O grande coração nazareno, de Pernambuco para o Brasil

9 de abril de 2014

Compartilhe:

Eliane RodriguesTudo começou debaixo de uma árvore na Zona da Mata de Pernambuco, por incrível que pareça. Enquanto os homens de Nazaré da Mata se reuniam para tratar de assuntos locais em uma sala do Sindicato Rural nas cercanias da cidade, as mulheres ficavam a 100 metros, isoladas sob uma árvore, aguardando pacientemente maridos, namorados e parentes terminarem a reunião. Elas conversavam, então, sobre assuntos domésticos. Nada mais.

Sempre foi assim. Mulheres de um lado, homens do outro. Até 1988, quando Eliane Rodrigues, então com 29 anos de idade, cansada de ver o isolamento a que ficavam relegadas dezenas de mulheres, sem direito a voz e, pior, sem vez na comunidade local, teve uma ideia. E junto com ela, coragem, força de vontade e ousadia para colocá-la em prática num ambiente machista, na comunidade de Nazaré da Mata e, ao realizá-la, iniciar uma luta sem tréguas em favor dos direitos das mulheres.

Nem todo mundo, na época, entendeu a proposta pioneira de Eliane. Ainda falava-se pouco em direito das mulheres, igualdade de gênero e outras tantas questões de importância fundamental para que as mulheres exerçam um direito fundamental: simplesmente serem mais felizes.

Eliane não se importou com os comentários e as dificuldades. Resolveu vencê-los, a todo custo, munida de um sorriso cativante e de uma rara vocação para o diálogo.

Vinte e seis anos depois, a Associação das Mulheres de Nazaré da Mata, a Amunam, não é apenas motivo de orgulho para Eliane Rodrigues que, por causa de sua atuação, chegou a ocupar, durante dois anos, a Diretoria Geral de Enfrentamento à Violência de Gênero da Secre­taria da Mulher de Pernambuco.

A Associação é a maior de suas realizações. É onde ela, junto com dezenas de outras mulheres, exerce seu direito de ser feliz pelo que faz e, com elas – não importa a idade que possam ter, de 5 a 85 anos –, realiza um dos mais relevantes trabalhos sociais e de cidadania para mulheres do País.

O pioneirismo se revelou, ainda, quando Eliane Rodrigues observou que seria importante preparar as mulhe­­res integradas ao trabalho da Associação para entender a importância de exercer seu direito de ocupar espaços de poder, mostrando ainda que a busca pela igual­dade de gênero não é um sonho distante e impossível. Na verdade, desde aquela época, ela já colocava em prática o que a Organização das Nações Unidas está, hoje mais do que nunca, clamando, de forma veemente e contínua aos governos de todo o mundo: a criação de políticas públicas em favor da igualdade de gênero de forma a possibilitar às mulheres a ocupação de espaços de poder; uma questão essencial no Brasil de hoje, defendida de forma contundente pela ex-ministra e ex-presidente do CNJ Eliana Calmon, membro do Conselho Editorial desta revista, em artigo publicado na edição 161 (www.editorajc.com.br\revista 161).

Eliane Rodrigues usa projetos diversos para fazer com que as mulheres de sua região e também de toda a Zona da Mata pernambucana possam vislumbrar o futuro como cidadãs respeitadas. Instalada em um antigo casarão cor de rosa no centro de Nazaré da Mata, a Associação já atendeu a mais de 20 mil mulheres.

A maioria chega calada, cabeça baixa, desestimulada, sofrida, com quase nada de autoestima, com histórias variadas e até chocantes de abandono e violência e com desconhecimento total de seus mínimos direitos.

Em pouco tempo elas começam a se integrar, expandir suas vidas, emitir opiniões e se sentir mais seguras de si mesmas e de suas potencialidades. Aprendem e se reúnem para a prática de atividades lúdicas, como leitura, artes marciais, confecção de roupas e bordados, dança, música, informática, trabalhos manuais, conservação e manutenção do meio-ambiente, resgate de suas próprias tradições culturais, entre outros.

Orientadas por psicólogos e educadores recebem, diariamente, aulas sobre assuntos de seu interesse direto: criação de filhos, relacionamento familiar, direitos domésticos, direitos e cidadania, enfrentamento à violência doméstica, maternidade, igualdade legal, política, história, comportamento social, formação sexual.

