Os primeiros meses de Flávio Dino no STF

3 de maio de 2024

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Desenvoltura em Plenário e distância dos holofotes

Na primeira sessão da qual participou como integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), o Ministro Flávio Dino arrancou elogios de colegas. Um deles confessou que ficou impressionado com a desenvoltura que o Ministro com menos tempo de atuação na Corte demostrou no Plenário, mas ressaltou que a performance é resultado dos anos na magistratura e na política. Dino foi Juiz, Deputado Federal, Senador, Governador e Ministro de Estado.

O novo Ministro chegou ao Supremo com a promessa de que vai se distanciar da política e disse pretender ficar um período longe dos holofotes. A prioridade tem sido cuidar do acervo processual: ele tem cerca de 1,3 mil ações sob sua relatoria. Quando vestiu a toga, o magistrado recebeu 364 casos que estavam com a Ministra Rosa Weber antes da aposentadoria
e com o ministro Luís Roberto Barroso antes da
posse na Presidência. No mesmo dia, passou a receber novos casos e atualmente já tem o acervo semelhante ao dos colegas.

Em um mês de atuação, Dino participou de 16 sessões de julgamento, tendo debatido, levado informações e marcado presença. Proferiu cerca de 800 decisões, sendo a maioria (278) em Habeas Corpus – um dos tipos de processo que mais chegam ao STF, depois das reclamações e dos recursos de decisões de outras instâncias.

Tipos de processo e alta complexidade – A maioria dos processos no acervo de Dino tratam de matéria de Direito Processual (396), seguido de Direito Administrativo (391), Direito Tributário (136), Direito do Trabalho (129) e Direito Penal (104). Há ainda dois casos considerados de alta complexidade, que devem mobilizar a Corte por terem relação com o período da pandemia. Um deles trata de reclamação de empresa que dispensou trabalhadores e que foi sancionada pela Justiça do Trabalho, com ordens de reintegração dos funcionários. A questão é delicada porque o STF entendeu, em alguns julgamentos, pela flexibilização de direitos trabalhistas no período da pandemia.

O outro processo, que já teve liminar concedida pelo Ministro Luís Roberto Barroso, mas ainda deverá ser julgado em definitivo, envolve decisão judicial que autorizou desconto em mensalidade escolar na pandemia, mesmo depois de o STF entender que não seria constitucional o desconto linear nas mensalidades porque os dois lados da relação devem ter seus pontos considerados.

Sinalizações em votos – Ao longo das primeiras semanas de atuação, o Ministro deu sinalizações de como deve atuar na Corte. Na área penal, Flávio Dino tem reforçado o entendimento do Supremo de respeito às súmulas que vetam a supressão de instância e só tem concedido liminares em Habeas Corpus que ainda estão em análise em outras instâncias quando vê flagrante ilegalidade.

Foi a partir do voto de Dino, que o Supremo fixou que é possível arquivar processo contra condenado que cumpriu a pena de prisão, sem pagar a pena de multa estipulada pela Justiça. Relator de uma ação contra trecho do “Pacote Anticrime” (Lei 13.964/2019), o ministro defendeu que se ficar comprovada a impossibilidade de pagamento, isso não pode impedir a extinção da pena privativa de liberdade. Portanto, cabe ao juiz da execução penal avaliar a situação. 

Em relação ao porte de drogas para consumo próprio, que tem provocado embate do Congresso com o STF, o Ministro já adiantou que pequenas quantidades de maconha não podem permitir ligar diretamente um investigado ao tráfico de drogas. Dino substituiu a prisão de um homem flagrado com gramas de maconha por medidas cautelares. “A quantidade reduzida da droga apreendida – 7,28 gramas de maconha – embora não seja insignificante, não parece autorizar o juízo no sentido da periculosidade do paciente ou que este seria pessoa profundamente envolvida no tráfico de drogas”, escreveu.

O Supremo discute descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal, enquanto no Congresso tramita uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criminaliza o porte ou posse de qualquer quantidade de drogas. Nesse julgamento, Dino não participa porque a Ministra Rosa Weber votou antes de deixar a Corte, assim como na ação que discute a autorização para aborto até o terceiro mês de gestação. No entanto, ele poderá participar em caso de recursos após o julgamento de mérito.

