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Desafios de uma Moderna Administração Fazendária

31 de março de 2009

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“Como melhorar o ambiente de negócios no Estado do Rio de Janeiro, incrementando a arrecadação e o controle qualitativo do gasto público, sem prejuízo de novos investimentos e incentivando as empresas sérias a se estabelecerem em nosso Estado?”
Com esta pergunta em mente, o então vice-presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento e ex-Secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Vieira Ferreira Levy, assumiu a Pasta da Secretaria de Estado de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, no início de 2007.
E, naquela ocasião, encontrou uma instituição recém-unificada (antes havia a separação da Pasta em duas: Receita e Finanças), com uma estrutura muito ruim, sem instalações físicas adequadas e com um quadro de pessoal que, se, de um lado — da Receita —, não havia concurso para Fiscais de Renda há 20 anos, do outro lado — das Finanças —, o Estado era gerido por mão de obra terceirizada, praticamente sem servidores de carreira.
E foi com estes desafios e estes problemas que fui convidado, depois de passar um período na chefia da assessoria jurídica da extinta Secretaria de Estado de Receita, para assumir a Subsecretaria de Fazenda para Assuntos Jurídicos, com funções que iam além da assessoria jurídica, alcançando uma postura executiva, necessária para tocar as medidas de modernização das estruturas de arrecadação e gasto público do Estado.
Na parte da arrecadação, o foco inicial do trabalho era a melhoria do processo de constituição do crédito tributário, começando da lavratura do auto de infração, passando pelos mecanismos de intimação do contribuinte e culminando com o julgamento pelo Conselho de Contribuintes. E o esforço começou do final para o início.
O Conselho de Contribuintes foi um dos órgãos da estrutura da Secretaria de Estado de Fazenda que mais sofreu com os escândalos de corrupção, chegando a ficar um ano com suas atividades suspensas, no período de 2004 a 2005. Estava funcionando sob uma base legislativa equivocada, que dava representação, no órgão paritário, para entidades que representavam segmentos que não recolhiam ICMS, ao passo que deixava de fora setores de ponta, na arrecadação do referido tributo, como o setor de transportes, energia elétrica e telecomunicações.
Houve, portanto, uma reformulação da legislação que dispunha sobre a composição do Conselho e, em maio de 2007, os novos conselheiros tomaram posse, substituindo os antigos que já estavam no órgão, alguns há mais de 15 anos. Além disto, em trabalho conjunto com a Procuradoria Geral do Estado, a Representação da Fazenda, órgão composto por 10 Procuradores do Estado, que é responsável pela defesa e controle da qualidade do auto de infração, foi totalmente reestruturada, contando com mais um Procurador em regime de exclusividade, novas instalações e novos equipamentos. Com isso, a demora em um parecer que, em média, levava mais de 2 anos caiu, nos dias atuais, para o prazo legal de 30 dias, e um passivo de mais de 6.000 processos foi colocado totalmente em dia.
Os julgamentos do Conselho de Contribuintes, por seu turno, tornaram-se qualitativamente e quantitativamente melhores. O órgão passou de uma média de 70 processos/mês, em 2006, para uma média de 600 processos/mês, em 2007, aumentando, consideravelmente, a rapidez do julgamento do auto de infração. Isso é fundamental para a melhoria do ambiente de negócios no Estado, porque, enquanto contribuintes que exerciam um verdadeiro “planejamento fiscal ilícito” ganhavam financeiramente com a demora e desorganização do processo administrativo tributário, as empresas sérias perdiam a credibilidade no Estado, por terem de suportar os custos de décadas de passivos tributários vultosos, sem uma definição final.
Além disso, a melhoria qualitativa nos julgamentos foi significante. Ao longo de 2007 e 2008, cerca de metade dos autos lavrados foram derrubados, por falha técnica, pela Junta de Revisão Fiscal e pelo Conselho de Contribuintes, melhorando a qualidade do crédito tributário a ser inscrito em dívida ativa e evitando condenações desmedidas do Estado em sucumbências judiciais.
