Tributação ambiental e a força da extrafiscalidade tributária – a nova Lei nº 14.119/2021

25 de novembro de 2021

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A Constituição da República estabelece em seu art. 225 que todos têm direito ao meio-ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. É o que se denomina de equidade intergeracional, um conceito que surge nos anos 1980, cuja origem está relacionada com os desejos pelas mudanças globais que caracterizaram a segunda metade do Século XX.

Nos países desenvolvidos verifica-se crescente conscientização acerca do meio ambiente com o avanço da reciclagem do lixo, da luta contra o lixo tóxico e contra as indústrias poluentes e/ou eletrointensivas, enquanto que nas regiões de capitalismo periférico ocorre o oposto.

A nossa sociedade, a chamada sociedade da “pós-modernidade”, caracterizada pelos grandes avanços da tecnologia, pela grande produção de riquezas e pelo suposto “domínio” do homem sobre a natureza, é uma sociedade que ao mesmo tempo encontra-se marcada pela proliferação de riscos e de ameaças, e na qual, paradoxalmente, a própria existência do ser humano fica comprometida.

Essa tensão entre o capitalismo imoderado e a proteção ambiental para as atuais e futuras gerações chega ao Direito Tributário com atual debate no Congresso Nacional.

Dentro desse contexto, o Estado passa a desempenhar importante papel na adoção de políticas públicas que protejam e garantam de forma efetiva o direito ao meio ambiente, e que ao mesmo tempo permitam o desenvolvimento econômico, de forma que se propicie um desenvolvimento sustentável.

Em regra geral, tem se entendido que a finalidade principal dos tributos é a arrecadação, ou seja, o tributo é um instrumento destinado à obtenção de ingressos (receitas públicas) para que o Estado possa cumprir os fins que lhe são próprios. Todavia, atualmente, além de mecanismo para financiar o Estado, os tributos constituem um dos mais notáveis instrumentos econômicos com que conta o Estado na direção da atividade econômica, tanto pública quanto privada, uma vez que podem ser utilizados com uma finalidade extrafiscal.

De acordo com Aliomar Baleeiro, costuma-se denominar extrafiscal “o tributo que não tem como sua função principal prover ao estado meios adequados para seu custeio, mas visa, prioritariamente, a ordenar a função social ou intervir em dados conjunturais ou estruturais da economia”.

Nessa linha, tem-se reconhecido, cada vez mais, a competência ao legislador tributário para estimular ou desestimular comportamentos, de acordo com os interesses da coletividade, por meio da tributação regressiva ou progressiva, ou da concessão de incentivos e benefícios fiscais.

Nesse sentido veio a lume a Lei nº 14.119/2021, prescrevendo que os valores recebidos em pagamento por serviços ambientais ficarão isentos de tributação. A nova Lei, promulgada e publicada no dia 11 de junho no Diário Oficial da União, cria a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA).

Dois vetos foram derrubados pelo Congresso no dia 1º de junho. O primeiro devolveu à lei a isenção tributária prevista inicialmente. Desta forma, os valores recebidos como pagamento por serviços ambientais não integram a base de cálculo do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

O Parlamento também manteve a isenção aplicada somente aos contratos realizados pelo Poder Público ou, se firmados entre particulares, desde que registrados no Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (CNPSA).

A Lei nº 14.119/2021 define conceitos, objetivos, diretrizes, ações e critérios de implantação da PNPSA, que tem como objetivo fomentar medidas de manutenção, recuperação e melhoria da cobertura vegetal em áreas de preservação.

Entre as diretrizes da PNPSA está a utilização do pagamento por serviços ambientais como instrumento de promoção do desenvolvimento social, ambiental, econômico e cultural das populações em área rural e urbana e dos produtores rurais, em especial das comunidades tradicionais, dos povos indígenas e dos agricultores familiares.

Pela teoria crítica da sociedade, em Axel Honneth, “a sociedade deve estar preocupada em interpretar seu papel dentro das exigências sociais para o estabelecimento do bem da coletividade”, isto é, a categoria do reconhecimento visa a dar condições à sociedade de ser independente, reconhecer-se no processo de independência e agir em prol da liberdade de todos.

Andou bem o Congresso em derrubar o veto presidencial. Prevaleceu o bem da coletividade.