8 de janeiro – Ministro da Justiça quando os atos golpistas do dia 8 de janeiro de 2023 ocorreram nas sedes dos Três Poderes, Flávio Dino tem acompanhado o voto do relator, Alexandre de Moraes, pelas condenações dos réus executores. O novo ministro do STF, no entanto, não tem divulgado a íntegra do voto no plenário virtual, mas, com a posição dele, as penas propostas por Moraes voltaram a prevalecer, reunindo maioria na Corte. Sem Rosa Weber, as penas estavam sendo definidas a partir de um voto médio. Isso porque Cristiano Zanin e Edson Fachin, que votam pela condenação dos réus, defendem penas menores do que as de Moraes.

Em um voto contundente sobre os limites da atuação das Forças Armadas, Flávio Dino disse que a ditadura militar remete a um “período abominável da nossa história” quando “à revelia das normas consagradas pela constituição de 1946, o Estado de Direito foi destroçado pelo uso ilegítimo da força. 

Ao votar contra a tese do poder moderador das forças, Dino destacou que “tal tragédia institucional resultou em muitos prejuízos à nossa Nação, grande parte irreparáveis”. “No plano das instituições jurídicas, os danos se materializaram, por exemplo, nas brutais e imorais cassações das investiduras de três ilustres ministros do Supremo Tribunal Federal: Hermes Lima, Victor Nunes Leal e Evandro Lins e Silva. (…) Não existe, no nosso regime constitucional, um poder militar. O poder é apenas civil, constituído por três ramos ungidos pela soberania popular, direta e indiretamente. A tais poderes constitucionais, a função militar e subalterna”.

Dino também indicou que não deve se declarar impedido de julgar casos que envolvam o ex-presidente Jair Bolsonaro. O ministro rejeitou um recurso da defesa de Bolsonaro contra uma multa de R$ 70 mil por impulsionamento irregular de conteúdo nas eleições de 2022 decisão mantida por decisão da Primeira Turma da Corte.  

No caso da prisão do Deputado Federal Chiquinho Brazão, suspeito de ser o mandante dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes, enquanto os demais ministros da Primeira Turma apenas acompanharam o voto de Alexandre de Moraes, Dino fez questão de juntar voto com suas argumentações a favor da prisão do parlamentar.

“A compatibilidade entre o regular exercício dos deveres do Poder Judiciário e o respeito às prerrogativas parlamentares é suficientemente (e proporcionalmente) assegurada com a submissão dos autos à Casa Parlamentar a que pertence o destinatário da ordem de prisão. (…) A leitura das peças processuais revela a possibilidade de configuração de um autêntico ecossistema criminoso em uma unidade federada, o que pode gerar a continuidade das investigações, em um ou mais Inquéritos Policiais, a critério das autoridades competentes. Tal situação justifica as medidas cautelares determinadas”, destacou Dino.

Relação com o Maranhão – O ministro também atuou num caso que envolve o Tribunal de Contas do Maranhão, estado que governou. Determinou a suspensão do processo de escolha de integrantes da Corte. Atendeu pedidos da Procuradoria-Geral da República e do Partido Solidariedade, que apontam inconstitucionalidades nas normas da Constituição do Estado do Maranhão e do Regimento Interno da Assembleia Legislativa local que tratam do procedimento de indicação de candidatos aos cargos de conselheiros do TCE-MA. 

Dino destacou que o STF tem entendimento pacífico de que as regras aplicáveis ao Tribunal de Contas da União também devem ser aplicadas, no que couber, aos tribunais de contas dos estados. No plenário virtual, sua posição foi seguida pela Ministra Cármen Lúcia, mas o Ministro Nunes Marques pediu mais prazo para analisar as ações.

O Maranhão também está presente no gabinete de Dino no Quinto Andar do Supremo. O escritório ganhou um busto do poeta maranhense Gonçalves Dias que divide espaço com imagens de santos, uma Bíblia, fotografias da família e uma imensa coletânea de livros jurídicos.