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Blindagem de Liminares e Tutelas – Sociedade Agradece

8 de junho de 2012

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Com muito temor e com muita preocupação, temos observado ações judiciais propostas por usuários em face das concessionárias de serviço público em geral, em profusões geométricas.

Mesmo inadimplentes, na grande maioria das vezes, obtêm liminares e antecipação de tutelas, inaudita altera pars, compelindo as concessionárias a fornecer o serviço, mesmo sem a devida contraprestação. Se a decisão é cabível, que seja eficaz apenas em relação aos débitos que são discutidos na ação.

O cenário se agrava quando essas decisões, proferidas de forma genérica, determinam que a empresa mantenha o serviço ou, em caso de suspensão, o restabeleça. Assim, ações que, em seu nascedouro, discutem, por exemplo, um ou dois meses de inadimplemento, garantem ao usuário um “cheque em branco”, já que o serviço não pode ser suspenso e o usuário acaba se valendo dessas liminares e tutelas para não quitar as faturas vincendas.

Se a relação contratual entre estas partes é de trato sucessivo, devem as decisões guardar proporção com a causa de pedir, tal como formulado na inicial ou contestado pela parte ré em sua defesa.

Não é crível que decisões sirvam de salvaguarda para inadimplementos futuros. Se este detalhe não for observado, não haverá a preservação do equilíbrio econômico e financeiro do contrato entre as partes e um efeito devastador desta inadimplência trará impacto para o fluxo de caixa das concessionárias e a percepção, para muitos, de que o serviço é gratuito.

O acima afirmado é corroborado em brilhante posicionamento exarado na decisão do AI no 2009.002.25646, 4a Câmara Cível do TJRJ:

É indiscutível que a concessionária agravante possui enorme custo para manter a prestação do serviço, devendo ser remunerada para tanto. A se permitir o fornecimento de energia sem contraprestação, estar-se-ia estimulando a inadimplência, pois levaria o consumidor à falsa ideia de que, em havendo qualquer insatisfação com o serviço prestado, poderia lançar mão do Poder Judiciário e, assim, fica autorizado a receber o serviço sem dar a contrapartida que é o pagamento.

 

Decisões que parecem simples, como, por exemplo, “abster-se de cortar ou religar”, geram, pela sua abrangência e incrível dificuldade de reversão, reflexos nocivos que há muito já são percebidos pelas concessionárias e por quem quer usufruir, mas não quer pagar.

Por óbvio, as concessionárias não podem ser compelidas a prestar serviço durante o longo curso de uma ação judicial, sem receber a devida contraprestação e observar o inadimplemento crescer e gerar, no futuro, a impossibilidade de sua quitação, em razão do acúmulo de faturas não pagas e do seu elevado valor.

Se, existente débito, lícita a suspensão do serviço enquanto não pago, não havendo nenhuma afronta ao disposto no art. 22 do Código de Defesa do Consumidor – CDC, já que a continuidade não presume a gratuidade deste, uma vez que imperiosa a contraprestação. Não se pode conceber que uma concessionária que necessita dos recursos advindos da cobrança da tarifa para manter e melhorar seus serviços, fique privada destes e obrigada a prestá-los.

Se a tese da gratuidade e das liminares e tutelas genéricas prevalecer, por certo haverá um estímulo ao inadimplemento por parte de considerável parcela da população. Por seu turno, as concessionárias se veriam obrigadas a prestar serviços aos inadimplentes, sem a devida contrapartida e sendo compelidas a se socorrer de via executiva para cobrança, que, como sabemos, é morosa e sempre sujeita à existência de bens passíveis de constrição para alienação e quitação do débito, situação em que não se encontra boa parte da população, pela carência de recursos e de bens.

Portanto, impossível para as concessionárias continuarem prestando seus serviços sem recursos, o que, por certo, prejudicaria toda a coletividade e, aí sim, a continuidade do serviço.

O Superior Tribunal de Justiça – STJ desde março de 2004 (RESP 363.943) já pacificou o entendimento pela legalidade da suspensão do serviço, desde que precedido de prévio aviso. Entender diferente é onerar toda a coletividade, acarretando sérios prejuízos às concessionárias. Liminares e tutelas genéricas, infelizmente, continuam sendo proferidas com frequência inimaginável, a reversão dessas decisões não é tarefa fácil e leva longo tempo, o que favorece aquele que não quer pagar.

A resposta que se espera é que os nobres julgadores atentem para que estas condutas oportunistas não acabem sendo motivadoras da busca incessante por um “direito” que onera e impacta a sociedade.

Um basta às decisões genéricas e um olhar voltado para a necessidade de blindagem dessas. Dúvida não há de que as decisões devem refletir o período do inadimplemento que porventura é objeto da ação inicialmente proposta.

Tudo aqui ora exposto parece claro, mas não é. Ao usuário cabe efetuar o pagamento das faturas que venceram após a concessão da tutela ou liminar, ou proceder o depósito dos valores que entende devidos, se perdurar a divergência em relação ao seu consumo, evitando-se, assim, o inadimplemento que enseja a suspensão do serviço.

Para evitar o locupletamento ilícito e até a impossi­bilidade do débito aumentar em razão das liminares e tutelas genéricas, que garantem o serviço e não a contraprestação, é necessário que estejamos atentos a este problema. Ademais, é necessário que lembremos, em um momento em que buscamos a solução e mediação dos conflitos, por conseguinte, a redução do ingresso de ações e dos estoques destas nas empresas e no Judiciário, que a máquina judiciária está sendo usada por aqueles que usufruem destas tutelas e liminares para ter o serviço e não pagar por ele, o que, por certo, todos repudiamos.