Sobre a figura do Procurador-Geral da República e o Ministério Público brasileiro. Ou o porquê o PGR não é (só) o chefe do MPF. Uma necessária correção

3 de novembro de 2015

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Fruto, sobretudo, da operação lava jato –  e da AP 470, pouco tempo antes – , a figura do PGR ganhou  destaque e visibilidade enormes.

Por muitas vezes, o chefe do MPU apareceu na mídia, em entrevistas coletivas. Atrás dele, quase sempre, um banner com o logo do MPF. A repercussão dada a instituição, por causa disso, foi –  e continua sendo –  também muito grande.

Aos olhos dos leigos, as imagens passam a impressão de ser o PGR o chefe do MPF, vale dizer, o chefe dos procuradores da república. Neste ponto, necessária uma devida retificação.

O PGR não é (só) o chefe do MPF.  O PGR não é o chefe dos Ministérios Públicos dos estados. O PGR é o chefe do MPU.

Como se sabe, o Ministério Público da União – MPU é formado por 4 ramos diversos. Fazem parte dele, além do MPF, o MPT, o MPM e, ainda, o MPDFT (art. 128, CF).

Embora MPT, MPM e MPDFT possuam seus respectivos procuradores-gerais, o PGR é, em realidade, o chefe do MPU – não apenas do MPF.

A constituição (art. 128, paragrafo 1º) é clara nesse sentido, ao afirmar que o MPU tem por chefe o PGR, nomeado pelo(a) presidente da república, dentre os integrantes da carreira (do MPU, evidentemente). Com efeito, pode o PGR ser escolhido entre procuradores do trabalho, promotores de justiça militar e promotores de justiça do MPDFT, além de procuradores da república.

Tradicionalmente, e por circunstâncias históricas, entretanto, os PGRs são escolhidos dentre integrantes da carreira do MPF, através de lista tríplice formada por votação exclusiva de e entre integrantes desse ramo do MP, encaminhada, pela ANPR, à presidência da república, para a escolha de um dos nomes.

Conquanto essa exigência –  de formação de lista tríplice –  não constitua imposição constitucional – ao contrário do que ocorre no processo de escolha dos chefes dos MP estaduais , cuja lista tríplice é exigida expressamente pela constituição no art. 128, paragrafo 3º – , ela vem sendo seguida há bastante tempo

Nos últimos 12 anos, por exemplo, os nomes mais votados na lista da ANPR foram os indicados ao cargo de PGR.

Foi o que aconteceu com os ex-PGRs Cláudio Fontelles, Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, Roberto Gurgel e, agora,  nas duas disputas internas, com o atual PGR, Rodrigo Janot.  Além de integrarem a lista tríplice da associação, quando nomeados, foram os mais votados pelos membros da instituição.

No penúltimo processo de escolha, os membros do MPT, do MPM e do MPDFT, por intermédio de suas respectivas associações de classe – ANPT, ANMPM e AMPDFT – , talvez incomodados com a exclusão deles do processo de escolha, encaminharam à Presidência da República outra lista, com a votação de seus membros.

Todavia, embora tenham reclamado participação na escolha do chefe do MPU, as demais associações não indicaram candidato algum para a chefia da instituição. Limitaram-se a votar nos três nomes do MPF que já disputavam a chefia da instituição. Exigiram, dessa forma, apenas a possibilidade de poder interferir na escolha, e não a prerrogativa de indicar um dos seus membros para o comando do MPU.

Por sua vez, ao lado do MPU encontram-se os MP dos estados. Integrados por promotores de justiça e procuradores de justiça, inexiste subdivisão nesse ramo do MP. Diferentemente do que ocorre no âmbito do MPU, os chefes dos MP dos estados, os Procuradores Gerais de Justiça – PGJs, são escolhidos, obrigatoriamente,  a partir  de  lista tríplice, formada por integrantes da carreira, cabendo ao governador do estado a escolha de um dos nomes.

Cada um desses ramos do MP brasileiro – MPE, MPF, MPT, MPM e MPDFT – possuem atribuições distintas. Não existe, em qualquer situação, sobreposição ou posição de ascendência entre as instituições e seus membros – a mesma situação se verifica, mudando o que deve ser mudado, e levando-se em consideração algumas características próprias, nos órgãos do Poder Judiciário, em especial entre as Justiças Federal e dos estados. Tampouco é possível traçar um paralelo entre os poderes executivos e legislativos dos estados e da União. No Ministério Público – e também no Judiciário – as divisões de atribuições e competências entre os órgãos são bastante distintas.

Portanto, o PGR, nessa qualidade, deveria se apresentar, perante a população, como o representante maior da  instituição toda  que está sob seu comando, o MPU, e não apenas de um dos seus ramos, que é o MPF. Sob a ótica da unidade ministerial, cujo princípio encontra-se expressamente previsto na Constituição Federal, apresentar-se como o chefe de todo o  MP brasileiro, indistintamente, dadas as atribuições que possui – entre inúmeras outras, a de presidir o CNMP, órgão de controle externo da instituição – , seria ainda mais ( ou talvez mais) adequado.