Projetos como o “Dando a Volta por Cima”, para meninas e jovens de baixa renda, e o “Exercitando a Cidadania” – com visitas semanais à Câmara de Vereadores para monitorar suas ações e depois gerar reflexão sobre as propostas de leis –, para mulheres adultas, fazem grande sucesso e abrangem mais de 150 mulheres.

O mesmo acontece com a criação e a manutenção da programação da Rádio Comunitária Alternativa FM, já com mais de 30 mil ouvintes na região, e projetos como o “Ponto de Cultura Engenho dos Maracatus” e a “Estação Digital Aprendendo a Fazer”, onde temas e questões como tecnologia social, gênero de raça, etnia, políticas públicas para mulheres, feminismo, direitos humanos, práticas esportivas para mulheres, cultura popular e enfrentamento à violência são amplamente estudados e debatidos. Há, ainda, sob a liderança da Associação e também mantidos por ela, projetos relacionados ao maracatu, como o já tradicional “Maracatu Coração Nazareno”, o único em toda a região só para mulheres.

Nascida na própria Zona da Mata pernambucana, Eliane perdeu o pai aos 7 anos e, para ajudar a mãe, começou a trabalhar aos 16 anos no Sindicato dos Trabalhadores Rurais da cidade.

Um dia, viu a cena que transformou a sua vida e a vida de milhares de mulheres. Sem dúvida, a cena de sua vida. A cena que a incomodou tanto e que, ao mesmo tempo, a motivou e a impulsionou a fazer o que faz criando a Associação das Mulheres de Nazaré da Mata, hoje um dos mais bem-sucedidos projetos de trabalho social de Pernambuco e do país, dedicado totalmente às mulheres, atuando na promoção e na defesa de seus direitos, com atuação em 40 municípios do Estado. “Os homens estavam numa reunião fechada, e as mulheres embaixo de uma árvore, esperando por eles, sozinhas, isoladas. Fui até elas e passei a ouvir suas queixas. Simplesmente isso. Aos poucos, as conversas ganharam mais força. Depois mais adesões e mais gente. Assim, tudo começou”, diz Eliane.

No mês internacional das mulheres, a Revista Justiça & Cidadania ouviu Eliane Rodrigues com exclusividade. Leia a seguir a íntegra da entrevista:

Justiça & Cidadania – Como tudo começou e o que a motivou?
Eliane Rodrigues – Essa história começou há mais de 30 anos, quando eu era funcionária do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nazaré da Mata, Tracunhaém e Buenos Aires. Nessa época, os Sindicatos Rurais iam muito para as comunidades fazer reuniões com os trabalhadores, para que eles conhecessem e reivindicassem os seus direi­tos, garantidos na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) mas constantemente violados. Porém, os associados eram os homens, então as mulheres não participavam das reuniões, a não ser na condição de meras ouvintes.

Eu sempre acompanhava a Diretoria para fazer as anotações das reuniões, mas acabava ficando com as mulheres embaixo de alguma árvore. As conversas eram diversas: saúde, educação, política, gravidez precoce das filhas, criação forçada de netos e netas – pois as filhas (mães solteiras) iam trabalhar de empregada doméstica em Recife e seus filhos e filhas sempre ficavam sob os cuidados da avó –, violência doméstica, alcoolismo do companheiro, mas também tinham os momentos das brincadeiras, enfim, era um momento de conhecimento, informação e lazer.

Foi a partir daí que começamos a amadurecer nossas ideias, inclusive para que as mulheres se associassem ao sindicato e começassem a ocupar cargos em sua diretoria. Essa postura não era vista com “bons olhos” pelos diretores, até porque as mulheres começaram a falar nas reuniões e a reivindicar. Como não éramos atendidas, resolvemos fundar a Associação.

No início, a chamamos de Associação das Mulheres Rurais de Nazaré da Mata, Tracunhaém e Buenos Aires, de forma a podermos funcionar no espaço do Sindicato, mas, com o tempo, fomos ficando conhecidas e construímos algumas pequenas parcerias.

