No trabalho e na vida pessoal, que venham mais conquistas femininas

3 de março de 2023

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Elas estão presentes nas artes, na política, na ciência, no jornalismo, nas corporações e, claro, no Poder Judiciário – o que destacamos nesta edição, com reportagem de capa sobre a presidente do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, a Desembargadora Mônica Sifuentes.

Ao longo das mais recentes décadas, as mulheres vêm ocupando seus merecidos espaços na sociedade, não um lugar de inclusão ou superioridade, mas um lugar de igualdade. Não é por acaso que abro este editorial mencionando as conquistas profissionais femininas, mas sim por resgatar uma das citações da filósofa e escritora Simone de Beauvoir: “É pelo trabalho que a mulher vem diminuindo a distância que a separava do homem, somente o trabalho poderá garantir-lhe uma independência concreta”.

Conquistar esses espaços não é, de maneira nenhuma, uma luta fácil. Em muitos momentos, se torna necessário oferecer provas de capacidade, a depender do que procuramos. Em muitos casos e situações, as mulheres ainda são vistas apenas como as “conciliadoras”, “amorosas”, “pacientes” ou, no máximo, as “belas figuras” que trazem leveza aos ambientes. Tudo isso é verdade. A maioria das mulheres traz em si a natural capacidade de conciliar, de pacificar, de convergir uma discussão para um bom caminho. E, sim, tudo isso com beleza e suavidade. Porém, já provamos nossa capacidade de estar em idênticos patamares nos postos de trabalho e demais espaços de decisão que exigem inteligência, força, resolutividade, liderança, produtividade e tantas outras qualificações que, em geral, não são utilizadas para definir o potencial profissional de uma mulher.

Se as mulheres certamente não querem definições que as limitem a um único papel, isso não altera o fato de que ser mulher significa ter de superar desafios, fazer escolhas e, sim, enfrentar alguns sacrifícios. Algo que ficou comprovado na recente pandemia, quando ocorreu a ampliação do modelo de trabalho remoto, que sobrecarregou ainda mais as mulheres, diante da necessidade de sobrepor a jornada de trabalho aos cuidados com a família, sobretudo devido ao fechamento das creches e escolas. Ainda persiste em parte significativa dos lares brasileiros a concepção de que são elas as principais responsáveis por zelar pela alimentação, pela educação e pela agenda dos filhos – se não, em muitos casos, as únicas.

Segundo levantamento da Fundação Getúlio Vargas, com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2021, a taxa de participação feminina no mercado de trabalho cresceu continuamente em um intervalo de cinco anos, superando 54% em 2019. Porém, a partir de 2020, com a pandemia, o índice ficou abaixo dos 50%. Conforme a crise sanitária foi sendo afastada, os índices estão subindo novamente, superando os 51%. No entanto, a disparidade salarial ainda é um fato concreto.

A necessidade de atender as políticas de ESG (Ambiental, Social e Governança, da sigla em inglês) tem contribuído para as ações de inclusão e diversidade nas empresas, o que abrange a garantia de que cargos executivos e conselhos de administração passem a ser ocupados por mulheres, além da criação de benefícios que garantam a equidade de condições. É um caminho feito de pequenos passos, mas que segue em frente em contínua elevação. Uma pesquisa da Grant Thornton divulgada no ano passado mostra que as mulheres ocupam 38% dos cargos de liderança no Brasil. Ainda é um percentual pequeno, mas houve um crescimento expressivo desde 2019, quando essa fatia era de 25%.

Há também avanços importantes nas instituições públicas. E aqui, coloco foco no Poder Judiciário. O mais recente diagnóstico sobre a presença feminina nos tribunais brasileiros, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e publicado em 2019, revela que as mulheres eram apenas 38,8% das magistradas em atividade. Por outro lado, elas representavam 56,6% do total dos servidores que atuam no Judiciário nos últimos dez anos. E ainda: as mulheres eram 56,8% em funções de confiança e cargos comissionados, enquanto 54,7% estavam em cargos de chefia. A Justiça do Trabalho (50,5%) e a Justiça Estadual (37,4%) eram as com maiores percentuais de mulheres na magistratura em atividade. Por outro lado, nos tribunais superiores (19,6%) e na Justiça Militar Estadual (3,7%) estavam os menores índices de participação feminina.

Por último, e com toda a certeza não menos importante, temos a Resolução CNJ nº 255/2018, que instituiu a Política Nacional de Incentivo à Participação Institucional Feminina no Poder Judiciário, alvo de seminário realizado pelo Conselho, em novembro do ano passado. São ações, resoluções, políticas e decisões de diversos setores, instâncias e grupos específicos que vêm ajudando a mudar uma histórica defasagem da mulher no mundo do trabalho e até mesmo no espaço social que a valoriza integralmente, sem predisposições estereotipadas. A boa notícia é que seguimos em linha ascendente. Um caminho que deve nascer no seio de cada família, com os responsáveis educando seus filhos para a importância de valorizar as pessoas independentemente da questão de gênero. Assim, concluo citando novamente Simone de Beauvoir: “Que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância, já que viver é ser livre.”

Leia nessa edição – A Revista JC de março está totalmente feminina, apenas com entrevistas e artigos assinados por mulheres. Na seção Justa, apresentamos uma entrevista com a Ouvidora Nacional da Mulher, a Desembargadora Tânia Reckziegel, que faz um balanço de sua gestão, destaca a aprovação do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero e defende a adoção de ações concretas para promover a igualdade de gênero no “grau máximo de jurisdição”. 

Ainda sobre a temática da igualdade de gênero, confira os artigos da Presidente da Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul
(Ajufesp), Desembargadora Federal Marcelle Ragazoni, da Presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), Juíza Vanessa Mateus, e da Defensora Pública Juliana Dewes Abdel, Coordenadora da Comissão dos Direitos da Mulher da Anadep, com reflexões sobre o passado, o presente e o futuro dos direitos das mulheres. Além do artigo coletivo da Secretária-Geral da OAB, Sayury Otoni, da Secretária-Geral Adjunta Milena Gama e da Presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada, Cristiane Damasceno, sobre a igualdade de gênero na advocacia.

Leia também nesse número artigos de magistradas e advogadas sobre temas relevantes como trabalho remoto, advocacia corporativa, direito recuperacional, reformas na legislação eleitoral, cooperação judiciária e fenomenologia jurídica.

Destacamos ainda nessa edição, no Espaço Supremo, reportagem sobre as propostas de reforma do modelo de indicação e composição dos membros do Supremo Tribunal Federal, que tramitam no Congresso Nacional sob a forma de Propostas de Emenda Constitucional. Em outra reportagem, saiba mais sobre as discussões travadas no âmbito do Superior Tribunal de Justiça para regulamentar o novíssimo instituto da relevância das questões de direito federal, que terá o condão, segundo os magistrados, de aproximar o STJ de sua missão constitucional de atuar como corte de precedentes.

Na seção Prateleira, saiba tudo sobre o lançamento do I Concurso de Artigos Científicos da Revista JC, que terá como tema a relação entre o personagem Dom Quixote e o conceito de Justiça, e que vai premiar o ganhador com a participação em evento internacional da Revista.

Boa leitura!