Reflexões para o aperfeiçoamento da magistratura

1 de julho de 2022

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O Brasil tem um dos maiores sistemas de Justiça do mundo, com 17.988 magistrados, que mesmo num momento atípico na História foram capazes de adaptar-se de forma estratégica para dar continuidade aos serviços essenciais e até mesmo aumentar sua produtividade diante de uma crise sanitária mundial sem precedentes. Apesar da rápida assimilação do “novo normal” trazido pela pandemia, o contexto de ininterruptas transformações atualmente vivenciado pela humanidade exige que a Justiça e a magistratura mantenham-se em constante movimento para acompanhá-las.

Para mover-se na direção certa, contudo, no sentido da entrega da melhor prestação jurisdicional possível à sociedade, periodicamente é preciso parar, dar um passo atrás e buscar enxergar o quadro de forma mais ampla. É preciso refletir sobre questões essenciais, como, por exemplo, o que sente e pensa, em qual contexto atua e a que ponto quer e pode chegar em sua atuação profissional o conjunto dos magistrados brasileiros. Só com clareza sobre esses pontos será possível idealizar e desenvolver projetos de longo prazo para o aperfeiçoamento da magistratura e da Justiça nacional.

Proporcionar estas reflexões foi o principal objetivo do seminário “A magistratura do futuro”, realizado em junho pela Revista Justiça & Cidadania, em parceria com a Fecomércio-RJ.

Para estes debates, felizmente, não partimos do zero. “A magistratura do futuro” é tema cujo debate já vem sendo estimulado por Justiça & Cidadania desde 2020, quando lançamos o livro homônimo – com download gratuito no site editorajc.com.br – coordenado pelo Presidente do nosso Conselho Editorial, o Ministro do STJ Luis Felipe Salomão. Obra que reúne o pensamento sobre o assunto de ministros dos tribunais superiores, TRFs, TRTs, TJs, conselheiros do CNJ e doutrinadores.

Tanto na elaboração do livro quanto na organização do seminário, bebemos mais uma vez nas águas de relevantes estudos realizados nos últimos anos, que nos ajudam a melhor compreender os juízes e os caminhos da Justiça brasileira, com destaque para os trabalhos desenvolvidos pela Associação dos Magistrados Brasileiros, sob a coordenação do Ministro Luis Felipe Salomão. Refiro-me principalmente à pesquisa “Quem somos. A Magistratura que queremos”, de 2018, realizada pela AMB em parceria com a PUC-RJ, e à atualíssima pesquisa “Tecnologia aplicada à gestão dos conflitos no âmbito do Poder Judiciário”, ainda em desenvolvimento.

Outras contribuições trazidas por autores e palestrantes parceiros se juntam a esse arcabouço de dados, com possibilidades de cruzamento ainda não totalmente exploradas, capazes de desencadear novas e instigantes reflexões. Pois trata-se de tema que ninguém será capaz de esgotar em apenas um livro, um seminário ou uma pesquisa. Muitas outras conversas como essas serão necessárias para aprofundar as projeções sobre a magistratura do futuro – leia também nessa edição a reportagem sobre a Conversa com o Judiciário que debateu os criptoativos e sua regulamentação. Já é possível, porém, delinear alguns elementos importantes.

Hoje já sabemos com clareza, por exemplo, que não se trata apenas de incorporar novas tecnologias. Novos hardwares e softwares que ajudem a tornar mais ágil e efetivo o trabalho dos juízes e tribunais serão sempre bem-vindos, é claro, mas os principais desafios dizem respeito à interface humana, como aprimorar a Justiça na essência da sua relação com cada cidadão e com a sociedade como um todo. Pois se a Era Digital desmaterializou os relacionamentos interpessoais e interinstitucionais, democratizou os acessos, colocou a autonomia da vontade na berlinda e proporcionou um nível de pluralidade nunca antes visto, operar com base em paradigmas anteriores a essas transformações já não mais permite que a Justiça seja capaz de cumprir o que dela se espera, a célere e eficaz resolução dos conflitos e a pacificação da sociedade. Se as máquinas e as técnicas estão em acelerado desenvolvimento, também o Direito e seus operadores precisam evoluir.

Leia também nessa edição – A Revista JC de julho traz na capa a entrevista com o novo Presidente da Ajufe, o Juiz Federal Nelson Alves, que destacou o posicionamento institucional da Associação em defesa do Estado Democrático de Direito, embora com a relevante ressalva de que não cabe aos magistrados atuar movidos pela “emoção político partidária”. Na conversa, o dirigente falou ainda sobre as pretensões para recompor a defasagem salarial da magistratura federal, sobre os avanços rumo à igualdade de gênero na diretoria da Ajufe e sobre as comemorações do jubileu de ouro da entidade.

Sobre direitos trabalhistas, leia o artigo do Ministro do TST Douglas Rodrigues, que analisa questões relacionadas à proteção dos trabalhadores por aplicativos. Veja também o artigo assinado pelos advogados Karoline Ferreira Martins e Marcus Vinicius Furtado Coêlho – ex-presidente da OAB, atual Presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem e membro do nosso Conselho Editorial  –  sobre a prevalência do negociado sobre o legislado nas relações entre patrões e trabalhadores sob a ótica de recente decisão do STF.

No Espaço OAB, o Presidente do Conselho Federal da Ordem, Beto Simonetti, comemora a sanção da Lei no 14.365/2022, que atualiza o Estatuto da Advocacia e, segundo ele, “reúne, em um único documento, as demandas mais urgentes para efetivação de direitos e garantias da profissão e dos cidadãos à luz dos desafios contemporâneos”.

Na coluna lançada para destacar as contribuições dos professores, cientistas e especialistas das entidades parceiras do Programa de Combate à Desinformação (PCD) do STF, abrimos espaço para a Presidente do Instituto Palavra Aberta, Patrícia Blanco. Em seu texto, a comunicadora destaca que não há bala de prata: “É preciso um esforço coletivo de todos os agentes – Executivo, Legislativo, Judiciário, partidos políticos, companhias digitais, plataformas, veículos de comunicação e sociedade civil – para enfrentar a desinformação”.

A edição destaca ainda a cobertura do workshop promovido pelo CNJ e pela Enfam para debater os aspectos civis e os desafios impostos pelos casos de sequestro internacional de crianças, com foco nas formas de melhorar a prestação jurisdicional nos processos de retorno de crianças e adolescentes, nos termos da Convenção de Haia de 1980.

Confira ainda na Revista JC de julho a introdução (leia a versão completa no site) de aprofundado artigo da Juíza do TJRJ Daniela Bandeira de Freitas sobre a governança de dados abertos no âmbito do Poder Judiciário, política que ela aponta como importante instrumento para promover maior eficiência, transparência e participação social no sistema de Justiça. 

Boa leitura!