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Intervenção de Terceiros – Recurso de Terceiro Prejudicado

5 de maio de 2004

Desembargador Federal Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região

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Verifica-se na legislação pátria que existem diversas modalidades de intervenção de terceiros.  Estas modalidades se justificam pelo fato de o processo poder produzir efeitos sofre a esfera jurídica de pessoas estranhas à relação processual.

Sendo assim, no Direito Brasileiro, nos casos expressamente previstos em lei, admite-se a alteração subjetiva da relação processual, com o ingresso de quem originariamente não figurava como parte.

O professor Alexandre Câmara, em sua obra Lições de Direito Processual Civil – Volume 1 – Editora Lumen Iuris, na pág. 162, aduz o seguinte:

“O Código de Processo Civil regula, no capítulo dedicado à intervenção de terceiros (arts. 56 a 80), quatro figuras: oposição, nomeação à autoria, denunciação da lide e chamamento ao processo.  Além destas, porém, duas outras figuras serão examinadas aqui: a assistência e o recurso de terceiro prejudicado.  Embora não estejam incluídas no capítulo próprio, não há dúvidas em sede doutrinária quanto à sua inclusão na categoria das intervenções de terceiros

Fundamentando tal entendimento, cita ainda outros autores, como Greco Filho e Luiz Fux.  Ainda menciona que o próprio Código de Processo Civil, reconhece que a assistência e o recurso de terceiro prejudicado são espécies de intervenção de terceiros, ao mencionar que o art. 280, inciso I, deste diploma legal dispõe que “no procedimento sumário não será admissível a ação declaratória incidental, nem a intervenção de terceiro, salvo assistência e recurso de terceiro prejudicado.”

Também pode-se aduzir que assistência e o recurso de terceiro prejudicado são modalidades diversas (uma da outra), porém  pertencentes ao mesmo instituto, qual seja, o instituto da intervenção de terceiros.

Ressaltando a diferença apontada, Nelson Nery Jr., em seu Código Processual Civil comentado, na página 968, estudando o artigo 499 do CPC, menciona claramente: “O terceiro prejudicado não é assistente”.  Com tal assertiva separa as duas modalidades.

Corroborando ao exposto acima, Vicente Greco Filho, no livro Direito Processual Civil Brasileiro, 1º volume – Ed. Saraiva, na pág. 127, expõe:

“O Código enumera, como casos de intervenção de terceiros, a oposição, a nomeação à autoria, a denunciação da lide e o chamamento ao processo.  Além destes casos, evidentemente, também pertencem à categoria a assistência, prevista em outro capítulo junto do litisconsórcio, e o recurso de terceiro prejudicado.

Portanto, o Recurso de Terceiro Prejudicado vem a ser, então, uma modalidade de intervenção espontânea que não se encontra no capítulo do CPC dedicado à intervenção de terceiros, mas se encontra no mesmo diploma legal.  Vale mencionar, de passagem, que a intervenção de terceiros é um instituto mal regulamentado no Direito positivo pátrio.

Certo é que o Código de Processo Civil se refere duas vezes ao Recurso de terceiro prejudicado, como bem lembra Alexandre Câmara.  Um vez no art. 280, inciso I, e a segunda vez no mencionado art. 499 do CPC.

Importante ressaltar ainda que, embora o instituto seja pouco regulamentado, nos parece não haver dúvidas de que o recurso de terceiro prejudicado seja uma modalidade de intervenção de terceiro, por sua vez diferente das demais classicamente conhecidas, tais como: oposição, nomeação à autoria, denunciação da lide e chamamento ao processo.  Estas são classicamente conhecidas pois estão expressas no capítulo especialmente dedicado ao instituto.

Esta mesma modalidade também não se confunde com a assistência.   Alguns doutrinadores até chegam a mencionar, apenas para efeitos de explicação, que o recurso de terceiro prejudicado seria “uma forma de intervenção de terceiro em grau de recurso, ou, mais propriamente, uma assistência na fase recursal”.  Assim o diz Reis Friede, em sua obra Comentários ao Código de processo Civil, volume 5 – Ed. Forense Universitária, pág. 2277, justamente comentando o art. 499 do CPC.

