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Conciliação também na execução da sentença

31 de dezembro de 2009

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A Semana Nacional da Conciliação, promovida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), será ampliada no ano que vem. A conselheira Morgana Richa, presidente da Comissão de Acesso à Justiça e Cidadania, que é o órgão responsável pela fiscalização e elaboração do planejamento estratégico do Judiciário brasileiro, anunciou que a meta para 2010 é levar a negociação a outras fases do processo, principalmente à execução da sentença. A composição nesta etapa processual é mais comum na Justiça do Trabalho, por estar prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Nos ramos Federal e Estadual, por sua vez, é proposta no início do conflito, quando os direitos ainda não foram reconhecidos. Segundo a conselheira, a mudança no foco tem como objetivo proporcionar maior rapidez e efetividade à decisão judicial.
A proposta de ampliar o rol das hipóteses em que a composição entre as partes é possível não parece tão simples, ainda mais no caso da execução da sentença. “A conciliação é mais fácil antes do julgamento, pois os direitos ainda não foram reconhecidos. Depois que o processo é julgado, o recuo entre as partes é mais difícil. É um desafio. Porém é necessário para dar efetividade à sentença judicial”, afirmou Morgana Richa.
A conselheira contou que a ideia de estender a conciliação surgiu após uma experiência verificada na última edição da Semana Nacional da Conciliação, realizada entre os dias 7 e 11 de dezembro últimos, na Vara de Execuções Fiscais da cidade de São Paulo. Esse juízo conseguiu eliminar 1.410.122 processos após o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Núcleo de Planejamento e Gestão do Tribunal de Justiça de São Paulo e a Secretaria Municipal de Justiça colaborarem para o aperfeiçoamento do sistema eletrônico, permitindo que trocasse informações com a Prefeitura e a Procuradoria da Fazenda municipal de forma mais ágil.
Aquela vara, no entanto, conta ainda com acervo de 1.172.331 processos em andamento e 538.078 execuções arquivadas provisoriamente. O acervo do juízo é significativo se levado em consideração o fato de que foi criado em novembro do ano passado. Para o CNJ, uma das saídas para reduzir o estoque é a realização de acordos com as procuradorias da Fazenda, mesmo após o início do processo. “Temos que evoluir a conciliação conforme a própria demanda do Judiciário. Um ponto que necessariamente deverá ser pensado para 2010 é a efetividade da execução judicial”, afirmou Morgana Richa, destacando que a medida visa a atender todo o Brasil.
A conselheira explicou que a conciliação passará a ser proposta após a decretação da sentença e para qualquer tipo de ação. O foco, entretanto, será maior na execução fiscal. Esse processo geralmente é mais moroso, principalmente por envolver órgãos públicos, que sempre foram inacessíveis no que diz respeito à conciliação, segundo afirmou. “Temos que evoluir a conciliação de acordo com a própria demanda do Judiciário. Um ponto que necessariamente deve ser pensado para 2010 é a conciliação na fase de execução, etapa esta mais complexa. Na execução fiscal é mais importante ainda por atingir os órgãos públicos, que são vistos como intocáveis para efeitos de conciliação”, disse.
Morgana Richa acredita ser possível a realização de acordos mesmo após a decretação da sentença. Segundo ela, a medida é importante e pode até contribuir para acelerar o pagamento dos precatórios – crédito estabelecido por determinação do juiz, a ser pago por entes públicos. Estimativas indicam que a dívida de estados e municípios já ultrapassaria R$ 100 bilhões. “A conciliação é um processo de aproximação das partes. Mesmo depois de reconhecido o título, é possível as partes cederem. Com isso, processos que duram 10 ou 15 anos seriam solucionados”, afirmou.
A proposta de estender à conciliação é bem vista. O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), desembargador Luiz Zveiter, afirmou que a composição deve ser proposta em qualquer etapa do processo. “A conciliação tem que se dar em todas as fases processuais. E com qual intuito? Encurtar o caminho do processo através de um acordo que satisfaça as partes”, disse.
O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (Rio de Janeiro), desembargador Aloysio Santos, explicou que a conciliação na execução já ocorre nesse ramo do Judiciário. “Isso está previsto na CLT. A conciliação é nosso objetivo maior. Então, ainda que superada a fase de instrução e o julgado feito, o juiz do trabalho pode, a qualquer momento e com base na Consolidação das Leis do Trabalho, propor a conciliação, inclusive durante a execução”, afirmou o magistrado, destacando que a conciliação tornou-se a nova política do tribunal, adotada tanto pela primeira como pela segunda instância.
No encerramento da Semana Nacional da Conciliação, realizado em solenidade no Palacete Neocolonial do Botafogo de Futebol e Regatas, no dia 11 de dezembro último, Morgana Richa lembrou que os tribunais de Justiça do País receberam, no ano passado, 70 milhões de novas ações. Essa demanda, quando dividida entre a população, traduz-se em um processo por cada três habitantes. Se levado em consideração o fato de que em cada ação há pelo menos duas partes, no polo passivo e ativo, mais da metade dos brasileiros teriam demanda no Judiciário, explicou. De acordo com a conselheira, as estatísticas apontam a necessidade de se criar alternativas para a resolução mais célere de todos esses conflitos. “É preciso instalar uma cultura voltada para a conciliação. O papel do CNJ é justamente esse: direcionar as políticas estratégicas de modo a haver maior investimento na conciliação”, disse.
O resultado da Semana Nacional da Conciliação realizada nesse ano foi impressionante. Balanço parcial, divulgado no dia do encerramento, apontava a celebração de 81.613 acordos pelas justiças Federal, do Trabalho e Estadual, que somavam o montante de R$762.923.577.79. O Judiciário Trabalhista foi o que obteve a maior negociação: R$357,1 milhões no total. Em seguida está o Judiciário dos estados, com R$352,6 milhões acordados, e o Judiciário Federal, com R$53,1 milhões. Nessa edição, foram realizadas 184.035 audiências em todo o País e atendidas 345.224 pessoas. Morgana Richa explicou que os valores envolvidos são ainda maiores, se considerados os dados da Semana Nacional da Conciliação, promovida pelo CNJ em setembro, para acelerar a Meta 2 do Judiciário, que visa o julgamento de todos os processos distribuídos até dezembro de 2005.
A Semana Nacional da Conciliação integra o Programa Conciliar é Legal, criado pelo CNJ em 2006. Naquele ano, o projeto foi realizado apenas em um dia – 8 de dezembro, em comemoração ao Dia da Justiça. Foram realizadas na ocasião 46.493 acordos. Em 2007, muitos tribunais estenderam a iniciativa por vários dias, dando início à Semana. O número de conciliações subiu para 96.492 naquele ano. Já no ano passado, o CNJ registrou a obtenção de 130.848 composições em todo o Brasil.
Para o conselheiro Nelson Tomaz Braga, o balanço tem sido cada vez mais positivo. “Estamos criando a consciência nacional de que o conciliar é legal, não apenas no termo da legalidade. Estamos criando uma nova mentalidade, que alcançou a todos os juízes, empresas, parceiros do CNJ e sociedade”, disse.
Em decorrência do movimento liderado pelo Conselho, a conciliação, poderá se tornar obrigatória. A comissão de juristas criada pelo Senado Federal para elaborar o anteprojeto de reforma do Código de Processo Civil cogitou incluir na norma um dispositivo nesse sentido.