Relembrando a “Oração aos Moços”

28 de fevereiro de 2016

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A pregação cívica proclamada por Rui Barbosa, ao paraninfar os formandos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, em 1921, deixou marcado, na consciência moral e jurídica dos bacharéis em Direito, a partir da sua memorável pregação, o compromisso de servir no ofício com honra, dignidade e respeito à Lei e à Justiça. 

O chamamento ao significado histórico da oração vem a propósito do Manifesto divulgado por advogados com críticas aos julgamentos que ocorrem sobre os autores das famigeradas corrupções havidas nos processos do Mensalão, da Petrobras e demais bandalheiras perpetradas pela quadrilha de bandidos que se encastelaram nos cargos e nas funções governamentais e em empresas que geriram projetos, construções e obras nos vários setores e atividades públicas afins.

Mais estranho, despropositado, incabível e até mesmo injuriosas contra o Poder Judiciário são as declarações do chefe do partido político que abrigou a maioria dos delinquentes confessos, julgados, condenados e já presos, manifestando-se contra os magistrados que, no exercício da função judicante, estão punindo exemplarmente os corruptos e corruptores, apanhados com os bilhões de reais embolsados nas tratativas criminosas de que participaram. 

Os pronunciamentos das entidades de juízes e procuradores que rebatem com veemência as acusações desprovidas de fatos que apontam e justificam desvios processuais jurídicos, como afirma o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) João Ricardo dos Santos Costa, acrescentando, “que a Carta dos Advogados é uma manobra para pressionar o Judiciário, e que a AMB repudia esse tipo de procedimento”.

Também a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) criticou a Carta dos Advogados. Em nota, a entidade diz que rechaça os ataques ao Ministério Público e lembra que o texto é de autoria de advogados dos próprios investigados no maior caso de corrupção no País, afirmando: “A Lava Jato atende aos anseios de uma sociedade cansada de presenciar uma cultura de impunidade no que diz respeito à corrupção e às organizações criminosas. Ela atinge grupos que outrora escapavam da lei. Uma operação com as dimensões da Lava Jato (com 941 procedimentos instaurados, 75 condenados, cerca de R$ 2 bilhões recuperados e R$ 4 bilhões em curso de repatriação aos cofres públicos, 85 pedidos de assistência jurídica internacional) é de interesse público e a divulgação de informações atende aos preceitos constitucionais da publicidade e do direito à informação”. 

Igualmente, o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Antônio César Bochenek, declarou que aqueles que não podem comprovar seu ponto de vista do direito atiram ilações contra a lisura do processo, afirmando: 

A operação Lava Jato coroa um lento e gradual processo de amadurecimento das instituições republicanas brasileiras, que não se colocam em posição subalterna em relação aos interesses econômicos.

A Justiça Federal realiza um trabalho imparcial e exemplar, sem dar tratamento privilegiado a réus que dispõem dos recursos necessários para contratar os advogados mais renomados do País. Essa ausência de benesses resulta em um cenário incomum: empreiteiros, políticos e dirigentes partidários sendo presos.

A Lava Jato não corre frouxa, isolada, inalcançável pelos mecanismos de controle do Poder Judiciário. Além de respaldada pelo juízo federal de 1o grau, a operação tem tido a grande maioria de seus procedimentos mantidos pelo Tribunal Regional Federal da 4a Região (TRF4), pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Interessante notar como as críticas de alguns poucos advogados revelam o desajeito deles com este novo contexto. Tal se revela, sobretudo, na busca de neologismos marqueteiros. Chamar de neoinquisição o funcionamento das instituições republicanas é um desrespeito com as verdadeiras vítimas históricas da inquisição, que – todos sabemos – perseguiu, torturou e assassinou por motivos religiosos. Na ausência do que dizer, atacam desmerecidamente e revelam escasso conhecimento histórico.

Fazem isso em uma tentativa vã de forjar, na opinião pública, a impressão de que a prisão é pena excessiva para quem desviou mais de R$ 2 bilhões, montante já recuperado pela operação Lava Jato.

A magistratura federal brasileira está unida e reconhece a independência judicial como princípio máximo do Estado Democrático de Direito. Assim, reconhece também a relevância de todas as decisões de todos os graus, pelo desembargador João Pedro Gebran Neto, relator dos processos da Lava Jato no TRF4, e pelos desembargadores Victor Luiz dos Santos Laus e Leandro Paulsen, que também compõem a 4a Turma.

No STJ, sabemos quão operosos são os ministros Felix Fischer, relator dos processos da Lava Jato, e Jorge Mussi, Gurgel Faria, Reynaldo Soares e Ribeiro Dantas, que compõem a 5a Turma. Eles não se prestam à violação de direitos de qualquer réu.

Da mesma forma, confiamos plenamente nos ministros Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF, e Celso Mello, Gilmar Mendes, Carmen Lúcia e Dias Toffoli, que integram a 2a Turma, bem como os demais ministros da Corte. Eles dão a garantia final de que os processos da Lava Jato correm conforme o devido processo legal.

A magistratura brasileira avançou muito nos últimos anos, como a nossa sociedade democrática. Os magistrados não sucumbirão àqueles que usam o Direito e a Justiça para perpetuar impunidades sob o manto sagrado de defesa. 

A nota da entidade diz ainda que, quando há provas de um vício ou equivoco processual, o natural é apresentá-las ao tribunal, para que se mude o curso do caso. “Quando elas não existem, uma carta nos jornais parece um meio de dar satisfação aos próprios contratantes. Os advogados não podem tirá-los da cadeia – as condenações estão corroboradas pelas instâncias superiores do Judiciário – então, a única solução é reclamar em alto e bom som”.

Os juízes federais estarão vigilantes às ameaças às suas prerrogativas e vão acompanhar qualquer movimento que tenha o objetivo de desestabilizar ou atacar a missão constitucional da Justiça Federal. Não serão admitidas acusações levianas de pessoas que foram atingidas pelas decisões dos magistrados federais em todas as instâncias sem uma reação imediata e contundente dessas associações de juízes.

Diante dessa nova realidade que começa a quebrar velhos paradigmas e transformar a percepção da sociedade sobre a punição dos corruptos, os juízes federais sempre defenderão a missão de julgar e distribuir justiça, sem ceder a qualquer tipo de intimidação ou pressão. 

No controverso das opiniões da Carta dos Advogados e Notas das entidades acima referidas, há que se destacar a posição firme, clara e objetiva da opinião que vem sendo esposada pela editoria da revista desde a sua fundação em junho de 1999, quando afirmamos o firme propósito de nos colocarmos ao lado do Poder Judiciário e da Magistratura, por entendermos o relevante papel que essas instituições representam como vivência e garantia do Estado Democrático de Direito.

Relembrando conselhos e recomendações que o Águia de Haya deixou no histórico pronunciamento, cujo sentido tornou-se dogma a dignificar a postura dos bacharéis de Direito, parece-nos estranháveis certos quesitos levantados pelos advogados signatários da referida Nota, o que nos levou diante do fato, a reafirmar perante nossos leitores os compromissos cujos princípios assumimos em junho de 1999.