1º Fórum Internacional de Arbitragem de Brasília

7 de novembro de 2023

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O 1o Fórum Internacional de Arbitragem de Brasília reuniu ministros e integrantes dos setores público e privado para debater os aspectos legais da arbitragem. Durante dois dias em outubro, especialistas na área discutiram o atual cenário arbitral e os desafios presentes, como a independência e a transparência das decisões, num debate que perpassa pelo dever de revelação do árbitro.

Com dez painéis temáticos, o seminário promovido pelo Instituto Brasileiro de Direito Legislativo (IBDL) abordou desde o histórico da arbitragem no Brasil até os deveres dos árbitros, a relação com o Judiciário e também projetos de lei sobre a área. A programação contou com palestras de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ), do Tribunal de Contas da União (TCU) e de representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), além de renomados juristas e acadêmicos.

Estabilidade – Ao longo dos debates ficou claro que a arbitragem vem enfrentando resistências, sendo alvo de críticas por falta de transparência e pelo corporativismo, quando o ambiente negocial saudável demanda confiança em regras estáveis. Em sua participação, o Ministro do STF André Mendonça defendeu que a arbitragem assegure quatro pontos principais: segurança de imparcialidade, celeridade, irrecorribilidade e informalidade.  Ex-Advogado-Geral da União, Mendonça contou que o setor público evitava usar o instituto, salvo em situações específicas, diante da possibilidade de insegurança sobre a imparcialidade.

Boa-fé – Os ministros Luiz Fux e João Otávio de Noronha, do STF e STJ, respectivamente, ressaltaram a importância do dever de revelação, conforme prevê o art. 14 da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996). Fux afirmou que a judicialização das questões arbitrais “diminui o prestígio da arbitragem”. “O dever
de revelação é obrigatório, e o que temos visto são anulações de arbitragem por desvio da boa-fé”.

Noronha, por sua vez, tratou da morosidade do Judiciário e afirmou que a “arbitragem não foi criada e não é concebida para desafogar o Poder Judiciário”. O ministro também defendeu que o juiz arbitral siga os mesmos princípios exigidos de um juiz estatal: independência e imparcialidade.

Deveres funcionais – Especialista na área, Ricardo Gardini, embaixador do Centro Arbitral Internacional de Viena (Viac) no Brasil, foi um dos palestrantes no painel “princípios constitucionais e deveres funcionais dos árbitros” e elencou os deveres dos árbitros em arbitragens internacionais. Para ele, “não temos que discutir os deveres da arbitragem, mas sim daqueles que  fazem com que essa arbitragem funcione ou não”.

Como a arbitragem demanda participação de indivíduos, há sempre que se manter uma supervisão e acompanhamento sobre a forma como eles estão lidando com uma delegação de poderes do Estado, que é o poder de decidir”, afirmou o advogado em entrevista após o evento.

“O árbitro não tem o cargo vitalício; não se dedica exclusivamente à arbitragem, como faz o juiz. Ele tem outros contatos, atividades, interesses, advoga, tem parcerias, compõe escritórios… O contato dele com o mundo privado é maior do que o de um juiz”, diferenciou o advogado Pierpaolo Bottini, que é professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Na prática – Quando se trata da imparcialidade do árbitro, uma das preocupações é com um mesmo profissional que atue em diferentes funções ao longo do processo, como julgador, advogado e parecerista,
por exemplo.

Alexandre D’Ambrosio, Vice-Presidente de Assuntos Corporativos e Institucionais na Vale, contou que atualmente “foge” da arbitragem por considerar que o instituto tem sido usado de forma inadequada diante da falta ética-profissional de alguns árbitros. Efeito colateral disso se refletiu nos contratos da mineradora, no sentido de não ter mais a previsão de cláusula de arbitragem. “Podendo escapar da arbitragem, especialmente no Brasil, é uma vantagem. Voltamos ao bom e velho Judiciário”, afirmou.

Responsabilização Conselheiro do CNJ, Luiz Fernando Bandeira de Mello chamou a atenção para a necessidade de responsabilização dos árbitros em caso de descumprimento do dever de revelação, ainda que o Judiciário reconheça a nulidade do laudo arbitral. Ele falou no painel “Dever de revelação sob a ótica constitucional” com o professor Georges Abboud, e o presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho.

Experiência internacional – Entusiasta da arbitragem à brasileira, a Secretária-Geral do Viac, Niamh Leinwather, afirmou que o dever de revelação é importante para manter a credibilidade da arbitragem. Na Áustria, por exemplo, o dever é amplo e abrange tudo o que pode afetar o processo arbitral. A secretária-geral defendeu, ainda, o cuidado com o excesso de regulamentação do sistema.

Outro entusiasta da arbitragem e da autorregulação é o Ministro Luís Roberto Barroso, Presidente do Supremo: “É um contrato essencialmente privado. Precisamos libertar o Brasil do oficialismo excessivo”. “Tem que ter uma regulamentação mínima, um código de ética e, talvez, um mecanismo de autorregulação”, afirmou o ministro, para quem a presença do Estado não deve ser demasiada

Obras públicas – O Ministro Benedito Gonçalves, do STJ, vê com bons olhos o uso da arbitragem em contratos de obras públicas, desde que sejam seguidos os princípios do Direito Administrativo e da ordem pública. Neste caso, o ministro disse que o controle e a regulamentação do procedimento arbitral devem ser feitos pelo Estado. Há, ainda, a necessidade de capacitação dos agentes públicos para lidar com o novo cenário da arbitragem.