra-informação, uma contraversão.

Com essa objetividade o direito de resposta apresenta-se como um dos instrumentos relevantes no processo eleitoral. Ele contribui, efetivamente, para a democratização das oportunidades de acesso à mídia, e assegura nas mesmas condições de tempo, espaço e relevo nos órgãos de imprensa, a resposta do candidato, partido ou coligação, mencionado ou atingido conforme o modelo legislativo adotado.

No direito eleitoral vigente o direito de resposta está vinculado a duas finalidades: a defesa da honra do candidato, partido ou coligação e a proteção da informação verdadeira; (art. 58, da lei nº 9.504/97). Os conceitos de calúnia, difamação e injúria são normativos e coincidem com a tipificação dada pela legislação penal (Cód. Eleitoral, arts. 324, 325 e 326).

O segundo dos bens tutelados é a informação verdadeira ou seja, aquela sobre a qual haja notório consenso ou cuja veracidade possa ser demonstrada de forma cabal e direta sem necessidade de dilações probatórias.

O direito de resposta enquadra-se com garantia constitucional à luz do texto da atual Constituição da República, cuja extensão jurídica corresponda a proporcionalidade do agravo. (art. 5º, inciso V).

A concepção doutrinária prevalente fundamenta o direito de resposta como defesa dos direitos da personalidade. Todavia, segundo o bem ou valor presuntivamente tutelado por este direito, ele pode ter por fundamento a participação informativa, a garantia do pluralismo informativo, o dever de veracidade da informação, ou pode ainda, conforme pretendem outros, funcionar como uma sanção ou assegurar a indenização em espécie a quem seja vítima de ataques pela imprensa.

Contudo, hoje prevalece a plurifuncionalidade do direito de resposta diante da impossibilidade de encontrar-se um único fundamento para todas as suas múltiplas funções. Destas destacam-se três: a defesa dos direitos da personalidade, a promoção do contraditório e do pluralismo informativo.

Por isso se diz que o direito de resposta satisfaz dois objetivos: proporciona a todos aqueles atingidos por uma notícia ou comentário jornalístico, um meio jurídico capaz de defender a sua reputação, e de outra parte, permite a difusão de versões alternativas (contravenção) sobre o mesmo assunto.

O direito de resposta é inelutavelmente, um meio específico de proteção do direito à identidade pessoal (personalidade) face aos ataques dos meios de comunicação, mas também instrumento de acesso individual aos meios de comunicação social, um direito à igualdade de oportunidades de meios.

Hoje o âmbito desse direito é mais abrangente, incluindo não apenas a imprensa periódica, o rádio e a televisão, mais o audiovisual, este último com algumas especificações, e a Internet.

O direito de resposta traduz-se, também, num direito de acesso do seu titular aos órgãos de comunicação social. Através dele o respondente faz a sua pretensão de publicar a sua resposta no mesmo periódico em que foi noticiada a informação que lhe deu origem, ou vê-la divulgada na emissora.

Outro ponto relevante neste instituto, presente em todas as legislações que o regulam é o princípio da igualdade ou equivalência entre a resposta e a notícia respondida. Essa igualdade traduz-se na extensão da resposta, na sua inserção editorial e forma de apresentação no órgão de imprensa obrigado a publicá-la.

Esse princípio encontra-se também presente na legislação eleitoral visto  que “diferido o pedido à divulgação da resposta dar-se-á no mesmo veículo, local, página, tamanho, caracteres e outros elementos de realce usados na ofensa”. (art. 58, I, alínea “b”, da lei 9.504/97).

A idéia comum que a norteia é a de que a resposta deve receber o mesmo tratamento dado a notícia que a ensejou, seja quanto a forma, conteúdo e relevo empregados.

Em outras palavras, equivalência significa “igualdade de armas”, a fim de que a contravenção seja publicada em paridade de condições com o texto que a motivou.

A tutela do direito de resposta apresenta vários sistemas jurídicos consoante a natureza que se lhe reconheça.

O primeiro deles é o que permite o exercício direto sem mediação de uma autoridade administrativa ou judicial.

Porém, a solução geral seguida pela maioria das legislações é aquela que submete a tutela do direito de resposta em caso de recusa, à mediação de uma autoridade administrativa ou a decisão de uma autoridade judicial.

Daí segue-se a possibilidade de três opções legislativas: o recurso para uma autoridade administrativa comum; o recurso dirigido a uma autoridade administrativa independente; e o acesso direto a uma autoridade judiciária (monocrática ou colegiada).

O primeiro sistema vigorou na Europa continental durante muito tempo e a decisão administrativa não comportava tutela judicial em nenhuma hipótese.

A segunda opção vigorou na França até 1983 e existe na Itália desde 1990 em ambos os casos restrita aos canais de televisão.

A terceira modalidade é a mais aceita e aplicada pelas legislações em todo o mundo, na esteira da tradição francesa. O titular exige a inserção da resposta, se houver recusa, o interessado poderá requerer imediatamente a autoridade judiciária a inserção compulsória, em todos os casos mediante procedimento legal extremamente célere.

Existe também sistemas mistos, nos quais se conjugam as duas vias, como sucede em Portugal. Porém, também nesses casos, haverá sempre a possibilidade de recurso aos tribunais, como exigência do princípio do estado de direito que impede  que se exclua da apreciação do Poder Judiciário, qualquer lesão a direito individual.

No plano internacional, a sua relevância recrudesce à medida que os meios de comunicação de massa ultrapassam as fronteiras nacionais. A internacionalização da informação suscitou a internacionalização do direito de resposta.

De qualquer sorte, como dissemos anteriormente, o aperfeiçoamento do sistema democrático depende de mecanismos que garantam o equilíbrio e a racionalidade do debate público.

Nesse contexto, o direito de resposta, em todas as suas modalidades, sobretudo no direito eleitoral, constitui instrumento fundamental na institucionalização desse desiderato.