Semana Nacional do Registro Civil leva cidadania à população em vulnerabilidade social

12 de junho de 2023

Da Redação

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Segundo as últimas estatísticas disponibilizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 2,8 milhões de brasileiros não possuem qualquer registro civil como certidão de nascimento ou documento de identificação. Uma parcela desse número é composta por pessoas que perderam a certidão ou nunca tiveram uma, não sabem onde ou se foram registradas. Essa situação impede o exercício da cidadania e o asseguramento de direitos básicos como, por exemplo, o acesso aos benefícios sociais dos governos, ao Sistema Único de Saúde (SUS), às vagas no mercado formal de trabalho e à realização de matrícula na Rede Pública de Educação.

Para enfrentar essa realidade que deixa muitos brasileiros na invisibilidade, uma iniciativa inédita da Corregedoria Nacional de Justiça ofereceu acesso à cidadania a milhares de brasileiros em situação de vulnerabilidade social. Em maio, sob condução do Corregedor Nacional, Ministro Luis Felipe Salomão, a Corregedoria promoveu a Semana Nacional do Registro Civil, no âmbito do programa Registre-se!. 

Balanço da primeira edição – A ação permitiu a emissão gratuita de pelo menos 31 mil certidões de nascimento em todo o território nacional. Com apoio dos Tribunais de Justiça e dos Cartórios de Registro Civil, foram realizados mais de 100 mil atendimentos para a emissão de documentos básicos.

A região do país com mais certidões emitidas foi o Norte, com mais de 12 mil documentos. Depois, o Nordeste, com 6,8 mil certidões emitidas. No Sudeste foram 6,1 mil documentos, no Sul 2,8 mil e no Centro Oeste 2,2 mil.

A falta de documentos básicos faz com que grande parcela da população não tenha acesso a serviços fundamentais como saúde, educação e, principalmente, programas assistenciais. Para ampliar o atendimento, a Corregedoria Nacional também fechou parcerias com ministérios do Governo Federal para garantir o encaminhamento dos cidadãos vulneráveis para programas de capacitação e também os programas sociais. As pessoas atendidas, por exemplo, conseguiram atualizar ou inserir seus dados no Cadastro Único, plataforma do Governo Federal com 28 programas, como o Auxílio Brasil, o Benefício de Prestação Continuada, a Tarifa Social de Energia Elétrica e o Criança Feliz, entre outros.

Articulação interinstitucional – “Hoje, é o início de um grande trabalho. Viemos aqui onde há essa reunião de cidadãos em estado social de vulnerabilidade para trazer uma boa notícia, para dizer que o Poder Judiciário está olhando para vocês. (…) Estamos fazendo a campanha graças a um grande esforço de preparação da estrutura do Judiciário, envolvendo as corregedorias de todo o País, registradores, profissionais de divulgação, meios de comunicação e assessorias de imprensa do CNJ e dos tribunais”, entusiasmou-se o Ministro Luis Felipe Salomão – Presidente do Conselho Editorial da Revista JC – na solenidade de lançamento da campanha, realizada num centro de acolhimento da população em situação de rua, em Brasília (DF).

“Trata-se de um ato simples com um efeito extraordinário na vida de milhões de brasileiros e brasileiras. Que tenhamos sucesso”, resumiu o Ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias, na mesma solenidade.

Resgate da cidadania – “Condição básica para existir”, como enfatizou o porta-voz da campanha, padre Júlio Lancellotti – que se destaca por sua atuação junto às pessoas em situação de rua, na cidade de São Paulo – a posse da certidão de nascimento é um instrumento para exercício da cidadania. De acordo com o Corregedor da Justiça do Distrito Federal e Territórios, o Desembargador J.J Costa Carvalho, a partir deste documento, “uma gama de oportunidades se descortina ao indivíduo”.

“Tanto o registro de nascimento quanto a documentação civil básica (…) perpassam duas dimensões da existência do cidadão. De um lado estão intrinsecamente ligados à sua individualização como ser humano, trazendo além da autoestima, referências como nome, idade, naturalidade e reconhecimento familiar. Lado outro, publicizam e juridicizam a existência do cidadão, garantindo-lhe convívio social harmônico e mostrando-se importante instrumento de cidadania ao assegurar acesso à saúde, educação, assistência social e trabalho regular”, afirmou o Desembargador.

Dentre as atividades da campanha, estavam a emissão de certidões do primeiro registro a quem não a detém ou a segunda via do registro civil de nascimento ou casamento a quem solicitou. Também foram feitos encaminhamentos para a expedição de Registro Geral (RG), Cadastro de Pessoa Física (CPF), título de eleitor, certificado de reservista, dentre outros documentos. “São pessoas invisíveis. (…) O que nós podemos contribuir é com o documento fundamental para que essa cidadania seja resgatada, que é o registro de nascimento. Realizamos convênios com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome e o Ministério do Trabalho para que, a partir do registro e já ali mesmo no local, essas pessoas possam ser encaminhadas para a capacitação e para um futuro emprego”, acrescentou o Ministro Luis Felipe Salomão.

Situação de rua – A prioridade da campanha foi atender quem vive em situação de rua. Na capital federal, por exemplo, quando uma pessoa aciona assistência social para conseguir a emissão da certidão de nascimento, o prazo usual para recebimento do documento costuma ser de seis meses. Ao longo desse tempo uma rede é ativada, passando por pesquisas, contatos entre secretarias de estado, requisições a cartórios, até a emissão e o envio da documentação. Após o cumprimento de todas essas etapas, muitas vezes, a assistência social não consegue mais encontrar o morador de rua.

Um dos beneficiários da primeira edição da campanha foi Maicon dos Santos Costa, de 22 anos, morador de rua, que recebeu a certidão de nascimento em Goiânia (GO). Ele contou ao site do CNJ que chegou a receber há algum tempo uma proposta de um homem que ofereceu R$ 5 mil para que ele “vendesse seu nome”.

“Um homem me parou no sinaleiro e disse que queria meu nome para colocar na empresa dele. Ele falou que me daria R$ 5 mil, além de móveis e outros benefícios. A gente fica muito vulnerável na rua, mas Deus me deu forças para negar, porque eu só queria ser visto como um ser humano de novo e ter uma vida digna como todo mundo. E com muita gratidão e humildade nesse momento tão importante para mim e para milhões de pessoas como eu, posso afirmar que fiz a escolha certa”, disse.

O CNJ previa que a Semana Nacional do Registro Civil – Registre-se! deveria ser realizada anualmente. Porém, diante do alcance e capilaridade da primeira edição, a Corregedoria avalia desenvolver uma nova edição no segundo semestre.

Parceria com os cartórios – Mesmo com uma rede de cartórios grande e capilarizada, o Brasil ainda sofre com o elevado número de subnotificação de registros civis. De acordo com o Presidente da Associação dos Notários e Registradores do Distrito Federal (Anoreg-DF), Allan Nunes Guerra, os Cartórios de Registro Civil registram por ano, de modo gratuito, 2,8 milhões de nascimentos, 1,3 milhão de óbitos, e perto de um milhão de casamentos, para quem requer a gratuidade. São também os maiores emissores de CPF do Brasil.

“Tudo o que os registradores civis fizeram ainda não foi suficiente, por isso tem-se a ação afirmativa do CNJ. Encaramos esse programa como o nosso casamento. (…) O Conselho editou o provimento, a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen) criou um módulo em sua central eletrônica, e o Presidente da Arpen, Gustavo Fiscarelli, multiplicou o conhecimento, realizando reuniões nas 27 unidades da Federação”, listou Guerra.