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Jequitibá e justiça

16 de setembro de 2015

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petersonA mata era virgem. O Brasil, ainda inexplorado naquele recanto. Ali se encontrava um grupo de caçadores de madeiras valiosas, como jacarandá e mogno. Tudo se fazia de forma clandestina, em busca do dinheiro.

Um dos madeireiros, carregando a motosserra, desviou-se dos demais. À procura de outra trilha, caiu no barranco próximo a um riacho de águas cristalinas. A máquina assassina afundou na água e se perdeu. 

Então, o homem, após se recuperar do susto, ficou margeando o leito daquele riacho e deu de frente com uma árvore frondosa, de troncos de grandes dimensões no comprimento e no perímetro. Era a mais bela na floresta e nunca vista. 

Ao colocar suas mãos na árvore, viu que dela saía algo parecido com leite minando de suas entranhas. Gritou para os amigos, gritou tanto que o encontraram e ficaram muito felizes com a descoberta de árvore tão grande e bela e que lhes renderia um bom lucro. 

A árvore era um jequitibá secular. Todos se puseram a admirá-la. E baixaram as motosserras em sinal de respeito, naturalmente. 

De repente, não se sabe se em uma alucinação, viram jorrar, do seio dourado do jequitibá, uma água leitosa com intensidade. Desse ventre saiu um bebê, chorando, que precisava de cuidados. 

Um dos exploradores foi à cidade mais próxima e contou a todos o que vira. Aqueles que acreditaram foram até lá e a primeira mulher a chegar segurou o bebê e disse que o adotaria, uma vez que não tivera a oportunidade de gerar filhos.

A notícia correu e outras pessoas foram chegando para testemunhar aquele milagre. Algumas mulheres a tocavam para realizar o desejo de ser mãe pela primeira vez e outras por pretenderem mais um filho. 

Aquela árvore se abriu e foi dando à luz, um filho atrás do outro. Eram humanos iguais àqueles que saem das maternidades. Aqueles que desejavam filhos foram chegando e a árvore não decepcionou ninguém.

O fato atravessou os oceanos. Estrangeiros também vieram à procura de um filho que a árvore generosa e carinhosamente lhes concedia. E assim se sucedeu por mais de três anos. Os cinco continentes ficaram povoados daquelas crianças nascidas da árvore, seres humanos também.

Depois que a última mulher foi beneficiada, após uma fila de milhares, aquela santa árvore secou e morreu. Foi reconhecida como milagrosa e uma romaria seguia até ela para tocá-la.

As crianças cresceram normalmente por todos os cantos, se integraram à sociedade e sequer eram identificadas. Entretanto, algum tempo depois, percebeu-se, em estudo minucioso, que aquelas crianças nascidas da árvore da vida e esperança eram pessoas destinadas a fazer o bem e ensinar como praticá-lo contra o mal. Fraternidade, igualdade e solidariedade eram pontos comuns entre elas. 

Tempos depois, se observou que os sete pecados capitais ditos por São Tomás de Aquino desapareceram. A violência acabou. As ilicitudes também, graças ao convívio exemplar e contagiante com esses novos seres. 

Uma dessas jovens descobriu a cura de muitas doenças. Outro jovem tornou-se muito estudioso e deu notável contribuição ao planeta. As águas voltaram ao nível ideal e o superaquecimento terrestre acabou. Ainda, descobriu-se que a Terra poderia sair do eixo solar e a única solução seria que todos os seres humanos dessem as mãos e rezassem. 

Em alguns lugares onde a guerra era a regra, quiseram boicotar essa atitude. Mas aquele jovem cientista calmamente explicou a razão de todos darem as mãos e rezarem. Esse seria o único caminho para evitar uma catástrofe e manter viva a Terra. Seria necessário, então somar e unir todas as forças e energias positivas para restabelecer o equilíbrio perdido.

A partir dessa compreensão, a vida ressurgiu intensamente. As plantações foram integradas e produziram em abundância, as fronteiras foram derrubadas, as diferenças entre os povos foram esquecidas e as armas foram abandonadas. Todos passaram a viver em clima de amor e respeito. A sobrevivência dependia e depende de cada um e de todos.

Assim, o Planeta foi aperfeiçoado visando ao bem e todos passaram a viver muito felizes, em paz e tranquilamente.

O surrealismo literário que o francês André Breton divulgou a partir de 1924 permite que o pensamento se forme pelos impulsos provenientes do inconsciente, com incoerência, valendo os sonhos e os instintos, desprezando a lógica e os padrões existentes. Fica a indagação se este texto é surreal: hoje, sim. Amanhã, não se sabe. Tanto a Natureza quanto o Universo têm nome: DEUS. E, se Ele quiser, tudo pode acontecer.

Quanto à Justiça, esta precisa ser bastante verdadeira, realista e apegada às provas existentes e às leis. O julgamento precisa nascer da mais alta esfera da consciência do magistrado, após o exame de todas as provas. 

A ordem social, a segurança jurídica e a tranquilidade pública conduzem o magistrado ao convencimento da realidade processual, longe da ficção. A Justiça só vive da prova que cria a convicção inabalável, distante do falso e do irreal, ou seja, nenhuma ideia prevalece e domina por muito tempo, sem um fundo de verdade. 

E a confrontação de todas as provas é a pedra de toque da verdade. Por isso, para fazer justiça, é necessário unir o conjunto probatório com a sensibilidade do julgador. 

Tal como o fogo que faz a comida, são importantes instrumentos para fazer justiça a razão, a equidade e a verdade. Quem conspira contra a verdade, a falseia com palavras e atitudes, desmerece o crédito da Justiça.

Sobre o assunto, sintetiza Rui Barbosa: “guardar fé em Deus, na verdade e no bem”. Acrescenta Carlos Maximiliano que o importante na Justiça é “o valor intrínseco dos depoimentos, pesá-los, e decidir afinal de acordo com o seu convencimento consciencioso, formado pelo exame do processo, em conjunto”, com legalidade. 

No momento de dizer o Direito e Justiça não vale o surrealismo, a ficção ou a fantasia. O que vale é a verdade dos fatos que emerge cristalina das provas, nos termos da Lei. Neste caso, jequitibá é apenas uma árvore.