A Nossa Sociedade Patriarcal e a importância da Participação das Mulheres nos Espaços de Poder Político e na OAB

10 de dezembro de 2019

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Em que pese termos a sensação de que mais uma porta se abriu com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, explicitando a igualdade entre homens e mulheres de forma expressa, na realidade estamos somente lutando para recuperar o tratamento igualitário que já tínhamos construído e vivenciado na antiguidade, não só dentre os povos celtas e nórdicos no século IV A.C., como também no Egito dos faraós, liderados pela carismática Cleópata, vencida na famosa Batalha do Ácio, em 31 A.C.

Homens e mulheres eram tratados de forma igualitária, inclusive sendo a mulher enaltecida e valorizada por representar o aspecto vivo da criação.

Com a vitória de Roma, liderada por Otaviano, o império egípcio sucumbiu e a cultura greco-romana, predominantemente machista, espalhou-se por todo o seu império, no ocidente e no oriente. Prevaleceu, nesse contexto, a visão subalterna e acessória das mulheres. E influenciado por essa cultura, o cristianismo — em manifesto dissenso com a igualdade de tratamento que Jesus conferia às mulheres –, acabou disseminando crenças religiosas e imposições, que culminaram no surgimento de um novo paradigma que nos tornava as causadoras do Pecado Original. Surgiu dessa forma a famigerada sociedade patriarcal, que nos reduziu a meras coadjuvantes,

Na idade média essas circunstancias foram agravadas: à nós, mulheres restavam apenas dois paradigmas a seguir: a pretensa pecadora Maria Madalena ou a Santa Maria. E quem ousasse optar por algo fora dos padrões ditados eram consideradas bruxas hereges e, por essa razão, estirpadas da sociedade da forma mais brutal possível.

Desde então fomos assumindo diversos e novos perfis, decorrentes principalmente da insatisfação do nosso estado de submissão, contribuindo, assim, para o implemento de uma filosofia e ideal que busca o tratamento equivalente entre homens e mulheres, apesar das diferentes experiências e características físicas.

Com relação aos espaços políticos, em 1880 a dentista Isabel de Mattos Dillon atuou como grande protagonista na luta das mulheres pelo espaço na política. A sufragista baiana candidatou-se para a primeira Assembléia Constituinte da República, alegando que a lei eleitoral (Lei Saraiva) não excluía as mulheres, mas apenas analfabetos. Porém não conseguiu nem se alistar para votar. Foi a luta iniciada no Brasil por ela que redundou, muitas décadas depois, no direito de voto das mulheres.

Essa importante conquista da cidadania, alcançada no Código Eleitoral de 1932, ainda era, no entanto, limitada. Só seria possível votas, segundo as restrições legais impostas, mulheres solteiras com autorização do pai, ou marido, se fossemos casadas. E a despeito de a Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946 ter definido a obrigatoriedade de voto, acabou por ainda manter limites à conquista feminina. Apenas mulheres com atividade laborativa poderiam votar sem a autorização do marido, se fossem casadas.

Atualmente, após tantas conquistas legislativas e sob a égide da Constituição Cidadã, nós somos mais da metade dos eleitores no Brasil, mas há apenas e tão somente 77 deputadas eleitas na atual legislatura (cerca de 15% do colegiado), para lutar por pautas referentes aos nossos direitos. E conseguimos, inclusive, eleger a primeira mulher indígena para Deputada Federal, mas ainda estamos muito aquém da média das mulheres na política em outros países latino-americanos, pois, apesar de ter havido um aumento de 50% no índice referente às participações femininas em relação a legislatura anterior, em 2017, segundo levantamento da ONU Mulheres, o Brasil ainda ocupava a 154a posição num universo de 174 países sobre a participação das mulheres no parlamento.

Esse considerável aumento na participação das mulheres nos cargos eletivos do Poder Legislativo, no entanto, se deu muito mais em decorrência da decisão do Tribunal Superior Eleitoral de maio de 2018, que determinou a aplicação de no mínimo 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e do tempo de propaganda gratuita para as candidatas mulheres, do que efetiva mudança cultural no Brasil. Em 2009, já havia regras impostas pelo Tribunal Superior Eleitoral com a finalidade de reduzir a grande diferença no quantitativo decorrente do gênero na política, impondo aos partidos políticos a obrigação de terem pelo menos 30% de candidatas mulheres, mas o que mais se constatou foi a ocorrência de “candidatas laranjas”, nas quais mulheres sem consciência eram usadas e manipuladas tão somente para burlar a norma, ao invés de cumpri-la para atingir sua finalidade.

Apesar das relevantes conquistas de grande relevância social, na realidade assumíamos papéis que cada vez mais nos obrigavam e nos responsabilizavam, que se somavam com as demais funções assumidas, sem a devida valoração, proporcional ao nosso quantitativo, na tomada de decisões neste país.

Foram quebrar alguns paradigmas, mas luta ainda é árdua, pois apesar de vencermos e conquistarmos nossos espaços pelo bom trabalho e estudos, os homens ainda predominam nos espaços de poder, públicos e privados.

Temos o direito constitucional de sermos quem quisermos ser, mas somos mal interpretadas e muitas vezes estigmatizadas. Almejamos tão somente a parceria e cumplicidade do homem, além de igualdade de oportunidades; e que vença o melhor.

A participação das mulheres nos cargos de comando deve ser proporcional à sua participação quantitativa na população brasileira, sob pena de ausência de representatividade e de mácula da democracia.

Enquanto houver uma cultura discriminatória contra mulher não conseguiremos êxito em extirpar da sociedade a violência que essa discriminação acarreta, bem como reduzir drasticamente a diferença de gênero dentro dos espaços de poder.

Há, portanto, que se focar no implemento de reformas institucionais que proporcionem a eficácia e efetividade da representação das mulheres na luta pelos espaços de poder político, bem como na promoção de estímulos, tendo como base e exemplos as mulheres que já alcançaram, com muita dificuldade, esse status, como é o caso emblemático da querida juíza Renata Gil, primeira mulher a presidir a prestigiosa Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB.