Combate ao assédio moral e sexual pelo Poder Judiciário

9 de maio de 2022

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Campanha “Trabalho sem assédio” como mecanismo de transformação social

No dia 28 de outubro de 2020, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu, no âmbito do Poder Judiciário, a Política de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, do Assédio Sexual e da Discriminação, pela Resolução 351. Referida política visa, entre outros objetivos, “ações de prevenção e combate a mecanismos, gestão e atitudes que favoreçam o assédio ou o desrespeito aos valores profissionais do serviço público judiciário e da magistratura.”

A política institucional contra o assédio e discriminação no âmbito do Poder Judiciário considera a adesão do CNJ ao pacto pela implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), “entre os quais estão o apoio e o respeito à proteção de direitos humanos reconhecidos internacionalmente, bem como com a sua não participação em violações destes direitos”. Considera, ainda, o princípio da dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a proibição de todas as formas de discriminação e o direito à saúde e à segurança no trabalho (artigos 1o, inc. III e IV; 3o, IV; 6o; 7o, inc. XXII; 37 e 39, § 3o; 170, caput, da Constituição Federal), além de diversos instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos e de combate às discriminações e intolerâncias.

A Resolução 351/2020 do CNJ reconhece “que o assédio sexual viola o direito à liberdade sexual, à intimidade, à vida privada, à igualdade de tratamento e ao meio ambiente de trabalho saudável e seguro, atentando contra a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho”, assim como, “que as práticas de assédio e discriminação são formas de violência psicológica que afetam a vida da trabalhadora e trabalhador, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais, podendo ocasionar graves danos à saúde física e mental, inclusive a morte, constituindo risco psicossocial concreto e relevante na organização do trabalho”.

No dia 12 de abril de 2022, o CNJ editou a Resolução 450, que incluiu na Resolução 351/2020 o art. 18-A, para instituir a “Semana de Combate ao Assédio e à Discriminação”. Com a alteração, os tribunais de todo o País deverão realizar na primeira semana do mês de maio de cada ano “ações preventivas e formativas”, que contemplem “magistrados, servidores, estagiários e colaboradores terceirizados”.

A construção de política para enfrentar e prevenir o assédio moral, o assédio sexual e a discriminação no âmbito do Poder Judiciário, também levou em consideração que além de atuação voltada ao resgate dos ideais de justiça na apreciação dos processos judiciais, deve-se atuar dentro de sua própria estrutura, com o afastamento de práticas de gestão que levam ao assédio ou a condutas discriminatórias, assim como, atuar na conscientização, formação e no efetivo combate do assédio moral, do assédio sexual e de todas as formas de discriminações no âmbito externo.

Pela Portaria 299/2020, o CNJ instituiu Comitê de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e do Assédio Sexual, cuja composição atual encontra-se retratada nas Portarias 35 e 70/2022, sob a coordenação da Conselheira do CNJ Salise Moteiro Sanchotene e participação da autora como representante da Justiça do Trabalho.

Como se sabe, os ambientes de trabalho, públicos e privados, refletem as práticas sociais, o que não é diferente no Poder Judiciário. Dupla jornada, discriminação, dificuldade de conciliar o trabalho e a família, violência psicológica e agressões verbais são alguns dos desafios enfrentados diariamente pelas mulheres que escolhem a magistratura, de acordo com pesquisas divulgadas no âmbito da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho, como retratado na 12a rodada dos Seminários de Pesquisas Empíricas Aplicadas a Políticas Judiciarias, com transmissão pelo canal do CNJ no YouTube, no mês de novembro de 2021.

Do mesmo modo, Pesquisa do Instituto Patrícia Galvão e Instituto Locomotiva, com apoio da Laudes Foundation (2020), intitulada “Percepções sobre violência e o assédio contra mulheres no trabalho”, baseada na Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho (OIT/ aprovada em 2019 e que entrou em vigor, a partir de 2021, em diversos países), demonstra que 76% das entrevistadas já sofreu algum tipo de violência ou assédio no trabalho. Referida pesquisa, evidenciou, ainda, que “além de uma série de desafios vivenciados para conseguir trabalhar, as mulheres precisam lidar com uma realidade cotidiana no trabalho pelo fato de serem mulheres: constrangimento e assédio moral e sexual”.

Em consideração às violências e assédios no mundo do trabalho, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), em conjunto com o Ministério Público do Trabalho, OIT, ONU Mulheres e a Coalizão Empresarial pelo Fim da Violência contra as Mulheres e Meninas, que reúne 127 empresas, entre outras instituições, aderiram ao ato público convocado pela Secretaria e Procuradoria da Mulher da Câmara dos Deputados, realizado no dia 9 de março de 2022, no Salão Negro da Câmara dos Deputados, em defesa da ratificação da Convenção 190 da OIT pelo Estado brasileiro. A Câmara dos Deputados já encaminhou à Presidência da República, com o apoio de diversos parlamentares, a indicação de assinatura da norma internacional (INC 1483/2021). No mês de março de 2022, a Anamatra também requereu apoio do Tribunal Superior do Trabalho à citada iniciativa, no que foi atendida e o pleito encaminhado pelo referido órgão ao Presidente da República.

Por ocasião do 20o Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Conamat), realizado pela Anamatra, no período de 27 a 30 de abril de 2022, foi lançada a campanha “Trabalho sem assédio”, com o objetivo de mobilizar a sociedade para o engajamento solidário e empático, de combate às violências e assédios no mundo do trabalho. A campanha é permanente e englobará ações e conteúdos educativos para sensibilizar gestores e empregadores e conscientizar trabalhadores, reforçando a ideia de que essas condutas nocivas devem ser denunciadas, fiscalizadas e punidas. Incluem-se entre as ações da campanha, esforços para que o Brasil ratifique, com status de emenda constitucional, a Convenção 190 da OIT, que está em harmonia com a Constituição de 1988 e a com Convenção 155 da OIT, sobre a proteção do meio ambiente de trabalho.

Assim, tanto a política instituída no Poder Judiciário, quanto a campanha “Trabalho sem assédio”, criada pela Anamatra, fomentam cultura de “tolerância zero” em face de assédios e discriminações nos ambientes de trabalho e atuam como mecanismos de transformação, para uma sociedade menos violenta, preconceituosa e desigual, na qual o trabalho digno, seguro e saudável seja uma realidade.

Notas__________________________

1 Disponível em:< https://www.anamatra.org.br/imprensa/noticias/31556-cnj-pesquisas-revelam-dificuldades-enfrentadas-pelas-mulheres-na-magistratura>.

2 Disponível em: <https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/dados-e-fontes/pesquisa/percepcoes-sobre-a-violencia-e-o-assedio-contra-mulheres-no-trabalho-instituto-patricia-galvao-locomotiva-2020/>.