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Libelo contra a corrupção e a violência

30 de junho de 2015

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“A questão não se resume ao deslocamento do foco da violência para a redução da maioridade penal, tema candente dentre aqueles a merecer decisões.”

Des. Luiz Felipe Ribeiro de Carvalho
Presidente do TJRJ

O acrimonioso e revoltado pronunciamento do jurista Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, constitui triste e vergonhoso libelo diante da execrável violência que se pratica diariamente contra a inflexível postura da legalidade imposta pelo Estado Democrático de Direito que vivenciamos.

A desmedida revolta descrita pelo responsável pela gerência e aplicação do direito posto e assegurado em lei no estado do Rio de Janeiro causa espanto e incredulidade, pela omissão que se pratica no País contra a tolerância e os privilégios concedidos aos criminosos responsáveis pelos estarrecedores fatos que vêm ocorrendo.

A violência que se pratica cotidianamente à luz do dia, contra o esmagamento da liberdade de ir e vir e até da própria vida – como denunciado explicitamente pelo digno e experimentado presidente do TJ/RJ –, representa, pela relevância dos fatos, inaudita desmoralização e desacato aos ditames da lei.

A fala do desembargador Luiz Fernando revive o ronco das multidões exigindo a volta da liberdade e da democracia, que ainda ecoa pelos brados e gritos das DIRETAS JÁ, do IMPEACHMENT do Collor, e pela volta das eleições.

O restabelecimento da democracia veio acompanhado pela ação dos pregoeiros do aumento da indiscriminada distribuição da assistência de bens sociais e esbanjamento das riquezas decorrentes de obras públicas faraônicas em cujas derramas criminosas os políticos do Mensalão, do Lava-Jato e de outras bandalheiras se envolveram e criminosamente participaram, como demonstrado nos inquéritos e prisões produzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público e decretadas pelo Supremo Tribunal Federal.

A lamentável omissão e o jogo de empurra denunciado pelo ínclito e digno magistrado contra políticos, apropriadamente designados como fariseus da democracia, apontando inclusive a inércia da sociedade que civilizada se quedou, de forma incompreensível, silente com o bradar do Basta!

A perversa realidade da continuidade dos atos criminosos de hoje faz reviver, com saudades, os atos dos indignados de 2013, as prisões decretadas pelo ministro Joaquim Barbosa, aplaudido e apoiado pela população que se postou revoltada contra os ladrões do Mensalão, no que foram seguidos de perto pelos políticos e empreiteiros das construtoras envolvidos com roubalheiras de bilhões de reais.

As reflexões e os exemplos consignados pela repulsa do revoltado presidente Luiz Fernando, trouxeram à luz a pungente e vibrante mensagem cívica da juíza criminal Yedda Christina Assunção, que, indignada com o estado das coisas, afirmou:

Chega de benefícios para sustentar que saiam tantos quanto entram. Chega de legitimar a bandidagem. Chega de demagogia. Há pessoas más no mundo, há pessoas boas. A nossa função é garantir que as primeiras não agridam as segundas. Garantindo a paz. Estamos falhando. Reiteradamente. A insegurança pública é nossa culpa. Admitamos.

O repto da juíza não ecoou no deserto, contando com a atenção e o revide do presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que se posicionou, não deixando de identificar a realidade que infelizmente transformou a sociedade em refém da corrupção, da violência e da impunidade, o que pretende combater com as armas que a instituição lhe dispõe, como exemplifica:

O Tribunal de Justiça está organizando um grande debate, com a participação de todos os interessados, autoridades e sociedade civil, o respeitável público cuja voz se impõe ouvir, para fazer cessar o festival de horrores.

O tratamento dos direitos humanos – exceto por demagogia – não serve apenas para proteger bandidos. É ocioso o mote: “a polícia prende, a justiça solta”, usado sem informação dos fatos ou da prosaica circunstância de, muitas vezes, a prisão ser ilegal e a soltura, imposição da lei.

Não pode ser esquecido o tema da corrupção, invisível por sua face vampiresca, que nos atinge desde 1500.

Os novos Códigos Penal e de Processo Penal só adiantarão com uma enérgica tomada de posição contra os esbirros da corrupção, escancarada em rumorosos processos.

Não se desconhecem os esforços das autoridades, mas a Justiça atua nos limites da legalidade, não sendo razoável tomar a parte pelo todo mesmo quando alguns exemplos isolados (passeio com o Porsche apreendido). Mas, insista-se, essa conduta é vergonhosa e rara.

Corrupção e violência são faces siamesas da barbárie que se banalizou. Impõe-se a coesão social, motivo por que a corrupção e a violência não podem continuar com o privilégio da impunidade. É imperiosa a reação dos segmentos sociais amplamente majoritários e do Estado, antes que se faça fila para os velórios de todos os dias e continue a se meter descaradamente a mão no bolso dos indefesos, em especial os aposentados e desempregados.

O desemprego crescente e a decrepitude dos serviços essenciais exigem uma resposta vigorosa. Pode-se começar pelo combate à condição de reféns da corrupção e das outras formas de violência.

O posicionamento divulgado das práticas já postas em ação administrativa pelo presidente Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, no âmbito do judiciário do Estado do Rio de Janeiro, com a enérgica e o afirmativo propósito de combater a violência, a corrupção e a impunidade com os instrumentos legais disponíveis, e, ao mesmo tempo, com a responsabilidade que lhe cabe, incentivando e motivando a sociedade civil a uma participação mais efetiva e real diante da grave responsabilidade que também lhe cabe.
Importante, lógico e preciso o chamamento cívico do chefe do Poder Judiciário sobre o momento desastroso que o Brasil atravessa. A sua prédica tem de ser aplicada e seguida.
Portanto, é hora e tempo de reagir!