O Judiciário brasileiro precisa de controle?

5 de março de 2004

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A criação de um conselho destinado a exercer o controle do Judiciário brasileiro tem-se revelado tema espinhoso e complexo, sobressaindo entre as questões polêmicas da reforma em andamento.

A propósito da criação e da alta missão de um órgão de tal porte, necessário se faz, primeiramente, examinar a história a fim de entender as razões que levaram à sua concepção em outros países.

Quando, pela primeira vez, cogitou-se a criação de um órgão controlador do judiciário, pensou-se em dar proteção à Magistratura. Sabe-se que o primeiro conselho foi instituído na França, em 1946 e reformado em 1958, com o objetivo de garantir a independência dos magistrados. Apesar de, ainda hoje, lá, os juizes não disporem, de modo integral, dos dons próprios de um poder, há tentativas de se dar à Justiça francesa maior independência. Tal se intentou, recentemente, no processo de emancipação da Justiça em relação ao poder político, com propostas de alteração da composição do Conselho Superior. Na Itália, existe a pretensão de que o controle se faça por instituição composta apenas por Magistrados, cujo critério de escolha seriam os méritos demonstrados como juízes.

Ao contrário dessa visão, andam, nos últimos tempos, a disseminar no Brasil a incoerente idéia de um controle externo do Judiciário, o que coloca o País na contramão da história. Antes de conferir proteção à magistratura, tal proposta pressupõe castigá-la, fazendo prevalecer sobre os interesses públicos outros interesses.

Com efeito, o controle em si não é um mal; antes, é um bem. O mal é o chamado controle externo. É assim que pensa o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Afinal, toda atividade humana, e a justiça, aí se inclui, necessita, dúvidas não há, de um controle, mas, no caso do Judiciário, que seja exercido por seus próprios membros. Se assim não for, um controle alheio às características do Poder virá ferir não só princípios jurídicos basilares, mas, sobretudo, a clausula pétrea constitucional da independência harmônica dos três Poderes.

E mais: se é que alguns não conhecem a organização judiciária nacional, vale lembrar que os julgamentos aqui sempre foram públicos desde a primeira Constituição republicana. Por que, então, um controle externo se nunca houve Judiciário tão aberto quanto brasileiro?

O STJ, com lastro nesse entendimento defende que seja instituído o Conselho Nacional de Justiça, composto, exclusivamente, de sete membros do judiciário, para sua mais expedita funcionalidade, sendo um ministro do STF, indicado pelo respectivo Tribunal (presidente), um do STJ, indicado pelo respectivo Tribunal (corregedor), um do TST e um do STM, indicados por seus Tribunais, além de dois desembargadores de Tribunal de Justiça e um juiz de Tribunal Regional Federal. Defende ainda, a idéia de que, perante a instituição, funcionem o procurador geral da República e o presidente do Conselho Federal da Ordem dos advogados como órgãos provocadores.

Ademais, segundo proposta do STJ, a esse conselho deve-se atribuir a competência  de definir e fixar o plano de metas do Poder Judiciário e promover a periódica avaliação de seu funcionamento, tendo em vista o aumento da eficiência, a racionalização, o incremento da produtividade e a maior eficácia do sistema, garantindo mais segurança, mais celeridade e maior acessibilidade na realização dos serviços da Justiça.

Cite-se como modelo de controle interno o Conselho da Justiça Federal, que funciona junto ao STJ, cabendo-lhe exercer a supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal. Já se recomendou, em boa hora, à atual proposta de emenda em tramitação no Congresso – e a recomendação já foi aceita – que se dê a esse Conselho poderes correcionais.

O STJ, sem perder a força e a confiança, está sempre disposto a defender essas propostas, pois sabe que admitir a criação de um controle externo implica admitir, incoerentemente, a negação do Estado democrático de direito e a implosão da independência do Poder Judiciário, verdadeira violência à Constituição. A situação, portanto, exige reflexão sensata.