Advocacia livre é advocacia sem assédio e discriminação

2 de agosto de 2023

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O assédio, em suas diferentes vertentes, segue presente como uma mácula em nossa sociedade. Muitas são as razões que explicam essa persistência, ainda que se entenda a prática como prejudicial e nociva a todo o ambiente de trabalho. É nesse contexto que, no último 4 de julho, foi publicada no Diário Oficial a lei que torna o assédio e a discriminação infrações ético-disciplinares na advocacia (Lei no 14.612/2023), ao alterar o art. 34 do Estatuto da Advocacia (Lei no 8.906/1994). Isso significa que essas condutas inaceitáveis serão punidas com mais rigor, garantindo locais de trabalho mais justos e respeitosos para todos. 

A proposta é mais uma iniciativa da atual gestão da OAB Nacional com o intuito de fazer avançar a equidade de gênero. O texto do projeto foi elaborado pela Comissão Nacional da Mulher Advogada. Apresentado no Congresso Nacional pela Deputada Laura Carneiro (PSD-RJ), recebeu amplo apoio parlamentar, tendo sido aprovado por unanimidade na Câmara e no Senado. Toda a tramitação foi acompanhada de perto pela instituição. 

A agora Lei contra o Assédio e a Discriminação demonstra nosso empenho em criar um ambiente seguro e saudável para todos os advogados e advogadas.  Não há advocacia realmente livre sem a garantia de que os ambientes profissionais não estão, também, livres de qualquer tipo de abuso e violência.. E que, caso o assédio aconteça, as medidas serão tomadas para responder à altura, para que as vítimas sejam acolhidas e possam retomar o trabalho o mais rapidamente possível.

Os desconfortos devem ser vocalizados, ouvidos e, além disso, o causador do problema deve ser identificado e ter a conduta reprimida. Assim o assédio é enfrentado, por meio da atenção às duas pontas dessa relação. A OAB, enquanto entidade de destaque no País, dá o exemplo. A responsabilidade deve ser institucionalizada e a atuação, proativa. Se o problema é coletivo, o tratamento também deve ser.

Por isso, antes mesmo da lei, o Conselho Federal já havia capitaneado a campanha Advocacia sem Assédio, com adesão de outras entidades e instituições do sistema da Justiça, com o intuito de coibir a prática no âmbito do Judiciário. O projeto foi lançado em diferentes partes do Brasil e recolheu cerca de 50 denúncias desse tipo de crime em cerca de um ano de atuação. O número, certamente sub-representa as ocorrências de assédio na advocacia, dada as dificuldades e o receio de se oficializar esse tipo de denúncias. Por isso, a importância da institucionalização das práticas como infrações ético-disciplinares, com possibilidade de suspensão da prática da advocacia.

O novo texto legal inclui definições fundamentais para identificar e coibir práticas de assédio e discriminação no espaço laboral. Segundo o texto normativo, o assédio moral é caracterizado pela repetição deliberada de gestos, palavras ou comportamentos que humilham e constrangem o(a) estagiário(a), o(a) advogado(a) ou qualquer outro(a) profissional que esteja prestando serviços, com o objetivo de prejudicar sua integridade física ou psíquica e excluí-lo de suas funções ou desestabilizá-lo emocionalmente. Esses atos são, segundo estabelece a proposta, violações à personalidade e à dignidade das vítimas, gerando um ambiente de trabalho prejudicial.

Já o assédio sexual consiste em condutas de cunho sexual, praticadas no exercício profissional ou em razão dele, manifestadas de forma física ou por meio de palavras, gestos ou outros meios. Essas ações são impostas à pessoa contra sua vontade, causando constrangimento e violando sua liberdade sexual.

A discriminação, por sua vez, refere-se ao tratamento constrangedor ou humilhante em razão de características como raça, cor, sexo, procedência nacional, procedência regional, origem étnica, idade, religião, gestação, lactação, nutrição, deficiência ou qualquer outro fator. São condutas inaceitáveis e atentatórias ao princípio de igualdade e de respeito à diversidade.

Articulado às dimensões de raça, classe, gênero, orientação sexual, identidade de gênero e outros marcadores sociais da diferença, o assédio no ambiente laboral pode ter consequências graves. Essas práticas podem resultar em ideações suicidas e ocasionar dor emocional, ansiedade, depressão, isolamento, medo de perder o emprego, estresse e doenças psicossomáticas.

O quadro é complexo. A OAB se orgulha de conseguir mover a discussão de forma ampla e aguerrida. O exercício da advocacia só é livre, como defendemos, quando é pleno para advogados e advogadas. A garantia de espaços livres de riscos e abusos permite que a energia de nossas advogadas seja orientada inteiramente à atuação profissional. Todos ganham, inclusive os jurisdicionados, e a sociedade, de forma mais ampla.