Em 1990 fui demitida e com o dinheiro do seguro-desemprego aluguei uma casa e corri atrás de novos apoiadores. Em 1996, conseguimos, por meio de uma parceria com uma instituição italiana – que nos apoiou e contribuiu com 50% do valor –, comprar uma casa com pouco mais de 230m2 de área construída. Hoje, a casa serve como sede da Associação e foi ampliada para mais de 900m2. Tudo feito com muita dedicação de nossa equipe e com o apoio de parcerias diversas: doação de horas de trabalho e de materiais, cessão de mão de obra da Prefeitura Municipal e doações financeiras, estas em menor volume.

JC – Quantas mulheres a Associação atendeu até hoje?
ER – Precisar este número é difícil, afinal são 26 anos de trabalho ininterrupto. Como nossa atuação não se restringe apenas à Nazaré da Mata, mas a todo o Estado de Pernambuco – hoje são 40 municípios em que já desenvolvemos alguma ação e deixamos nossa marca –,  e considerando que temos vários projetos sendo executados com as mulheres e seus familiares, para faixas etárias dos 5 aos 85 anos – muitos premiados por instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais –, estimamos em cerca de 20 mil mulheres.

JC – Quais os principais problemas das mulheres combatidos em seus projetos?
ER – Problemas das mulheres? O grande problema não é das mulheres, mas do contexto em que vivemos; a exemplo da violência doméstica, que é um problema que a mulher precisa enfrentar, mas o governo, o Judiciário e os políticos precisam fazer sua parte e adotar posturas condizentes para que seja punida com rigor. Infelizmente, poucos são os gestores públicos que direcionam recursos para políticas voltadas para as mulheres. Para se ter uma ideia, ainda temos juízes que priorizam qualquer outra audiência em detrimento da aplicação da Lei Maria da Penha e do despacho de uma medida protetiva para uma mulher em risco de morte, por exemplo. A morosidade da justiça gera a impunidade.

Outro ponto são os partidos políticos… poucos levam a discussão de gênero para seus espaços, além de as mulheres só serem vistas de última hora para cumprirem a exigência da lei eleitoral, que são as cotas. Por outro lado, não existe apoio nem incentivo para as candidaturas femininas. Infelizmente, os políticos só enxergam as mulheres em ano eleitoral em vez de discutirem políticas e leis que preservem suas vidas. Sem contar que a violência doméstica não tem idade, cor, raça e nem classe social. Portanto, o problema não é nosso, é do País e deve ser discutido diretamente com as mulheres.

JC – Quais os principais projetos da Associação em andamento?
ER – Projeto Dando a Volta por Cima: atende diariamente a 60 crianças e adolescentes, de 8 a 17 anos, em situação de risco e/ou vulnerabilidade social. Trata-se de uma ação complementar à escola, com oficinas de informática, futebol de salão, danças culturais (coco de roda, ciranda, frevo e caboclinho), karatê (nos últimos três anos, 6 finalistas no Campeonato Pernambucano), oficina de artesanato em material reciclável, telinha na comunidade (vídeos levados para as comunidades sobre as temáticas saúde; sexualidade; cidadania, com foco no estatuto da criança e do adolescente; meio ambiente) e leitura na praça. Também temos ações voltadas para as mães.

Projeto Exercitando a Cidadania: voltado para mulheres acima de 18 anos, conta atualmente com 40 participantes. Nesse projeto é oferecida capacitação em políticas públicas para que as mulheres possam participar dos espaços de discussão e decisão dessas políticas. Participamos das reuniões da Câmara de Vereadores a fim de acompanhar os projetos que estão em pauta e, se for o caso, fazer a mobilização popular.

Ponto de Cultura: neste projeto congregamos 5 grupos culturais: nosso maracatu feminino de baque solto “Coração Nazareno” (único no mundo) – que completou 10 anos no último dia 8 de março e tem 70 mulheres participantes – e mais 3 maracatus masculinos “Leão Misterioso”, “Leão Cultural” e “Águia Dourada” (com cerca de 40 participantes mulheres), além do grupo cultural “Flores do Coco”, que tem 20 mulheres.

Telecentro: onde oferecemos oficinas de informática para a comunidade.

Ponto da Leitura: nossa biblioteca, de livre acesso da comunidade, tem um acervo de mais de 2.000 exemplares, entre livros, cds, vídeos, revistas, etc.. Até porque nosso acervo é diferenciado, com as temáticas transversais.