Mesmo fazendo tal alusão, ou mesmo comparação entre assistência e recurso de terceiro prejudicado, não pairam dúvidas de que são modalidades distintas.  Até porque, conforme rege o parágrafo único do art. 50 do CPC: “A assistência tem lugar em qualquer dos tipos de procedimento e em todos os graus de jurisdição”.

Já a modalidade do recurso do terceiro prejudicado, está positivada e existe justamente para tutelar o direito daqueles que almejam se insurgir contra alguma decisão, mas que poderiam (mas não foram) partes ou assistentes no processo original.

O Nelson Nery Jr. assim ensina, (pág. 968 ob. cit):

“Terceiro prejudicado é aquele que tem interesse jurídico em impugnar a decisão, isto é, aquele que poderia ter ingressado no processo como assistente simples ou litisconsorcial (CPC 50 ou 54).  Está legitimado para interpor qualquer recurso, inclusive embargos de declaração (RTJ 98/152).  Configurada sua legitimidade para recorrer, o terceiro deve demonstrar em que consiste seu interesse em recorrer, isto é, o nexo de interdependência entre seu interesse em impugnar a decisão e a relação jurídica por ela decidida.  A norma regula, portanto, a legitimidade e o interesse recursal do terceiro prejudicado.  O terceiro prejudicado não é assistente.”

Da mesma passagem ainda se verifica a posição do doutrinador, novamente sobre a existência distinta das duas modalidades de intervenção de terceiro: assistência e recurso de terceiro prejudicado, bem como percebe-se previsão para interposição de qualquer recurso, inclusive o Agravo Regimental, como ocorreu no caso em questão.

Nesse mesmo sentido, leciona Alexandre Câmara (ob. cit. Pág. 189):

“O Brasil possui um sistema em que ao terceiro são abertas as mesmas vias recursais que são, ordinariamente, abertas às partes.  Em outras palavras, o terceiro prejudicado pode interpor qualquer dos recursos que às partes é lícito oferecer, e dispões o terceiro do mesmo prazo de que dispõem as partes para tal.”

Entendendo que o recurso de terceiro prejudicado é modalidade diferente da assistência, ambas previstas no CPC, porém, admitindo-se que o recurso de terceiro prejudicado seja uma assistência na fase recursal, impende admitir aqui que, conforme ocorre com a assistência, o Código Processual limita os efeitos da coisa julgada em relação ao assistente, admitindo a chamada exceptio male gesti processus (exceção quando mal conduzido o processo).  Ou seja, transitada em julgado a sentença, na causa em que interveio o asssitente, este não poderá, em processo posterior, discutir a justiça da decisão, salvo de alegar e provar que, pelo estado que recebera o processo, ou pelas declarações ou atos do assistido, fora impedido de produzir novas provas suscetíveis de influir na sentença, ou ainda, de que o assistido, por dolo ou culpa, não se valeu.  Assim se verifica o disposto no artigo 55 do CPC e seus incisos.

Nelson Nery Jr., se referindo ao recurso de terceiro prejudicado disserta que:

“Nessa qualidade, não é considerado assistente, pois seu objetivo é defender direito próprio atingido pela sentença e não de auxiliar a parte perdedora.  A finalidade da assitência simples é fazer com que o terceiro possa auxiliar a parte assistida, pois assim estará atuando na defesa indireta de seu direito.  A finalidade do recurso de terceiro prejudicado é ensejar ao terceiro a impugnação direta de decisão que indiretamente o prejudica, estando ele nessa condição na defesa do direito próprio.”

Continua ainda o ilustre Nelson Nery Jr., no sentido de afirmar que: “é incorreto falar-se que o assistente simples pode recorrer contra a vontade do assistido, por meio do recurso de terceiro prejudicado.”

Vale registrar que há jurisprudência que entende o contrário, conforme RJTJSP 111/43: “O assistente simples pode recorrer, mesmo contra a vontade do assistido”, porém fica a ressalva e a afirmação de que, a tese contrária, que foi anteriormente exposta, é a que se encontra fundada no melhor direito.