O Caso Samarco e a potabilidade da água do Rio Doce

6 de maio de 2019

Compartilhe:

A Terra tem 71% da sua superfície coberta por água em estado líquido, sendo que 97% dela estão nos oceanos. Os 3% de água doce localizam-se nos rios, nas geleiras e águas subterrâneas, sendo que do total de água doce existente, 90% corresponde às geleiras, estando o restante em rios, lagos e lençóis subterrâneos.1

Estudos feitos pelas Nações Unidas advertem que, até 2025, aproximadamente 1,8 bilhão de pessoas viverão em áreas afetadas pela escassez de água, com dois terços da população mundial vivendo em regiões com problemas de água, como resultado do uso crescente, do crescimento populacional e das mudanças climáticas2.

O Brasil dispõe de 12% da água doce corrente do mundo: é mais que todo o continente europeu (7%) ou africano (10%). Temos a maior reserva de água doce e potável do mundo, que é o Sistema Aquífero Grande Amazônia (Saga)3, considerado atualmente o maior do mundo, posição antes ocupada pelo Aquífero Guarani4.

De fato, é necessária a proteção dos corpos hídricos, considerando que a água integra as preocupações do desenvolvimento sustentável, baseado nos princípios da função socioambiental da propriedade5, da prevenção, da precaução, do poluidor-pagador, do usuário-pagador e da integração, bem como do valor intrínseco à natureza. Para preservar as reservas naturais de água e garantir a qualidade da água em nosso País temos a Resolução Conama no 357/2005, que dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências.6

Para aferição da potabilidade da água no País tínhamos em 5 de novembro de 2015, data do rompimento da Barragem do Fundão, no Município de Mariana (MG), a Portaria no 2.914/2011 do Ministério da Saúde, revogada pela Portaria de Consolidação no 5/2017.

O Ministério Público Federal (MPF) e outros ajuizaram Ação Civil Pública (ACP no 0135334-09.2015.4.02.5005) em face da Samarco Mineração S.A. e outros, requerendo, em síntese, liminarmente a suspensão da captação da água, e no mérito a substituição dos parâmetros previstos na referida portaria, para a hipótese de nova captação no curso hídrico do Rio Doce em virtude do evento catastrófico que acometeu a região, bem como o reenquadramento deste mesmo corpo hídrico.

De fato, quando se recolhe a água bruta, fazendo sua análise, o objetivo é definir o que existe na composição a fim de ajustar os procedimentos de tratamento para atingir os parâmetros da citada Portaria. Logo, mesmo que ocorra alteração no tratamento da água com a mudança do coagulante (uso do tanino de acácia negra), o alto índice de turbidez requer adição de maior concentração de produtos químicos na água para alcançar os padrões de potabilidade da Portaria. Seria melhor que sulfato de alumínio utilizar novo coagulante no processo de tratamento (Tanfloc SG), que é bastante efetivo também no que diz respeito ao aspecto ambiental, pois é polímero de origem orgânica, extraído da casca de árvores europeias, não consumindo alcalinidade do meio onde atua, fazendo com que o pH da água para abastecimento fique praticamente inalterado.

É inegável que, atualmente, o padrão de potabilidade no Brasil, para todas as regiões, segue o disposto na mencionada Portaria, mas será que o padrão existente se presta a uma análise segura da potabilidade da água do Rio Doce após a sua poluição com a onda de rejeitos? A resposta virá com a finalização da perícia na referida ACP.

Referências:

MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes teóricas do novo Código Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002.

RIBEIRO, Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro. ROLIM, Neide Duarte Rolim. Planeta água de quem e para quem: uma análise da água doce como direito fundamental e sua valoração mercadológica. Revista Direito Ambiental e sociedade, v.7, n.1. 2017.

SCHIO, Regiane. Aquífero Guarani: a maior reserva de água doce do mundo. Disponível em: http://ambientes.ambientebrasil.com.br/agua/artigos_agua_doce/aq%C3%BCifero_guarani%3A_a_maior_reserva_de_agua_doce_do_mundo.html. Acesso em 10 de fevereiro de 2019.

https://www.fenae.org.br/portal/fama-2018/noticias/fica-na-amazonia-o-maior-aquifero-do-mundo-capaz-de-abastecer-o-planeta-por-250-anos.htm. Acesso em 14 de fevereiro de 2019.

Notas:

1 RIBEIRO, Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro. ROLIM, Neide Duarte Rolim. Planeta água de quem e para quem: uma análise da água doce como direito fundamental e sua valoração mercadológica. Revista Direito Ambiental e sociedade, v. 7, n. 1. 2017 (p. 7-33), p.9-10.

2 Fonte: https://www.nationalgeographicbrasil.com/meio-ambiente/crise-da-agua-doce. Acesso em 10 de fevereiro de 2019.

3 O aquífero está posicionado nas bacias do Marajó (PA), Amazonas, Solimões (AM) e Acre – todas na região amazônica – chegando até às bacias subandinas. Para se ter ideia, a reserva de água equivale a mais de 150 quatrilhões de litros. Água suficiente para abastecer o planeta por pelo menos 250 anos. Disponível em: https://www.fenae.org.br/portal/fama-2018/noticias/fica-na-amazonia-o-maior-aquifero-do-mundo-capaz-de-abastecer-o-planeta-por-250-anos.htm. Acesso em 14 de fevereiro de 2019.

4 SCHIO, Regiane. Aquífero Guarani: a maior reserva de água doce do mundo. Disponível em: http://ambientes.ambientebrasil.com.br/agua/artigos_agua_doce/aq%C3%BCifero_guarani%3A_a_maior_reserva_de_agua_doce_do_mundo.html. Acesso em 10 de fevereiro de 2019.

5 Segundo Judith Martins Costa é necessária uma mudança de mentalidade, que é em regra antropocêntrica, centrada e concentrada na ideia de ‘direito subjetivo’, um verdadeiro giro epistemológico, para que passemos a considerar o tema a partir do bem, da res, e de suas efetivas utilidades. MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes teóricas do novo Código Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 148.

6 Dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências. Disponível em:  http://pnqa.ana.gov.br/Publicacao/RESOLUCAO_CONAMA_n_357.pdf.  Acesso em 10 de fevereiro de 2019.