Comunicação Social: envolve o informativo Mulher Cidadã, o site, o blog (acessado por mais de 50 países), as redes sociais.

Rádio Comunitária Alternativa FM: completou 11 anos no dia 8 de março. Esta rádio detém a maior audiência do município, com cerca de 15.000 ouvintes. Na grade de programação não tocamos músicas de duplo sentido, bem como as que maculem a imagem da mulher, as incentivem à prostituição ou que levem à qualquer forma de discriminação. Os programas sociais: Espaço da Mulher e Visão Cidadã são apresentados por mim e a equipe de trabalho é composta por jovens oriundos dos nossos projetos. Entendemos que os jovens precisam de oportunidades, precisam fazer notícias e não ser notícias. Também oportunizamos a participação de outros grupos e atores sociais durante a programação. Igreja católica, Igreja evangélica, liga desportiva e produtores culturais participam diretamente da programação com seus programas independentes.

Estes são os projetos permanentes, porém existem outros pontuais, executados a partir da concretização das parcerias com o Governo do Estado por meio de licitações, e com o Governo Federal.

JC – Os resultados têm sido significativos em termos de cidadania, igualdade de gênero, participação em espaços políticos, informação sobre sexualidade, reivindicação e maior compreensão de seus direitos?
ER – Sim, as mulheres mudaram, conquistaram espaços, transformaram suas vidas. As mulheres agora já falam sem medo, expressam seus desejos e sentimentos, reivindicam direitos. Nazaré da Mata, hoje, tem duas vereadoras e os vereadores nos escutam. No segundo semestre de 2013, conseguimos aprovar na Câmara de Vereadores a Lei Anti-Baixaria, que proíbe os artistas e grupos musicais contratados com recursos públicos de cantarem e tocarem músicas de duplo sentido ou que exponha a mulher. Se o fizerem, serão advertidos e, na reincidência, serão multados e a multa revertida a favor de políticas públicas para as mulheres.

As mulheres estão presentes nos conselhos municipais, conhecem a Lei Maria da Penha e buscam ajuda nos casos de violência doméstica. Não temem procurar a Delegacia para promover uma denúncia de agressão.

Hoje, as mulheres têm a consciência de que ser feliz é um direito.

JC Não houve e não há conflitos de interesses entre as mulheres atendidas pela Associação e os homens da região? Como consegue contornar este tipo de problema quando ele se manifesta?
ER – Não chamo isso de conflito de interesses, mas de difamação. No início, éramos rotuladas e difamadas mesmo. Porém, em 1994, nossa estratégia foi abrir as portas para eles. Começamos oferecendo vagas no curso de cabeleireiro, depois oferecemos cursos de encanador e eletricista, convidamos para serem voluntários e abrimos vagas para contratação como funcionários. Hoje, temos 10 voluntários e 4 funcionários. As ferramentas de comunicação e a rádio têm contribuído bastante para a mudança de mentalidade. Vestir roupa rosa ou lilás já não é problema para muitos homens em Nazaré da Mata. A estratégia é trazê-los para conhecer o trabalho e, se for o caso, inseri-los em alguma atividade para que eles entendam que nós, mulheres, nascemos para ser amadas e respeitadas.

JC – A senhora tem recebido apoios significativos, como verbas, apoios financeiros e patrocínios, para a continuidade de seu trabalho e da Associação?
ER – Para manter um trabalho social é preciso muita coragem, compromisso, comprometimento e determinação. Prestamos serviços ao Governo do Estado e ao Governo Federal para poder manter nosso trabalho social. Caso contrário, já teríamos fechado, igual a tantas outras instituições que não conseguiram dar continuidade.

Com o Governo do Estado, nossa parceria é de prestação de serviço em outras cidades ou regiões, o que depende de licitação. Concorremos também a editais de projetos e prêmios, sem fugir de nossa missão. Nada muito significativo, nem com garantias.

Da Prefeitura recebemos parte da merenda para o projeto Dando a Volta por Cima e a cessão de alguns funcionários. Quanto aos comércios local e regional, fazemos parcerias para manutenção da rádio, através de apoio cultural, e para algumas atividades extras, a exemplo das comemorações do mês da mulher, em março. Temos também algumas empresas que doam seus produtos para o uso do dia-a-dia: café, leite, bolacha, biscoito, macarrão e produtos de limpeza; e os voluntários nos doam horas técnicas de trabalho. Porém, ainda passamos dificuldades para manter todos os projetos e uma equipe permanente.

