Empoderamento feminino

7 de março de 2020

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Diálogos Brasil e União Europeia no Sistema de Justiça

A partir do inédito contexto histórico, entre 2017 a 2019, em que mulheres ocuparam simultaneamente cargos de liderança no Sistema de Justiça brasileiro, a desigualdade de gênero nos espaços de poder foi amplamente evidenciada, aguçando os debates sobre equidade nessa seara. Com uma mulher pela primeira vez à frente da Procuradoria-Geral da República e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Raquel Elias Ferreira Dodge, o Ministério Público desenvolveu, exatamente nesse biênio, uma vigorosa política de afirmação de Direitos Humanos, focada especialmente em questões ambientais, de cidadania e na equidade de gênero e raça.

Além da criação da Secretaria de Direitos Humanos e Defesa Coletiva do CNMP, que teve a autora deste texto, Ivana Farina Navarrete Pena, como titular até 2019, foi estabelecida pela ex-Presidente do CNMP, Raquel Dodge, importante interlocução para além das fronteiras nacionais, firmando-se termo de cooperação entre o CNMP e a Delegação da União Europeia (UE) para desenvolvimento do projeto “Diálogos Brasil – União Europeia: perspectivas de Equidade de Gênero no Sistema de Justiça, Ministério Público”.

Esses diálogos, articulados e inovadores, foram implementados nas Conferências Regionais das Promotoras e Procuradoras de Justiça, realizadas nas cinco regiões do País entre fevereiro e junho de 2019 (Manaus-AM, Salvador-BA, Goiânia-GO, São Paulo-SP e Bento Gonçalves-RS) e na missão técnica, realizada em fevereiro deste ano em Lisboa-Portugal, Roma-Itália e Bruxelas-Bélgica, sob os auspícios da UE. Nessas conferências, atuaram na Comissão Organizadora as duas autoras deste texto, em conjunto com várias outras integrantes do Ministério Público brasileiro.

A missão técnica, realizada nos três países da UE, contou com a participação: da Subprocuradora-Geral da República e ex-Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, que presidiu todas as Conferências; desta autora, Ivana Farina; da Procuradora da República e ex-Secretária-Geral do CNMP, Cristina Nascimento de Melo; da Primeira Secretária da Delegação da União Europeia, Maria Rosa Sabbatelli; e da advogada e pesquisadora portuguesa Antônia Martin Barradas, que atuou como perita externa, contratada pela UE.

Nesse intercâmbio de informações, foi reconhecido o pleno êxito da iniciativa pela União Europeia e apresentada aos países visitados – em audiências com poderes, instituições e organizações da sociedade civil – a metodologia utilizada nas Conferências, enfatizando-se os objetivos de obtenção de um diagnóstico, subjetivo e qualitativo, da realidade de mulheres integrantes da carreira do Ministério Público, bem como as propostas de ações aprovadas em plenário, direcionadas à ruptura do quadro de desequilíbrio de gênero estabelecido.

A Agenda 2030 da Organizações da Nações Unidas (ONU) definiu, no objetivo sustentável nº 5, “alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”. Especificamente, no item 5.5, trouxe como objetivo “garantir a participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de oportunidades para a liderança em todos os níveis”. O CNMP e a UE uniram-se na construção de uma política internacional de equidade de gênero, cumprindo as metas da ONU, para reduzir a desigualdade entre homens e mulheres no Sistema de Justiça.

Essa política implementou-se com as transformadoras Conferências de gênero no Ministério Público brasileiro, cujo projeto pedagógico e a correspondente metodologia pautaram-se no padrão adotado na I Conferência Nacional das Procuradoras da República – Desafios e Horizontes da Carreira no MPF – idealizada pela então Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, e realizada em 2018, com a Escola Superior do Ministério Público da União, sob a direção de João Akira Omoto.

Nesse parâmetro, foram desenhadas e desenvolvidas as cinco Conferências Regionais de Promotoras e Procuradoras de Justiça, que refletiram sobre as medidas necessárias para valorizar a presença feminina na Instituição e fortalecer as ações em favor dos interesses sociais, fazendo-o em seis oficinas de trabalho, divididas em eixos temáticos e centralizadas nos seguintes temas: “ingresso na carreira; condições de trabalho; permanência na carreira, políticas institucionais, cursos; movimentação na carreira; carreira e outras jornadas; e empoderamento e participação político-institucional”.

Nas Conferências esteve sempre presente a acolhida cuidadosa, realizada pelos Ministérios Públicos participantes e pela Comissão Organizadora, em detalhes inspiradores, como a homenagem a personagens femininas de cada região, com fotografias e a síntese de suas lutas históricas, que identificavam as salas das oficinas de trabalho.

Na programação, destaque para as palestras, para os depoimentos de mulheres que ocuparam cargos de liderança no Ministério Público e para a roda de conversa, momento que contava com convidadas do meio artístico e jornalístico, que permitiram diálogos e reflexões conjuntas em rica troca de experiências e relatos das dificuldades vivenciadas nas carreiras. Em especial, esses encontros sensibilizaram mulheres, que partilharam depoimentos de vida, questionamentos sobre posturas, situações enfrentadas e discriminações sofridas.

Concluídas as cinco Conferências, foram editados e publicados memoriais dos conclaves, contendo as propostas de ações para transformação da realidade, que foram votadas e aprovadas em reunião plenária pelas participantes. Conforme estabelecido no projeto, foi pela perita externa contratada pela União Europeia produzido relatório final, com o registro das informações mais relevantes e conclusões independentes, concebidas a partir da análise quantitativa e qualitativa das atividades desenvolvidas pelas conferencistas e suas percepções.

O objetivo central da missão técnica, que encerrou o projeto em países da UE, foi propagar os resultados obtidos e a metodologia, de forma a conferir sustentabilidade à iniciativa e multiplicar eventos congêneres, que utilizem o mesmo paradigma, com foco na equidade de gênero. O projeto de cooperação realizado entre o CNMP e a União Europeia abriu portas para o empoderamento feminino no Sistema de Justiça, por seus efeitos e reflexos no Brasil e nos países em que a experiência foi apresentada.

O aprendizado adquirido nesses diálogos é imensurável, em processos de conscientização e em projeções transformadoras, representando uma política exitosa de cooperação internacional, que conferiu visibilidade à política por equidade de gênero, destacando-a como uma bandeira a ser hasteada no Brasil e no mundo. 

Referências Bibliográficas_______________________________

Conferência Regional de Promotoras e Procuradoras de Justiça, 2019. Memorial […] Brasília, DF: CNMP, 2019. Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/images/ Publicacoes/ documentos/2019/1_CONFERENCIA_WEB.pdf. Acesso em 20/02/2020.

Organização das Nações Unidas. Objetivo nº 5. Igualdade de gênero. Agenda 2030. Disponível em: http://www.agenda2030.com.br/ods/5. Acesso em 20/02/2020.