O Conselho de Contribuintes, hoje, está em busca da inédita, em Tribunais Administrativos, certificação internacional IS0 9000, procurando demonstrar, para o mundo empresarial, de forma transparente e objetiva, que o Estado do Rio de Janeiro é um local seguro para se investir, já que suas decisões tributárias possuem um grau de celeridade e previsibilidade que permitem diminuir os riscos de investimentos elevados.
Por outro lado, o alto índice de autos de infração sendo derrubados nos órgãos administrativos, por falha técnica ou por mudança de entendimento jurisprudencial, mostrou que algo deveria ser feito na ponta inicial, ou seja, na atividade de fiscalização.
E, mais uma vez, as medidas tomadas dependeram da ampla colaboração entre a Procuradoria Geral do Estado e a Secretaria de Estado de Fazenda. Em primeiro lugar, um grupo de Procuradores do Estado, com notória especialização na área tributária, foi convidado para fazer uma reformulação total na legislação do processo administrativo tributário, resultando em importantes inovações legislativas, tais como a adoção da súmula vinculante administrativa, a celeridade nos mecanismos de intimação do contribuinte, inclusive com a possibilidade de intimação eletrônica, e a introdução de um moderno sistema de distribuição do ônus da prova ao longo do PAT.
Ao lado destas inovações legislativas, a realização de concursos públicos para Fiscais de Renda, seminários e treinamentos técnicos, sempre com a presença marcante de Procuradores do Estado, colaborou para a melhoria técnica dos lançamentos tributários, que se reflete no trabalho dos próprios Procuradores, na cobrança da Dívida Ativa do Estado.
A criação de uma Subsecretaria de Fazenda para Assuntos Jurídicos permitiu, ainda, que a Procuradoria tivesse representação no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), com a aprovação de medidas extremamente importantes para o nosso Estado, como o Convênio 130/07, que superou anos de brigas judiciais, estabelecendo uma forma mais justa de tributação dos bens e equipamentos usados na exploração e produção de petróleo e gás natural, atividades nas quais o Estado do Rio de Janeiro é líder no País e, com as recentes descobertas do pré-sal, será um dos líderes mundiais.
Também, na área da indústria do petróleo, a edição da Lei nº 5.139/07, dando poderes de fiscalização direta, pelo Estado do Rio de Janeiro, das receitas não tributárias, decorrentes das participações governamentais pela exploração de recursos naturais, dentre os quais o petróleo e o gás natural, foi uma das maiores evoluções legislativas deste período. A partir da edição desta lei, o Estado do Rio de Janeiro deixou o seu papel passivo em relação ao recolhimento destas receitas públicas de lado, podendo fiscalizar, efetivamente, a sua correta arrecadação, ainda mais, por se tratar de uma indústria extremamente nociva ao meio ambiente e que se notabiliza pela exploração de um recurso natural finito.
Ainda na área da arrecadação, a boa relação com o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e com a Agência Nacional de Petróleo possibilitou a assinatura de dois importantes convênios para melhorar a fiscalização de uma área que movimenta um volume financeiro enorme e cuja sonegação fiscal atinge índices alarmantes: o refino e a distribuição de combustíveis.
O controle qualitativo e quantitativo do gasto público, por outro lado, foi desenvolvido com medidas legislativas — programa de pagamento de restos a pagar e adoção do leilão reverso — e medidas estruturais — como a realização de concurso público para contadores do Estado do Rio de Janeiro, depois de mais de 20 anos, e o desenvolvimento do trabalho de auditoria interna.
Ao longo destes quase três anos que atuo diretamente na área financeira do Estado, pude formar algumas convicções: a primeira é que a modernização da administração tributária traz mais resultados do que a mera solução simplista de aumento de tributos; a segunda é que, sem a união dos órgãos do Estado, como a Secretaria de Estado de Fazenda, a Procuradoria Geral do Estado e o Ministério Público, qualquer esforço no sentido de modernizar a máquina arrecadatória e controlar os gastos públicos não trará nenhum resultado significativo.
É por essa razão que o sucesso de uma administração na Secretaria de Estado de Fazenda nunca reflete uma vitória de apenas uma Pasta, mas, ao revés, a união dos diversos órgãos do Estado compromissados em, como falou o Secretário Joaquim Levy, “melhorar o ambiente de negócios no Estado do Rio de Janeiro”.