É importante entendermos que, hoje, as grandes empresas, artistas e atletas – que poderiam contribuir para as despesas de infraestrutura e execução de projetos de instituições como a nossa – preferem abrir as suas próprias fundações ou institutos, em vez de fortalecer e incentivar as já existentes.

O poder público também não tem incentivo direto para as instituições sem fins lucrativos, especialmente as que estão na base da pirâmide. Editais são abertos porque se faz necessário ter pessoas muito bem capacitadas para acompanhar e elaborar as propostas no sistema, o que não é nada fácil. Quando habilitado a alegria é geral, quando não, vem a tristeza e a frustração. Porém, nada que nos desanime. Tropeçar, levantar a cabeça e dar a volta por cima é o nosso lema.

Outro ponto é que tudo é muito mais difícil para quem está no interior, até as operadoras de telefonia e de internet são precárias.

Temos muitas instituições sérias e idôneas que realizam excelentes trabalhos, mas que ainda não são vistas, reconhecidas e nem incentivadas. Para nós, que fazemos o social no Brasil, a moeda é o amor, o sonho e o desejo de mudanças por uma sociedade mais justa e igualitária.

No tocante aos investimentos da cooperação interna­cional, estes ainda existem no Brasil, mas estão restritos às capitais e regiões metropolitanas. Infelizmente, falta o entendimento de que as cidades do interior têm os mesmos problemas sociais das grandes cidades: drogas, prostituição, abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, jovens em conflito com a lei, violência doméstica, falta de moradia, contaminação por vírus do HIV, saúde que não funciona, educação precária, enfim, políticas públicas condizentes com tantos impostos que o trabalhador assalariado paga e não tem retribuição.

JC – O que a senhora, baseada em sua larga experiência e história pessoal, poderia sugerir para diminuir as desigualdades num país onde a cada três minutos uma mulher é vítima de violência e onde as mulheres são a maioria do eleitorado, com 72 milhões de mulheres aptas para o voto?
ER – Infelizmente nós ainda vivemos uma cultura de mais de 500 anos, onde o sentimento de posse, de poder e o machismo continuam prevalecendo. Cada qual precisa fazer a sua parte, a mulher, a família ou a sociedade promovendo denúncia.

Os governos federal, estadual e principalmente o municipal, precisam investir nesta luta, especialmente o município, é nele que vivemos.

As delegacias precisam estar preparadas para receberem as mulheres, para que elas de vítimas não passem a ser rés. A Justiça precisa funcionar a contento. A morosidade e a impunidade acabam fazendo o caminho inverso, contribuindo, dessa forma, com o aumento da criminalidade.

A Lei Maria da Penha precisa ser aplicada na íntegra pelos governos, não basta criar os organismos de políticas para as mulheres, é preciso dotá-los com orçamento, e fazer os repasses fundo a fundo. Implantar os centros de referências da mulher, as casas-abrigo e oferecer capacitação profissional, para que elas tenham autonomia financeira e possam sair do ciclo da violência.

As políticas públicas precisam ser integradas. As relações de gênero e a Lei Maria da Penha devem perpassar todas as matérias escolares. É preciso se conscientizar que a violência doméstica é caso de saúde pública: sofrem a mulher, os filhos, a família, os vizinhos e o agressor. É preciso criar programas para trabalhar com os homens de forma preventiva.

Para os agressores, além da punição da lei, precisamos de programas educativos obrigatórios. Violência é violência, portanto é preciso acabar com a fiança e passar a punir mesmo. Enquanto as leis não forem aplicadas na íntegra e algumas outras não forem reformuladas para acabar com as brechas, iremos continuar assistindo – independente da faixa etária – noticiários de violência contra a mulher.

Sim, a maioria do eleitorado é feminina, porém, mesmo com o regime de cotas, a mulher ainda não disputa com igualdade com os homens. O maior exemplo é que enquanto eles têm dinheiro e só se dedicam à campanha, elas não têm dinheiro e ainda têm que cuidar dos filhos e da casa. A campanha acaba não sendo a prioridade.